O apoio do eleitorado evangélico é a trincheira apropriada pelo bolsonarismo para defender, de modo farsesco e hipócrita, virtudes incompatíveis com a essência de Bolsonaro – um verdadeiro anticristo.
Essa manipulação precisa ser desfeita para expor – sob a perspectiva religiosa – o verdadeiro caráter demoníaco, destrutivo e herege ocultado pela fraude de uma máquina de propaganda fundamentalista.
Significa corroer por dentro e com uso de referências sacras a fantasia da mitificação operada politicamente pelo extremismo em benefício próprio.
O enfrentamento da oposição, de parte da mídia e do campo progressista a esse engodo moral-religioso se acanha, via de regra, por preconceito, discordância filosófica e incerteza sobre o resultado prático.
Há quem considere incongruente explorar mazelas do governo e, ao mesmo tempo, eviscerar a conspurcação e o exercício deformado da cristandade.
Ou mesmo veja – por divergir da crença ou minimizar o poder de reflexão dos fiéis – impossibilidade de o eleitorado ser persuadido pela comunicação.
Essa percepção neutraliza ofensivas na seara da fé e dá ao bolsonarismo o monopólio do diálogo com uma parcela expressiva da população – condição propícia à adulteração política.
É um equívoco porque a estratégia de convencimento não se fia na exclusividade temática nem há paradoxo entre táticas múltiplas para sensibilizar o eleitor.
A exploração de um conteúdo crítico sobre a delinquência religiosa bolsonarista pode (por que não?) desconstruir a imagem formada na base da metade evangélica até hoje seduzida pela extrema-direita.
A estruturação de uma produção maciça nessa esfera, aliás, ameaçaria um pilar de ação do bolsonarismo: o controle do debate público para manter a base excitada e a oposição sempre reativa, encurralada.
Não se trata de rebater artimanhas dos extremistas no campo dos costumes, mas de dominar essa pauta e significar os atos de Bolsonaro à luz da fé – ou da evidente distorção.
A matéria-prima é abundante.
O escândalo do Ministério da Educação, por exemplo, deu margem para expor a profanação da Bíblia, corrompida até com foto de ministro.
“Quem debocha da palavra sagrada é digno da sua fé?”
A negligência fatal com grávidas e bebês na pandemia é múltiplo desprezo à família e à vida, elementos nucleares do cristianismo – e situa Bolsonaro como abortista de fato.
“Quem é pró-vida assassina mães e filhos?”
Os indícios de desvios em todas as pastas evocam a quebra de mandamentos (Não furtarás) e a corrupção recorrente da conduta adequada a um temente a Deus.
O entorno de Lula parece ter farejado a relevância de adentrar esse terreno para desconstruir e expor a face demoníaca de Bolsonaro – em contraponto à imagem do petista como autêntico cristão.
Lula declarou, recentemente, ser “mais cristão” que o extremista, aceno claro à disputa do segmento considerado como “intocável” e “imutável” por resignados à esquerda.
Páginas do Tik Tok apoiadoras do petista difundem vídeos sobre a fraude cristã Bolsonaro fundamentados em passagens bíblicas – essencial para estabelecer identificação e diálogo com evangélicos.
No site do ex-presidente, há textos com imagens devidamente concebidos para enquadrar Bolsonaro até como violador contumaz dos 7 pecados capitais.
Essa seara é sensível ao bolsonarismo e, a despeito do entendimento de alguns analistas da esquerda, pode ser abalada a ponto de sangrar o apoio a Bolsonaro.
Não foi à toa o chilique do filho Carlos com a expressão “agente secreto de Satanás” usada em artigo sobre o pai – proteger a “aura sagrada” do Messias autoproclamado é vital à alienação.
Esse braço de comunicação, no entanto, não pode ficar à deriva da inventividade de petistas, simpatizantes de Lula ou críticos do atual governo.
Requer produção sistemática e permanente, com distribuição sólida e alcance abrangente – muito além da mera resposta (reação) a ações do bolsonarismo – para manter o adversário ocupado e na defensiva.
Por que não podcasts ou programas no YouTube para explorar continuamente o caráter anticristo de Bolsonaro, com envolvimento de pastores e fiéis progressistas?
Por que não depoimentos de pessoas horrorizadas pela profanação da fé cometida diariamente pelo clã bolsonarista, com análises baseadas na Bíblia?
Listas de transmissão, dissidências de igrejas, uma rede de comunicação estruturada para salvaguardar o evangelho da degeneração praticada pelo governo.
Não é objetivo subordinar bandeiras progressistas e avanços civilizatórios a dogmas religiosos ou fazer da pregação bíblica um parâmetro de governo.
Ao contrário: evidenciar como a vida prática dessa direita macula princípios da religião aproxima a cristandade do humanismo defendido pela esquerda.
“Quem é cristão de verdade vota em Lula” – deve ser esse o antídoto dos fiéis contra a prostituição reiterada da fé pelo bolsonarismo.
E isso amplia o dever de expor a ação cínica, o perfil farsesco e o uso degradante da crença para implodir parte do apoio basilar a Bolsonaro.
A cruzada religiosa não despreza – cabe ressaltar – a abordagem de aspectos pragmáticos em outras áreas (como educação, economia, saúde, trabalho) cruciais para convencer sobre o fracasso do bolsonarismo.
Mas é hora, sim, de revelar Bolsonaro como anticristo para exorcizar os demônios do Brasil.