No editorial desta terça-feira (19), a Globo afirmou que acusar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de genocida é um “abuso”. O advogado e professor de Direito Thiago Amparo foi às redes sociais refutar a tese do jornal.
Ele aponta 10 erros jurídicos no editorial sobre genocídio e pandemia. “Seria importante o Jornal, em prol da seriedade e imparcialidade, dar espaço a outras vozes jurídicas sobre o tema”, escreveu no Twitter.
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Confira os erros da Globo:
1) “intenção”, em direito penal, é “conhecimento”, não é abrir cabeça de Bolsonaro para saber o que ele quis. E nem precisaríamos. Há atos de Estado, como vetar água a indígenas e distribuir cloroquina a indígenas além de estimular a violência do garimpo.
2) o Artigo 25 do Estatuto de Roma detalha responsabilidade penal individual, em gradação; inclui “ordenar, solicitar ou instigar” e “colaborar”. Logo, acusar alguém de genocídio não é o mesmo que dizer que ele o praticou diretamente. Ignorar os níveis de resp. é leviano.
3) Sim, é difícil provar genocídio quando comparamos com crimes contra a humanidade (que dispensam o elemento subjetivo de intenção). No entanto, o editorial ignora a) que crime contra humanidade não é tipificado enquanto tal no Brasil; 2) difícil não significa implausível.
4) Ao colocar que no sistema internacional é difícil ser condenado por genocídio, o que é verdade, o jornal não exerce qualquer crítica que deveria se esperar sobre política internacional. Ser difícil a condenação não significa que não haja plausibilidade jurídica da acusação.
5) Jornal ignora o amplo leque de evidências com base em pesquisas da @Deisy_Venturae colegas da USP apontando que não se trata de omissão de Bolsonaro, mas que o morticínio se deu por uma série de ATOS do presidente e seu governo, e ignora o relatório da @coalizaonegra recente.
Mais cinco
6) Se o jornal @JornalOGlobo quiser ter um debate jurídico sério sobre crimes internacionais, haveria de ter passado pelos seguintes temas: 1) complementariedade do sistema internacional; 2) omissão da PGR; 3) atos vs. omissão; 4) níveis de responsabilidade; 5) fatos. Não o fez.
7) Não é fácil acusar de genocídio; há crivo que o TPI estabelece (gravidade, grau de responsabilidade, e acusações), além de provar que há intento de destruir grupo étnico-racial. O país que elegeu um ser que aplaude tortura deve ser inapto mesmo p/ enfrentar questões difíceis.
8) o que me espanta mais no editorial é que parece como a interrupção do bom debate: ao invés de exigir que se investigue a seriedade das acusações (seja genocídio ou não), editorial soa como que corroborando com a omissão da PGR: interrompe a seriedade das acusações s/ indígenas.
9) O editorial do @JornalOGlobo ao mencionar que “Mas nenhum deles (crimes) foi cometido especificamente contra os indígenas.” Interessante: quem disse isso? Houve investigação séria a respeito em qualquer âmbito? STF e @socioambienta apontam contrário covid19.socioambiental.org
10) Eu, como leitor e assinante do @JornalOGlobo, adoraria mandar estes pontos para o/a ombudsman do jornal, ou pedir um erramos. Mas, fun fact: jornal O Globo não tem nem ombudsman, nem seção de erramos. So much for self-criticism.
Há erros jurídicos no editorial do @JornalOGlobo sobre genocídio e pandemia. Seria importante o Jornal, em prol da seriedade e imparcialidade, dar espaço a outras vozes jurídicas sobre o tema. Aponto aqui alguns dos erros??: https://t.co/bemAzX3oOv
— Thiago Amparo (@thiamparo) October 19, 2021