Após as complicações de saúde do presidente, que está internado por causa de obstrução intestinal, Adélio Bispo voltou a bombar nas redes.
Internautas questionam onde está Adélio e o que foi feito dele após ser acusado de esfaquear Bolsonaro em setembro de 2018.
A polêmica se estabeleceu entre bolsonaristas e críticos do presidente.
De um lado, apoiadores usam Adelio de bode expiatório para justificar cada espirro de Bolsonaro, enquanto outros acreditam que a facada nunca aconteceu e foi uma jogada eleitoral para o capitão poder escapar dos debates.
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Adélio está preso na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS).
Em maio, desembargadores do Tribunal Regional Federal decidiram que ele não poderá sofrer sanções administrativas pelo crime, já que tem laudo médico em que apresenta transtorno mental delirante persistente. Por isso, é considerado inimputável.
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O seu caso deverá voltar a ser discutido em julho de 2022, quando Adélio pode solicitar liberdade.
Embora não tenha sido condenado à prisão, ele foi mantido preso por ter sido considerado pessoa de alta periculosidade, cuja liberdade representaria risco a si e a terceiros.
Quem quer saber o paradeiro do autor da facada hoje nunca se importou com um fato real e que gera ainda mais suspeitas.
Carlos e Eduardo Bolsonaro frequentavam o mesmo clube de tiro, o 38, que Adélio, em Florianópolis.
Eis um fato que tem potencial para deixar todo mundo com a pulga atrás da orelha.
Renan Antunes contou essa história aqui no DCM.
O clube de tiro ponto 38 é um templo do bolsonarismo: a maioria dos frequentadores é gente sarada, bombada, tatuada, de sorriso forçado e pistola na cintura.
Localizado a 10 minutos da ponte Hercílio Luz, cartão postal de Floripa, o clube ganhou, nos cinco meses do governo Bolsonaro, a notoriedade que jamais teve em 27 anos de existência, graças a dois frequentadores ilustres e um maldito.
Os notáveis são os filhos do Bozo, o Zero 2 Carlos e o Zero 3 Eduardo.
O infame é Adélio Bispo, o maluco da facada de Juiz de Fora, gesto que catapultou a candidatura de Jair à presidência.
Por mais que se busque, ninguém conseguiu estabelecer uma conexão dos filhos do presidente com o maluco, exceto pelo fato de terem estado ao mesmo tempo no 38.
Corre uma versão que o clube pertence aos Bolsonaros, que seriam sócios ocultos.
É fake news. Talvez a fonte desta informação seja a mesma que espalhou que os filhos de Lula eram donos da JBS.
Passei duas tardes entre os frequentadores comuns do lugar – tem gente que chega de Porsche!
O pessoal fica algumas horas dando tiros em alvos de papel, ao custo mínimo de 99 reais a saraivada de balas calibre 22. Os preços sobem de acordo com o calibre.
O público principal é gente da segurança, mas também encontrei advogados e universitárias dando tiros nos estandes, só pelo prazer da coisa: tem gosto pra tudo.
O “ponto 38” do nome da casa significa o calibre do velho três oitão, arma padrão da polícia brasileira das antigas.
O clube foi fundado em 1992 por um delegado de polícia de Santa Catarina, Tim de Lima e Silva Hoerhann.
Eu conheci o delegado Tim. Ele é descendente do patrono do Exército, Luiz Alves de Lima e Silva, nosso Duque de Caxias.
Uma pesquisa histórica feita pela família, exibida em quadros no clube, sustenta que ela está no ramo de armas desde o tempo das Cruzadas, dos cristãos contra os mouros, no século XII.
A linhagem inicia por um certo Ferdinand Brandon, cavaleiro normando, ancestral dos Lima e Silva.
O lado Hoerhann também era de armas: o delegado Tim descende do fidalgo Miguel, instrutor de artilharia do império austro-húngaro, professor de esgrima de salão e ginástica sueca no… Maranhão!
Mais: em 1904, Miguel assinou o horripilante livro “A esgrima de baioneta”, muito popular na época.
O delegado tem uma mancha inapagável na carreira. Nos anos 80, ele foi encarregado de guardar um pacote de joias de um joalheiro morto num acidente aéreo.
Quando o pacote foi aberto pelas autoridades, havia pedras e até um bloco de concreto. Tim foi punido por negligência, mas as joias jamais reapareceram.
Tim ergueu o 38 num galpão industrial, ao lado da uma oficina mecânica, em local hoje muito valorizado, no bairro Campinas.
O salão de tiros é isolado da rua por uma chapa de aço de 15 milímetros, capaz de deter o chumbo de qualquer das armas ali existentes. Pode abrigar seis atiradores ao mesmo tempo.
