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Por Moisés Mendes
Tem gosto e efeito de chá de boldo a conversa de pré-candidato do governador gaúcho na arrancada pela disputa de espaços na direita à eleição do ano que vem. Eduardo Leite pode fazer algum bem, talvez não faça tanto mal, mas parece não fazer falta. É um chá.
Vi a participação dele na Brazil Conference at Harvard & MIT, no sábado, com os presidenciáveis, organizada pela comunidade de estudantes brasileiros de Harvard em parceria com o Estadão.
Será difícil a vida de Leite na briga que já tem João Doria, Ciro Gomes, Luiz Henrique Mandetta, João Amoedo e Luciano Huck (não tem mais Sergio Moro) e pode ser ampliada com as presenças de Rodrigo Pacheco e Danilo Gentili.
Leite defendeu na live “uma política em que se respeite a opinião do outro”, para que haja a “cicatrização de feridas”, e apresentou suas ideias para o país em três eixos: retomada da economia e do emprego, melhoria da educação e proteção do meio ambiente.
Um sujeito desligado, completamente fora do ar, se daria conta de que Leite começa esquecendo da questão que aparece em todas as pesquisas (e mais ainda na pandemia) como a grande preocupação dos brasileiros.
Sim, a saúde não faz parte do que Leite chamou de três eixos. O sujeito poderia, para não dispensar os três eixos citados, acrescentar um quarto eixo.
Mas não deu bola para a saúde pública. A saúde de um país sem oxigênio não aparece no discurso do tucano. Falou de esforço fiscal, do controle de gastos, de reforma tributária e de privatizações. Mas não tocou em saúde.
No meio de uma pandemia, o tucano quer se apresentar ao Brasil com a velha conversa do gestor liberal. Por quê? Porque sua fala era para o público esclarecido da direita.
Mas não poderia, mesmo falando para um público bacana, pelo menos fazer uma referência, uma só, à área que, pela sabotagem de Bolsonaro, não consegue evitar o genocídio por falta de suporte básico, de UTIs, de profissionais e de remédios?
Leite quer livrar o país dos ódios, mas terá de ficar diante do que já fez pela exacerbação de confrontos. Não há como esquecer que ele assumiu no final da campanha de 2018 que estava com Bolsonaro e iria votar no sujeito.
Fez algumas declarações aparentemente encabuladas, mas abriu o voto e pediu votos para o homem que todos sabiam quem era. Identificou-se com Bolsonaro.
O gestor gaúcho carrega a tatuagem do bolsonarismo de ocasião e não conseguirá se livrar da marca com facilidade.
Venceu a eleição, está levando adiante o projeto reformista da direita e se apresenta como bom moço. É o consertador de cicatrizes.
É a conversa que tenta passar a ideia do cara de centro que é mesmo centrado. Leite vai tentar o que muitos tentaram com certo êxito.
Quer se acomodar num lugar em que o eleitor enxergue um pacificador. Como aconteceu com Germano Germano Rigotto em 2002 no Rio Grande do Sul. Mas Rigotto, esse sim um moderado, nunca tinha feito declaração em favor de nenhum líder da extrema direita.
O interessante é que Fernando Haddad fez no evento de sábado uma fala forte de solidariedade aos dois governadores tucanos (Doria e Leite) atacados por Bolsonaro.
Os outros dois participantes, Ciro Gomes e Luciano Huck, balançavam a cabeça e concordavam com Haddad. Leite ficou impassível.
No final, Doria, Ciro e o mediador, Hussein Kalout, bateram palmas para Haddad. Leite continuou impávido, sem piscar, como uma estátua.
Não precisava ter aplaudido, mas poderia ter mostrado alguma reação e agradecido, apenas com um sinal da cabeça, a condenação incisiva de Haddad aos ataques covardes que ele, Leite, sofre de Bolsonaro.
Ficou feio. Vai ser difícil para Eduardo Leite lidar com as cicatrizes políticas dos outros, tendo uma enorme cicatriz com um B tatuado na testa.