Terceira via é álibi perfeito para a mídia tradicional

Atualizado em 15 de abril de 2022 às 9:56
Luciano Bivar terceira via
O deputado Luciano Bivar (PE) – Foto: Michel Jesus/ Câmara dos Deputados

O Partido dos trabalhadores delimitou em que posição pretende disputar voto nas próximas eleições de outubro. Vai estar no campo centro-esquerda, ampliando o seu leque de aliados, a fim de vencer e retirar do poder aquele que destrói as instituições, os programas sociais, o país e a paz, enfim, desde que assumiu, em janeiro de 2019. Para isto, a coligação nacional com o PSB apresentou formalmente o nome do ex-governador Geraldo Alckmin para compor a chapa como candidato a Vice-Presidente de Lula. O nome do ex-governador de São Paulo foi aprovado por 81% do Diretório Nacional do PT, resultado que deve se repetir no encontro nacional do partido, marcado para 4 e 5 de junho.

Coincidentemente, no mesmo dia, circulou uma pesquisa Sensus/Isto É, com o seguinte resultado:O ex-presidente tem 43,3% contra 28,8% de Bolsonaro (PL). Ciro (PDT) aparece com 6,3% e Doria (PSDB) 2,6% das intenções de votos. Levando-se em conta os votos válidos, o pré-candidato da federação (PT, PCdoB e PV) teria 50,8%, o que lhe garantiria a vitória na primeira etapa da disputa.

Desde que as pesquisas têm medido o pulso do cenário político, tem sido assim. O ex-presidente lidera. Mas nem ousem discutir em sua frente esta possibilidade -, a de vitória no primeiro turno. Lula se arrepia e retruca que há muito trabalho pela frente. Jogar com esta possibilidade, para ele, é diminuir o valor da passagem para o segundo turno, na disputa. Dará ao feito o gosto de derrota.

Em compensação, o recado do partido para a militância é o inverso. Lutem pela chance de levar no primeiro turno. A vitória nestas condições é a saída para uma eleição acirrada, que se desenha violenta e – como escreveu o decano Jânio de Freitas -, caminha sob a ameaça de um golpe. Sabe-se lá de que natureza, mas com sua sagacidade, o Jânio alertou. Não virá depois da possível derrota em dois turnos de Bolsonaro. O mais provável é que esteja sendo gestado entre os dois turnos, daí a importância de Lula levar na primeira etapa. Tornaria inequívoca a sua vitória.

Acontece que no meio do caminho há um 18 de maio, data prometida para a definição do lançamento de um nome único a disputar a presidência pela “terceira via”. Até aqui, Nesse mesmo espaço, se digladiam: João Dória (PSDB-SP), Eduardo Leite (PSDB-RS), Simone Tebet (MDB-MS) e, num último minuto, a Comissão Executiva Nacional Instituidora do União Brasil aprovou nesta quinta-feira (14), por unanimidade, a indicação do presidente nacional do partido, o deputado Luciano Bivar, como pré-candidato à Presidência da República.

A escolha ainda precisa ser chancelada na convenção do partido para que Bivar seja candidato nas eleições de outubro. As convenções partidárias devem acontecer entre 20 de julho e 5 de agosto. O União Brasil emitiu nota em que anuncia que, “a partir de agora, conforme combinado previamente, o União Brasil se reunirá com os demais partidos defensores dos mesmos ideais e projetos em busca de um nome de consenso”. União Brasil, MDB, PSDB e Cidadania pretendem lançar um candidato de consenso no dia 18 de maio. Bivar deve ser a indicação do União Brasil para o grupo.

Neste ponto, é preciso dar um stop(e aviso aos meus cinco leitores que vou me alongar), pois as coisas podem caminhar por outros rumos. Quais sejam? Não sei. Para não arriscar palpites, fiz uma viagem no tempo e fui consultar a bruxa dos almanaques da minha infância: “Madame Mim Borboleta”. Ela sim, mexendo no caldeirão onde fervem num caldo espesso asas de morcego com gravetos de ninho de corvo, pode ver na fumaça os destinos da eleição. E, para surpresa de todos, ela balança a cabeça e diz:

Nada de Bivar.

De acordo com a visão de Madame Mim, Bivar é um nome desconhecido do grande público e com zero penetração na mídia.

