Originalmente publicado em REDE BRASIL ATUAL
Por Cida de Oliveira
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, movimentou em sua conta corrente a quantia de R$ 4,57 milhões entre o final de outubro de 2014 e dezembro de 2017. A informação consta de relatório de auditoria contábil ao qual a RBA teve acesso. Feito a partir de dados obtidos com a quebra do sigilo bancário de Salles, a auditoria foi determinada pela Justiça de São Paulo em novembro de 2019, no âmbito de inquérito civil do Ministério Público estadual.
O objetivo da promotoria é apurar suposto enriquecimento ilícito na época em que o ministro de Jair Bolsonaro fez parte do governo de Geraldo Alckmin (PSDB), em São Paulo. Para os promotores, seus ganhos podem ter chegado a R$ 7,4 milhões ao longo de cinco anos. Por isso, pediram também a quebra dos sigilos do escritório de Salles.
De março de 2013 a novembro de 2014, Salles foi secretário pessoal de Geraldo Alckmin. E voltou ocupando o cargo de secretário estadual de Meio Ambiente em julho de 2016, sendo exonerado em agosto de 2017. A remuneração média dos cargos era de R$ 18 mil. Além disso, o então secretário estava impedido de advogar. Como teria conseguido movimentar todo esse dinheiro?
Negociatas atribuídas a Salles
Investigações do MP-SP levantam indícios de que Ricardo Salles teria tocado negócios paralelos, como praticar tráfico de influência, advocacia administrativa e explorado seu prestígio com a proximidade à cúpula do governo paulista, entre outras negociatas. E que agiria como interlocutor de seu cliente, o Grupo Bueno Netto, junto a órgãos e funcionários públicos incumbidos de analisar questões de interesse de seus contratadores.
Quando deixou o posto de secretário pessoal do tucano, Salles passou a prestar serviços no grupo empresarial, coordenando a estratégia jurídica. Mas não era só. Dava telefonemas e visitava juízes e desembargadores, segundo o MP. Tudo sem procuração. Bastava sua figura influente.
Cronologia do enriquecimento
5/1/2012 a 30/10/2014 – Segundo a perícia, além do salário e adicionais como secretário pessoal de Alckmin, foram feitos depósitos em dinheiro, atribuídos a comissões por agendar reuniões de interlocutores com o governador. Nessa época, ele chegou a dizer à Justiça que não tinha dinheiro para pagar pensão alimentícia. Tinha em conta corrente R$ 17.864,56.
31/10/2014 a 18/12/2014 – Foi a partir daí que Salles teria começado a sair do patrimônio negativo e entra na fase de enriquecimento, chegando a juntar mais de R$ 9 milhões, conforme a auditoria. Teria recebido em sua conta corrente pessoa física R$ 312.212,41. Nessa época ele teria começado a agir envolvendo juízes, com o intuito de suspender sentença desfavorável de seu cliente. O caso está sendo investigado.
2/3/2015 a 7/7/2015 – Foram depositados em sua conta R$ 402.500 em 10 de março. Conforme o relatório pericial, o montante corresponde a uma ação para anular ato e registro societários de adversários de seu cliente, o que teria envolvido a Junta Comercial de São Paulo. E os extratos bancários mostram que em março de 2016 Ricardo Salles começaria a transferir R$ 60 mil para o seu cooperador na Junta Comercial. Os extratos apontam ainda transferência de R$ 30 mil em março, R$ 10 mil em maio e R$ 20 mil em julho. Essa ligação também está sob investigação.
Ingerência em laudos financeiros
7/2015 a 11/11/2015 – Nesse período foi depositado o montante de R$ 1.710.528,54. Há relatos de que, mesmo sendo ainda secretário pessoal do governador, Salles já prestava serviços ao Grupo Bueno Netto. Na época, teria se juntado ao delegado Ruy Karan Filho e ao então diretor da corregedoria Nestor Sampaio Penteado Filho, para pressionar o perito Rodney Ramos, do Instituto de Criminalística.
Segundo o MP, o trio exigia que o perito mudasse um laudo feito em 2014 para uma investigação da Delegacia de Crimes Financeiros do Departamento de Investigações Criminais (Deic). O laudo da discórdia versava sobre um suposto esquema de evasão de divisas e sonegação de impostos e fraude no pagamento de dívidas judiciais por empresas do grupo ao qual Salles prestava serviços. O caso foi denunciado ao MP-SP pelo próprio perito.
Conforme a perícia contábil, esse foi um período também em que foram feitos depósitos diários de R$ 30 mil entre 31 de agosto e 11 de setembro de 2015. E em 19 de outubro daquele ano, no valor de R$ 424.688, efetuados por sua mãe, Diva Carvalho de Aquino. No total, foram depositados R$ 689.989,10. Outra parte, no total de R$ 755.750, foi depositada na conta pessoal de Salles pelo seu escritório. E mais R$ 264.789,44.
Justiça a favor do cliente
17/11/2015 a 30/12/2015 – Ricardo Salles recebeu depósitos de R$ 375.625,00. Nessa mesma época, por meio da sua conta, foram feitos pagamentos na ordem de R$ 1.499.999. O período coincide com decisões de primeira instância, que teriam sido reformadas pelo Tribunal de Justiça, em favor do seu cliente.
19/2/2016 a 24/3/2016 – Foi feito depósito de R$ 433.000. Na época foi designada uma comissão técnica composta por peritos criminais contábeis para exame pericial complementar ao laudo do perito Rodney Ramos.
6/6/2016 a 25/7/2016 – Foram depositados R$ 176.900 em sua conta. No dia 18 de julho, Salles foi nomeado secretário estadual do Meio Ambiente em São Paulo. Parte dos depósitos foram feitos em dinheiro, em seis depósitos de R$ 9.900 cada. Da sua conta saíram pagamentos, o que segundo a perícia denotam interferências em prol do arquivamento de inquérito policial.
Lucrando enquanto secretário
12/9/2016 a 19/10/2016 – Depósito de R$ 238.700, dos quais R$ 170.000 foram transferidos. O detalhe é que, na época, foi instaurado novo procedimento contra o perito Rodney Ramos, para desqualificar seu laudo.
19/12/2016 a 13/12/2017 – Salles recebeu em sua conta R$ 927.672,28. Em 28 de agosto de 2017, ele foi exonerado de seu cargo de secretário de Meio Ambiente. Segundo o laudo contábil. parte dos recebimentos se deu enquanto ele ainda exercia a função pública. Nesse mesmo período teriam sido feitas interferências em uma disputa jurídica da Bueno Netto com uma empresa, no valor de R$ 200 milhões.
Em 19 de dezembro de 2016, recebeu depósito de R$ 170.926,14 e mais R$ 6.000. Em 18 de setembro de 2017, recebeu mais R$ 528.000, valores esses que seriam referentes a manipulações jurídicas em favor de seu cliente.
As movimentações financeiras, que o MP paulista acredita passar de R$ 7 milhões, pode ir bem além. Na quarta-feira (19), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes acatou pedido da Polícia Federal e determinou a quebra do sigilo do atual do ministro do Meio Ambiente. Desta vez, ele está sendo investigado no escândalo da venda de madeiras extraídas ilegalmente com as suas bênçãos.