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Por Moisés Mendes
Os generais podem abandonar Bolsonaro, em algum momento, como já abandonaram muita gente boa no meio do caminho. A História do poder em diferentes épocas e países tem inúmeros casos de abandonos surpreendentes.
Até porque já está consagrado que eles não consideram Bolsonaro um militar clássico, o que facilitaria uma retirada.
Bolsonaro apenas serviu ao Exército, como já observou o general Eduardo Villas Bôas, autor da nota que alertou o Supremo de que algo poderia acontecer se Lula fosse beneficiado por habeas corpus, antes de ser preso em 2018.
Que compromisso pode existir entre eles no sentido de assegurar a Bolsonaro proteção especial incondicional por ser militar? É improvável que existia algum pacto, mesmo que informal.
Hoje, Bolsonaro é protegido porque prestou-se ao projeto de impedir a candidatura de Lula, foi eleito, militarizou o governo e criou vínculos e cumplicidades com as Forças Armadas. Será difícil desfazer esse emaranhado.
Se Bolsonaro perder o apoio popular que lhe resta e ficar sem a proteção do centrão, os militares poderão sentir que o homem está desamparado e ir embora.
Se a imagem das Forças Armadas for comprometida ainda mais, e o governo não tiver lastro para se manter de pé, tudo pode acontecer. Por que os generais ficariam com um Bolsonaro sem poder?
Mas há um problema levantado por Dilma Rousseff em entrevista à TV 247. Não é um probleminha. Bolsonaro empregou milhares de militares.
Não se trata do debate sobre o tamanho do apoio militar a Bolsonaro dentro do governo e dentro dos quartéis, ou seja, entre os reformados e os quadros da ativa. Não é isso.
O problema são os empregados de escalões menores. Dilma calcula que sejam até 11 mil militares trabalhando para Bolsonaro.
São oficiais médios, que o governo chamou para todas as áreas, muitos sem habilitação para a função assumida, ou talvez a maioria.
Há oficiais em todos os ministérios. Os subalternos imediatos de Eduardo Pazuello na saúde são oficiais. Especializados no quê?
Além dos generais do primeiro escalão, há coronéis, majores, capitães em toda parte. Bolsonaro deu emprego a esse pessoal, ou criou o que alguns chamam de boquinhas.
O suporte político da ponta da pirâmide é o dos generais. Mas o suporte de base é do pessoal que ganhou um emprego.
O governo Bolsonaro deve ser um dos mais militarizados nas democracias (mesmo que precárias, como a nossa). Uma militarização que é menos funcional e mais política.
E aí surge a questão levantada pela presidenta cassada há cinco anos. Dilma disse ao 247 que “não é possível supor que será algo tranquilo tirar 11 mil militares do governo e fazê-los voltar ao quartel”.
Mesmo que os generais abandonem Bolsonaro, que as Forças Armadas se desvinculem do seu fracasso e que os chefes de todas as Armas deixem claro que não pertencem mais ao governo, porque são servidores do Estado, o que fazer com os subalternos?
Quem vai mandar os subalternos embora? É bem complicado. Bolsonaro cercou-se da força militar, em todos os níveis, e apostou na extensão do seu projeto às polícias militares dos Estados.
O sujeito deseja que as PMs tenham mais poder e até generais (hoje têm no máximo coronéis). O plano é montar uma trincheira de militares e milicianos e armar boa parte da população.
Bolsonaro quer ser um déspota protegido por armas, como nem os ditadores de pos-64 foram. Mas há problemas.
Na hora em que perder o suporte dos que talvez o sustentam, porque um dia tiveram quatro estrelas nos ombros, o baixo oficialato será suficiente para segurar o governo?
Só saberemos quando algo mais grave acontecer. Dizem, a partir das referências históricas, que nenhum general tem certeza do controle absoluto das suas tropas. Que certeza pode ter o tenente que se reformou como capitão?
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