Em quase três décadas no anonimato, o local reuniu a nata dos atiradores das redondezas – isto é, quem ama dar tiros, policiais e seguranças de lojas.
Hoje, os irmãos Tony e Rafael, filhos do delegado, administram o 38. Nenhum deles tem formação militar ou policial, mas se vestem como se estivessem enfrentando tempos pós apocalipse.
Tony (38) é parrudo, luta jiujitsu com os lendários irmãos Gracie e dizem que até ensina os caras.
Tony também dá cursos à polícia da China comunista, treinou a segurança do primeiro ministro – o que faz com que entre no radar como uma possível conexão vermelha.
Mesmo com este currículo de amigo de comunistas, Tony é amigão dos filhos do Bozo.
A amizade começou antes do pai virar candidato. Vem dos tempos em que o Zero 3 entrou na Polícia Federal e fez curso de treinamento com Tony, evoluindo para o clube. O Zero 2 veio junto com o brother.
Tony adquiriu a ojeriza dos Bolsonaros à imprensa e não dá entrevista. Ele fica num salão acima do retrato do duque, espiando pela janela, enquanto o pessoal de marketing da casa fala com o repórter.
O guru civil dos Lima e Silva é Olavo de Carvalho. Recebeu da família a medalha de amigo da família, honraria cunhada pela própria família.
O herói da turma é Troy, um amigo de Tony, da SWAT do estado americano de Oklahoma. Ele vem de tempos em tempos e pá, pum, ensina os nativos a atirar no estilo americano.
Os caras amam muito os States. Tanto que o salão de jogos ostenta uma bandeira americana tamanho gigante, maior do que uma brasileira.
Do outro lado, estão as bandeiras, também gigantes, do xerifado de Oklahoma e do estado de Oklahoma – uma espécie de nirvana para atiradores.
O 38 tem uma lojinha de armas, pequena, mas bem movimentada.
É uma sala com espingardas calibre 12 e revólveres até o 45. Há carabinas AR15 como as usadas pelo exército americano (e pelos traficantes cariocas), numa versão popular, ao custo de 14 mil reais.
O negócio de venda de armas é legal, registrado no Exército. Qualquer um pode entrar, escolher a arma, manuseá-la, dar tiros para testar e sair com uma embaixo do braço, desde que atendida uma pequena burocracia – a casa faz tudo para o cliente.
O negócio só vende armas importadas. Carlos Souza, double de instrutor e vendedor, explica que “as nacionais Rossi e CBC só dão problemas”.
E aí está o tchã do 38: todos os papos giram, naturalmente, em torno de armas. Fala-se do coice que dá uma 12 ao disparar? O vendedor engatilha a arma mesmo sem balas e oferece: “Ouça o clique”, ensina. Pá, bate o gatilho.
Outra rodinha de papo é sobre o revólver Colt 45. Tratava-se de uma réplica, não pude apurar se era chinesa.
Mais papo: alguém viu um meliante num terreno baldio perto das lojas Koerich e queria saber se alguém poderia ir dar uma olhada, mas ninguém se escalou.
O salão de jogos, o mesmo onde está o memorial ao Duque de Caxias, abriga também a mesa de sinuca e um pequeno bar, quase sempre vazio.
“O nosso horário forte é depois do expediente, o pessoal passa por aqui e lota os estandes. Dão uns tiros para relaxar e vão para casa”, explica Carlos.
Como é relaxar dando tiros: a pessoa escolhe as armas (ou traz a sua de casa) e entra no estande de tiro. Bota óculos e protetores de ouvido. Aí, compra um pacote de balas, coloca um meliante de papel como alvo e pipoca nele.
Feito isto, ele recolhe o “morto”, confere os acertos e, se estiver num grupo, vai comentar os furos com os amigos. Se estiver sozinho, pode fazer um discreto gesto de “yes”, com o punho fechado.
Não achei muita gente disposta a puxar papo comigo no 38.
Me senti um zero à esquerda ao comprar o pacote básico calibre 22, com direito a um guaraná e uma barra de cereais, ao preço promocional de 56 reais.
Enchi de balas meu alvo – se fosse um meliante de verdade, estaria no mínimo num hospital, com o peito furado.
Saí do estande para um grupinho de instrutores. O papo era sobre Troy, o americano, com chegada prevista para sábado – era como se Zeus fosse descer do Olimpo.
O pessoal que frequenta a casa tem um figurino mais ou menos padrão, começando por uma botinha 3×4 e calças com bolsos laterais, coldre fabricado no próprio 38, lanterna e faca na cintura.
Surpresa: apesar de SC ter um baixo índice de violência, um em cada 422 habitantes do estado tem uma arma.
Do outro lado do 38, atravessando a avenida, temos o mar, com seu azul profundo.