Gosto de uma passagem de Montaigne em que ele discorre sobre as virtudes da simplicidade ao falar.
Ele conta que, na Grécia antiga, um candidato fez um discurso longo para uma multidão, repleto de promessas e de truques retóricos.
Seu adversário disse apenas o seguinte: “O que ele prometeu eu vou fazer.”
A passagem cômica de Montaigne me ocorreu diante de uma situação trágica: o discurso de posse de Sarney quando ele estava assumindo o cargo de governador do Maranhão pela primeira vez, em 1966.
A cena foi imortalizada pela figura improvável de Glauber Rocha, que tinha sido convidado para registrar a posse de Sarney.
São dez minutos de um vídeo que resume a história do Maranhão, objeto de meio século de predação pela dinastia que então se iniciava.
Enquanto Sarney promete mudar tudo no Maranhão, a câmara de Glauber capta o povo miserável, sofrido, espoliado.
São imagens que transmitem uma imensa tristeza a quem as vê. Como a sociedade brasileira pode tolerar tanta miséria, tanta desigualdade?
O que o poder público federal fez pelos desvalidos maranhenses nestes anos todos? Deixou-os entregues aos Sarneys, essencialmente. O que a mídia fez? Nada. Rigorosamente nada.
A nobreza da mídia está em dar voz em quem não a tem. A nossa dá a quem já a tem em proporções colossais. No caso do Maranhão, a mídia deu voz sempre à família Sarney, e jamais às vítimas dela.
Passados quase cinquenta anos do documento de Glauber, a única mudança concreta no Maranhão foi o enriquecimento brutal da família Sarney, e sua onipresença nos nomes de aeroportos, escolas, hospitais, ruas e o que mais deva ser batizado.
São tenebrosos os índices de desenvolvimento social do Maranhão. Basta dizer que é a pior expectativa de vida do Brasil, que já não é uma das maiores do mundo.
Lembremos Montaigne e a história dos candidatos gregos.
Alguém transformador poderia pegar hoje o discurso de Sarney em 1966 e dizer: “O que ele prometeu eu vou fazer.”