Publicado originalmente no Consultor Jurídico
Por Sérgio Rodas
O ministro Gilmar Mendes afirmou, nesta terça-feira (16/3), que “o relator não é o dono do processo” e não pode enviar processo ao Plenário se o julgamento já foi iniciado por turma do Supremo Tribunal Federal.
As declarações de Gilmar surgem após o ministro Luiz Edson Fachin enviar ao Plenário, na sexta-feira (12/3), sua decisão que decretou a incompetência da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba para julgar o ex-presidente Lula. O caso estava sendo avaliado pela 2ª Turma da corte.
Ao abrir a sessão da 2ª Turma desta terça, Gilmar Mendes, presidente do colegiado, afirmou que as turmas que compõem o Supremo representam a Corte de forma plena. Segundo ele, a repartição de tarefas entre o Plenário e as turmas visa concretizar o princípio do juiz natural.
De acordo com o ministro, “o relator não é dono do processo, proprietário dele, senão um mero mandatário”. Ele pode remeter processos ao Plenário, conforme o Regimento Interno do STF, mas apenas antes do início do julgamento de um processo, destacou.
“Uma vez iniciado o julgamento de um processo no âmbito de órgão colegiado, o relator não pode mais enviá-lo para o Plenário, pois a jurisdição da turma já foi iniciada”.
Segundo Gilmar, a discricionariedade do relator de mandar um caso para o Plenário “jamais pode ser entendida como prerrogativa”. “Nenhum ministro é maior do que a cúpula”.
Gilmar Mendes ressaltou que e preciso zelar pela lealdade para com as instituições — no caso, o Supremo. E declarou que o ordenamento jurídico brasileiro rechaça o manuseio das competências com o objetivo de alterar o julgamento de processos.
Guerra velada
Em 8 de março, Luiz Edson Fachin decidiu que a 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, que tinha Sergio Moro como juiz titular, é incompetente para processar e julgar o ex-presidente Lula e anulou as condenações do petista, restabelecendo seus direitos políticos. Os autos, que estavam no Paraná, devem ser enviados para a Justiça Federal de Brasília.
Depois da decisão, Fachin declarou que o pedido de suspeição de Moro perdeu o objeto. Ele tentava esvaziar o julgamento desde a última semana, como mostrou a ConJur. A ideia é preservar o “legado” da “lava jato” e evitar que a discussão sobre a atuação de Moro contamine os demais processos tocados pelo Ministério Público Federal do Paraná.
Contudo, o presidente da 2ª Turma do Supremo, Gilmar Mendes, colocou o processo em pauta, e a 2ª Turma do STF, por 4 votos a 1, decidiu em 9 de maio dar prosseguimento ao julgamento. Só Fachin ficou vencido; Gilmar, Nunes Marques, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski foram a favor da continuidade.
Os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski votaram por reconhecer a parcialidade de Moro. Logo após Gilmar enunciar seu voto, o ministro Nunes Marques, que votaria em seguida, pediu vista. Caberá ao integrante mais novo da corte desempatar o julgamento. Por ora, dois ministros votaram para reconhecer a suspeição de Moro e dois para negar o pedido da defesa de Lula.
Em 4 de dezembro de 2018, os ministros Edson Fachin, relator, e Cármen Lúcia votaram por negar o Habeas Corpus da defesa de Lula, alegando falta de imparcialidade de Moro. O julgamento foi interrompido por pedido de vista de Gilmar. Porém, Cármen afirmou nesta terça que vai votar depois de Nunes Marques; portanto, pode estar sinalizando mudança de entendimento.
Na sexta-feira (12/3), Edson Fachin submeteu ao Plenário do STF sua decisão que decretou a incompetência da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba para julgar Lula.
Fachin fundamentou sua decisão em dispositivos do Regimento Interno do STF. Entre eles, o artigo 22, parágrafo único, “b”. O dispositivo autoriza o relator a submeter caso a apreciação de todos os ministros “quando, em razão da relevância da questão jurídica ou da necessidade de prevenir divergência entre as turmas, convier pronunciamento do Plenário”.
Mudança de entendimento
Ao declarar a incompetência da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba para julgar Lula, Fachin revogou despacho de afetação do Habeas Corpus ao Plenário.
Em novembro de 2020, Fachin enviou o caso ao Plenário porque a defesa de Lula questionou a observância do precedente firmado pelo STF no julgamento da questão de ordem no Inquérito 4.310. Neste caso, o Supremo concluiu que Moro só teria competência para julgar os casos que teriam relação com a apuração de fraudes e desvio de recursos no âmbito da Petrobras.
No entanto, Fachin revogou a afetação ao Plenário por entender que a 2ª Turma do Supremo já havia, em diversos momentos, se pronunciado sobre a competência da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba.