Quanto valem as crianças afegãs?

Atualizado em 13 de junho de 2013 às 17:12
Afeganistão sob a presença ocidental

 

Uma família inteira. Pai, mãe, seis filhos pequenos. O casal sem militância nenhuma. E  as crianças, bem, a maior delas com 10 anos.

Era uma vez.

Todos mortos num ataque dos drones ocidentais no Afeganistão. Drones, todos sabem, são aqueles aviões sem tripulação que, teleguiados, jogam bombas em alvos onde supostamente se encontram militantes islâmicos.

Eles representam o apogeu da covardia na guerra. Você não corre risco. É como se fosse um videogame. Esta foi a maior inovação ocidental na arte da guerra nos últimos anos. O ataque desferido a partir de uma sala refrigerada a milhares de quilômetros de distância. Você pode comer um BigMac com uma mão enquanto com a outra mata pessoas e destrói lugares já suficientemente destruídos.

Compare com a inovação islâmica. Os homens bombas simplesmente se explodem pela sua causa. Morrem aos pedaços para combater os inimigos. Preferem a morte pavorosa a aceitar que estrangeiros ocupem sua terra por razões não humanitárias, não civilizatórias, não virtuosas – mas meramente econômicas.

Agora mesmo.

Quantos novos homens bomba não terão surgido no Afeganistão, e outros países muçulmanos, pela mistura de ódio e de um sentimento urgente de vingança depois da morte da família afegã? Ou será que alguém acha que só nós ocidentais sentimos dor na morte de alguém?

Bin Laden, ele próprio, foi obra do Afeganistão. Nos anos 1990, ele combateu os russos que tinham ocupado o país — e recebeu ajuda americana. Bin Laden virou terrorista quando, expulsos afinal os russos, os americanos, em vez de ir embora, ficaram. Mudara apenas a língua falada pelos invasores estrangeiros.

Não há esperança nenhuma de solução bélica no Afeganistão. Os afegãos, segundo relatos insuspeitos como o do jornalista britânico Ben Anderson, autor de documentários sobre a guerra lá, acham que a vida era melhor antes, sob o Talibã. E abominam os soldados estrangeiros. Recentemente, cresceu o número de casos em que soldados afegãos atacam tropas ocidentais – com as quais deveriam teoricamente estar alinhados. Isso dá uma medida do desespero e da revolta dos afegãos.

Eis um trecho de um artigo de Anderson: “Fiz documentários nas províncias devastadas pela guerra no sul do Afeganistão durante os últimos cinco anos, para a BBC e HBO. Vi e registrei o aumento da violência e das baixas entre os civis afegãos e as nossas tropas. Enquanto isso estava acontecendo, comecei a ouvir as declarações de Washington, Londres e Cabul, afirmando que estamos cumprindo nossos objetivos e que o Talibam fora erradicado  de sua terra natal. O exato oposto do que eu estava vendo e gravando.”

Dentro desse quadro tenebroso, registrou-se uma pequena luz nesta semana. O novo presidente francês, François Hollande, fez uma visita de surpresa às tropas francesas no Afeganistão e avisou que vai tirá-las de lá ainda em 2012. Isso seria impensável sob Sarkozy, o pequeno mentecapto. Um homem faz, sim, diferença.

Por isso, clap, clap, clap para Hollande.

De pé.