Em um primeiro momento, a imagem da moça solitária xingada e agredida por uma horda de apoiadores de Bolsonaro pode sugerir o triunfo da barbárie sobre a civilidade. Vista com olhos atentos, entretanto, a cena é inspiradora e revela a coragem necessária para derrotar o bolsonarismo.
O fato ocorreu durante o desembarque do presidente no aeroporto de Vitória, na sexta-feira (11), de onde partiria para uma solenidade no interior do Espírito Santo. Entre fanáticos sem máscaras e vestidos de amarelo, Maria Clara Gama, de 27 anos, protestou sozinha contra a política genocida do presidente da república.
Usando máscara do tipo N95 e face shield, a moça exibiu em silêncio um cartaz escrito “Bem-vindo, 500.000”, referência ao número de mortes no país pela Covid 19. As duas palavras, o número e algumas cruzes desenhadas foram estopim para a fúria bolsonarista.
Maria Clara foi xingada por homens e mulheres jovens, de meia idade e idosos. Teve o cartaz retirado das suas mãos e rasgado. Por pouco não sofreu agressões físicas.
Solitária e de cabeça erguida diante da turba insana, Maria Clara foi gigante. Ignorou a opinião de amigos “mais sensatos”, segundo ela, e foi protestar contra o presidente numa cidade onde ele venceu com folga em 2018 e que elegeu para prefeito um admirador da ministra Damares.
Na cidade em que empresário dono de outdoors recebe ameaças por alugar os espaços para peças de protesto contra Bolsonaro.
Em um cenário em que muitos têm medo de colocar adesivos no carro ou vestir camisetas contra a república das milícias, não é exagero chamar Maria Clara de heroína.
Ela decidiu lutar contra o sentimento de impotência, conforme contou ao Globo, e produziu um ato de extrema potência. “Já perdi o medo”, disse ela.
O relato faz lembrar uma frase do escritor argelino Albert Camus: “E no meio de um inverno, finalmente aprendi que havia dentro de mim um verão invencível”.
Que a coragem de Maria Clara Gama desperte nas pessoas do bem o verão inabalável necessário para vencer a treva bolsonarista.