Gritar “fora, Bolsonaro” é a única maneira de salvar vidas e pensar na reconstrução do Brasil. Por Dilma Rousseff

Atualizado em 9 de dezembro de 2020 às 12:28
Presidente Jair Bolsonaro Foto: SERGIO LIMA / AFP

POR DILMA ROUSSEFF

O Brasil está entrando em uma situação de colapso sanitário e social e o governo não age, não sabe o que fazer, não toma providências para evitar o pior.

O governo de Bolsonaro e Mourão se mostra alienado da realidade.

A pandemia entrou numa fase de intenso agravamento, fruto da correlação direta entre o discurso negacionista e o desprezo das autoridades federais pela gravidade da doença e o consequente descuido de parte da população, que passou a ignorar medidas de prevenção e a participar de aglomerações, fazendo subir os índices de contaminação aos piores momentos do ano.

Muitos estados e grandes cidades já estão sem leitos de UTI nos hospitais da rede pública, mesmo hospitais privados estão chegando ao limite de sua capacidade, e há registros diários chocantes de pacientes morrendo sentados em emergências de hospitais e em UPAs à espera de leitos adequados. O governo federal não tomou a tempo as medidas básicas indispensáveis para preparar o Brasil para uma vacinação em massa, o que devia ter feito antes mesmo de os primeiros imunizantes começarem a ser fabricados e distribuídos em vários países do mundo, como já está acontecendo.

A vacinação em massa no mundo começa a acontecer, mas tudo indica que os brasileiros ficarão para trás, por incompetência e descaso do governo.

Não há ainda um esquema claramente definido de compra e fabricação de vacinas, de compra e fabricação de seringas e agulhas, um plano logístico de transporte, distribuição e armazenamento de imunizantes, e sequer uma articulação e entendimento que envolva a União com estados e municípios para o trabalho de levar a vacina à população.

Não temos um plano nacional de vacinação que trate todos os estados com igualdade, traindo uma tradição brasileira de décadas de eficiência em vacinação em massa, modelo que sempre foi exemplo para o mundo.

Enquanto muitos países começam a vacinar suas populações, o governo brasileiro apenas acena, vagamente e sem objetivos claros, com prazos absurdos de no mínimo 60 a 70 dias para o início da imunização em território nacional, uma demora excessiva e inaceitável diante da gravidade e do recrudescimento da pandemia, apesar de existir uma lei, sancionada por este mesmo governo, que permite a liberação emergencial de qualquer vacina em 72 horas, desde que tenha sido testada e aprovada por agências estrangeiras equivalentes à Anvisa. Não há outra razão para esta demora que não seja o interesse político e ideológico e o desprezo pelos doentes e vítimas fatais da Covid19 neste momento agudo da pandemia.

A completa desarticulação do governo federal com os estados e os municípios, vale dizer com o povo brasileiro, produz conflito institucional e abre espaço para gestos e discursos perversos e oportunistas de caráter eleitoreiro.

Em paralelo, o Brasil é assolado pelo agravamento da crise social: a inflação dos alimentos dispara e bate recordes, o desemprego sobe a índices inéditos, ao mesmo tempo em que o auxílio emergencial está sendo extinto e a maior preocupação da área econômica, do Congresso e do mercado é manter o iníquo e injusto teto de gastos imposto pelo golpe de 2016.

O cenário em que esta grave crise acontece é o pior possível: destruição ambiental, volta da fome e da miséria e crescimento da violência contra os pobres, contra as mulheres e contra a população negra. Neste ambiente, proliferam crimes hediondos, assassinatos covardes cometidos por bandidos fardados e por milicianos – como os que mataram Marielle Franco e Anderson já há mil dias, sem que seus mandantes tenham sido apontados, e os que têm tirado a vida de crianças, como, há poucos dias, as meninas negras Emilly e Rebecca. Crimes cujos autores e responsáveis são protegidos por um manto vergonhoso de impunidade, garantida por instituições do Estado.

Não há dúvida de que o aumento da pandemia, o atraso na vacinação e a emergência social levarão o nosso povo ao desespero.
Os brasileiros não merecem isto.

As consequências serão muito dolorosas, o sofrimento será imenso e, por óbvio, serão ainda piores para os mais vulneráveis.
Se 2020 foi um ano terrível para todos, sobretudo para os pobres, 2021 ameaça ser muito pior.

O Brasil não aguenta mais tanta incompetência, tanta irresponsabilidade, tanto desleixo e descaso com a vida humana e com o sofrimento do povo.

Está mais que passada a hora de tomar uma atitude.

Hora de dizer um basta a este governo de cínicos e autoritários.

Hora de gritar abaixo Mourão e abaixo Bolsonaro, única maneira de salvar vidas, evitar o colapso absoluto e pensar na reconstrução do Brasil.