É preciso levar em conta a composição deste União Brasil –, adverte a bruxa, metida num camisolão roxo, sem interromper os movimentos de uma concha no caldeirão fumegante. E vai complementando, como se em transe estivesse:

Esses senhores vão levar em conta muitos fatores. Um deles, é que, sim, o nome escolhido precisa ter peso no Nordeste, para roubar votos do ex-presidente Lula, fortíssimo na região.

Ponto para Bivar?

-Não. Ele não é conhecido nem sequer nos estados vizinhos ao seu Pernambuco.

– João Dória, em que pese ter vencido as prévias do PSDB, tem índice de rejeição altíssimo e, embora seja lembrado, sim, pelas vacinas que forneceu à população, enquanto o outro lá negou a compra, tentando negociatas, não tem chance.

Lembrar das vacinas não é suficiente-, reage a bruxa.

– Eduardo Leite?

Também não. O povo não perdoa os que quebram palavra, rompem acordos, ainda que não tenham valor de lei. Como vão confiar em alguém que trai as prévias do seu partido?”– ela devolve. Acrescentando: “e ainda tem o agravante de ser do Sul, sem que seu nome tenha sido projetado para o resto do Brasil. Não há tempo para isto –, pondera.

– Ah! Então vão apontar a Simone Tebet.

– Seria interessante que dessem força para nós, as mulheres, mas ela teve uma participação importante, porém, fugaz, na CPI. Não deu para marcar presença. Tanto assim que patina lá em 1% nas pesquisas –, argumenta a bruxa, demonstrando estar antenada.

– Levando-se em conta que aquele juiz está sendo vetado dentro do próprio partido, o União Brasil, então quem será o nome que tem força na mídia, penetração no Nordeste e pode ser a carta na manga da “terceira via”?

Eles não estão dizendo que precisa estar mais bem posicionado nas pesquisas? Os votos daquele juiz foram em grande parte para o Bolsonaro, o que o ajudou a dar um pulinho. Sobra o coronel, o Ciro Gomes, que pode massagear o ego do Luciano Bivar, puxando seu nome para vice. Ele se sentirá recompensado, projetado nacionalmente e a mídia terá, enfim, a sua tão batalhada “terceira via” … Ciro tem minguados 6,3%, mas está na frente dos demais…

Bruxinha danada… Seria uma grande surpresa, mas faz sentido… Penetração no Nordeste, é conhecido de parte do público e tem recebido afagos da mídia, é verdade. No seminário organizado por Paulo Lemman, em Havard, isto ficou evidenciado. Ele recebeu tratamento diferenciado dos entrevistadores.

– Algo mais?

Sim. Ele que estava escanteado e aparentemente sem função, ganhou sangue novo, com a tarefa que lhe deram.

– Tarefa???

– Tarefa. O papel de Ciro não será vencer a eleição. Todos sabem a dificuldade que há nisto. Foi guindado para não ser tentado a abandonar o pleito, contribuindo para a vitória de Lula no primeiro turno. Seu papel é o de obstrução. A sua permanência na disputa é levar o jogo para um segundo turno. É não permitir a possibilidade de uma vitória do Lula no primeiro turno.

– Mas então a mídia está apostando em Bolsonaro???

Não. A mídia está apostando em si mesma. Ela não aposta mais em Bolsonaro, mas Lula, nem pensar!

– Discordo. Evitando a vitória de Lula eles estão jogando as fichas em Bolsonaro.

– Por isto é que lutam desesperadamente por uma terceira via. Com apenas Lula e Bolsonaro na liderança da disputa, a mídia terá que se posicionar abertamente, como fez em 2018, sem pudor. Resultado: a conta caiu no colo dela. Não há no país um sujeito consciente da nossa situação que não estique o dedo para um jornalista da mídia tradicional e diga: a culpa é de vocês. Com uma opção entre um e outro, eles terão o álibi perfeito. Não trabalharam por Bolsonaro e Lula, de jeito nenhum. A opção e o apoio foi para um candidato sem chance, mas o álibi que procuram para que amanhã, se tudo der errado e Bolsonaro permanecer no poder, ninguém lhes aponte o dedo, dizendo: a culpa é de vocês.

Artigo escrito pela jornalista Denise Assis para o Jornalistas pela Democracia