Por que Israel não quer paz permanente: a visão de um historiador israelense

Atualizado em 31 de outubro de 2014 às 10:55

Publicado no dw.

Zimmermann
Zimmermann

A palavra “esperança” é problemática em Israel, diz o historiador Moshe Zimmermann, de Jerusalém. Enquanto o número de mortos já passa de 200 na atual ofensiva militar em Gaza, ele afirma que a direita – e isso inclui o governo – tem paradoxalmente medo de uma paz duradoura.

Filho de judeus de Hamburgo e diretor do centro de história alemã da Universidade Hebraica de Jerusalém, Zimmermann diz que a maioria em Israel é hoje refém nas mãos dos colonos. “São eles que têm a predominância, mesmo que indiretamente, e praticam a sua política dentro do governo”, opina, em entrevista à DW.

Deutsche Welle:Como o senhor avalia o clima em Israel neste momento?
Moshe Zimmermann: O clima é tenso, obviamente. Porém, excluídos os cerca de 1 milhão de israelenses que vivem nas imediações da Faixa de Gaza, a maioria só afetada até certo ponto pelos ataques de mísseis. É claro que o barulho das sirenes irrita muito. Mas as pessoas já aprenderam a viver com ele.

Segundo dados das Forças Armadas de Israel, o sistema de defesa Iron Dome intercepta 90% dos mísseis lançados contra o país. Para muitos israelenses, a guerra perdeu seu aspecto de horror?
Com o sistema de defesa, as explosões de mísseis tornaram-se, de fato, mais raras. Tem-se mais medo da incerteza, do barulho, das sirenes – mas é tudo. E, de fato, isso acaba criando certo relaxamento, no sentido de “nós temos mais resistência e força do que o outro lado”. As pessoas pensam menos numa solução real, e sim apenas na questão: quanto tempo ainda vai durar?

Essa atitude também implica certa resignação? Abandonou-se a esperança de uma solução real para o conflito?
A palavra “esperança” é problemática, aqui. A esquerda israelense jamais perdeu a esperança. A direita, porém – e isso inclui o governo – tem, paradoxalmente, antes medo de uma paz duradoura. Pois uma paz significaria Israel abrir mão de grande parte da Cisjordânia, coisa que os nacionalistas e os colonos israelenses querem evitar a qualquer custo.

Em seu livro Die Angst vor dem Frieden: Das israelische Dilemma(“O medo da paz: O dilema israelense”, em tradução livre), o senhor esboça justamente essa problemática, defendendo a tese de que um setor extremista da sociedade israelense, que não tem nenhum interesse na paz, impõe a própria política à maioria do país…
Pode-se formular de maneira até mais extrema: a maioria em Israel é refém nas mãos dos colonos. São eles que têm a predominância, mesmo que indiretamente, e praticam a sua política dentro do governo [do primeiro-ministro Benjamin] Netanyahu. Nem lhes passa pela cabeça a ideia de realizar negociações de paz com os palestinos, agora. Para eles foi até motivo de alegria terem fracassado as conversações de paz promovidas pelos Estados Unidos em abril, e eles pensaram que agora podiam continuar com a política de assentamento.

Há muito o senhor é uma das vozes de advertência em Israel, que se manifestam pela reconciliação com os palestinos e contra a ocupação. Onde estão os seus correligionários?
A direita israelense vive atacando os intelectuais como capangas da esquerda. Observando-se atentamente, há alguns intelectuais de esquerda em Israel que fazem alarde e conseguem se fazer notar também no exterior. Porém a maior parte daqueles que são considerados cultos e intelectuais tende a “uivar com os lobos”. Quando a maioria espera que alguém bata com o punho na mesa, que se mostre força, aí os intelectuais não tentam gritar contra o vento, mas sim se acomodam. Essa é uma dinâmica que deveria nos preocupar.

Existem iniciativas concretas pelo fim do conflito no meio cultural de Israel?
Seguramente há, entre nós, esforços nesse sentido. Muitos artistas, das mais diversas áreas, se engajam, e frequentemente com ações bem diretas. Mas eles também sabem: tão logo se manifestam pela paz com os palestinos, vem do outro lado a acusação de serem traidores do próprio povo.

O senhor ensina história na Universidade Hebraica de Jerusalém. Os seus alunos ainda acreditam no movimento pacifista, ou a tendência direitista também atravessa a classe estudantil?
Antes havia mais estudantes de esquerda do que hoje. Hoje, a maioria dos que se manifestam vem, sobretudo, da ala da direita. Por outro lado, 10% dos estudantes em minha universidade são de origem árabe, e há também representantes estudantis dos partidos esquerdistas. Porém a maioria ou é indiferente ou apoia os “falcões” da política. Existem até mesmo organizações de orientação direitista no campus, que cuidam seriamente para que os docentes não levem mensagens de esquerda aos auditórios.