O general Hamilton Mourão deu mostras de seu brilho intelectual e moral no programa de TV Conflict Zone, da rede alemã Deutsche Welle.
Questionado sobre o torturador Brilhante Ustra, garantiu que ele “era um homem de honra e um homem que respeitava os direitos humanos de seus subordinados”.
Pode ter sido um bom pai, um marido exemplar, frequentador da missa — enfim, um cidadão de bem. “Homem de honra”, aliás, é um elogio muito comum na máfia siciliana (“uomo d’onore”).
O sujeito que enfiava animais na vagina de mulheres de manhã eventualmente chegava em casa à noite, tomava um banho e perguntava à patroa o que tinha para jantar, após um beijo em sua bochecha.
Os maiores monstros se fantasiam de médicos.
Em 2013, o ex-sargento Marival Chaves assegurou que o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra era “senhor da vida e da morte”.
Um dos documentários mais impressionantes sobre o nazismo é “Ein deutsches Leben” (“Uma vida alemã”).
Trata-se de uma entrevista com uma notável testemunha daquela era chamada Brunhilde Pomsel.
Então com 105, ela fora estenógrafa e secretária pessoal de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda de Adolf Hitler, nos últimos três anos da Segunda Guerra Mundial.
Em preto e branco, o filme é um monólogo interrompido em alguns momentos por cenas documentais. Foi transformado, depois, numa peça de teatro.
Parece modorrento, mas é espetacular.
Com uma sinceridade desconcertante, Brunhilde conta como seu chefe era educado, simpático, esposo amantíssimo, querido pelas crianças.
Ela afirma que não tinha ideia do que estava ocorrendo. A ficha caiu quando sua melhor amiga, uma judia, desapareceu.
Mas nem assim Brunhilde largou o emprego, a Alemanha ou foi para a resistência.
Terminou no bunker de Hitler, presa pelo Exército Vermelho.
Uma cena mostra-a bastante emocionada com a morte dos filhos pequenos de Goebbels, envenenados pelos pais.
Não demonstra o mesmo sentimento quando menciona a execução de judeus, ciganos, comunistas…
Direitos humanos para os outros, como gosta Mourão.
“A intenção não foi desmascará-la como nazista. Isso ela decerto não era. Ela só era desinteressada – e isso é, justamente, uma forma de culpa”, disse o diretor de “Uma Vida Alemã”, Florian Weigensamer.
O general não tem nem sequer essa desculpa.