Se você quer ter uma idéia real do que se passa no Oriente Médio, tenho uma recomendação: o documentário The Oath (O Juramento), da cineasta americana Laura Poitras.
Li a respeito. Fui procurá-lo e achei no iTunes. Aluguei e vi ontem mesmo.
O personagem central é um ex-guarda-costas de bin Laden, Abu Jandal. Hoje, ele vive no Iêmen. Quando o filme foi feito, ele trabalhava como motorista de táxi. O carro tinha sido comprado com o dinheiro dado por um programa social e político interessante do governo do Iêmen, chamado Diálogo. O objetivo desse programa é reintegrar militantes de grupos como o Al-Qaeda à sociedade, quando eles entendem que explodir bombas e a si mesmos não é a solução.
Foi o caso de Jandal.
Você vê que ele é um sujeito brilhante. Articulado, carismático. Pai de um garoto de uns seis, sete anos que ajuda a tornar o documentário ainda melhor. Num momento de oração, ose dois se curvam e o pai pergunta ao menino quantas vezes eles tinham que dar glória a Deus. “Duas?”, sugere a criança. “Trinta e três”, ensina o pai, para desânimo do filho.
Laura fez uma coisa engenhosa. Colocou uma câmara no táxi de Jandal. Você o vê em ação. Fora todas as virtudes do vídeo, além do mais você como que passeia pelas ruas do Iêmen e vê como trabalha lá um motorista de táxi. Não há taxímetro. Tudo é barganhado.
É um filme que eleva o espírito por causa do entusiasmo de Jandal. Mas ao mesmo tempo há uma tristeza profunda nele. Jandal carrega a culpa de ter levado seu irmão a militar na Al-Qaeda. O irmão, um mero figurante no grupo, acabou preso, e passou sete anos na terrível prisão americana de Guantánamo, em Cuba.
Jandal é uma espécie de mentor de jovens iemenitas. Conta para eles histórias sobre as quais eles têm curiosidade. Sobre bin Laden, por exemplo. “Todo mundo gostava dele porque nós enxergávamos nele um pai, e ele se comportava como se fôssemos filhos dele”, diz Jandal. Mas quando lhe perguntam o que ele acha de ataques como o de 11 de Setembro, ele diz: “Aprendi que guerra só no campo de batalha. Os inocentes não podem pagar o preço.”
Jandal conhecia todos os militantes que estavam nos aviões sequestrados para o 11 de Setembro. Era uma missão ultra-secreta, e ele não sabia de nada até ouvir a notícia. Eram seus amigos, e é visível sua emoção ao falar neles. Bin Laden, conta ele, dizia que a maior virtude do ataque fora dar um “tapa na cara” nos Estados Unidos.
O irmão de Jandal acabaria retornando ao Iêmen. Era o mesmo? Não. A alegria morrera nela, conta Jandal.
A perpetuação do ódio foi magistralmente registrada numa cena por Laura Poitras. Jandal mostra ao filho uma foto do irmão, ainda preso.
“Quem é?”, pergunta.
“O titio”, responde o menino.
“Onde ele está?”
“Em Cuba.”
“Fazendo o quê?”
“Na cadeia.”
“Quem prendeu ele?”
“Os Estados Unidos.”