Preso pela Polícia Federal na manhã desta quarta-feira (22), o ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, pastor presbiteriano, deixou o governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) em março após se ver enrolado em um escândalo envolvendo líderes religiosos. Agora, a conta chegou.
Ribeiro foi o quarto ministro da Educação a ser demitido na gestão bolsonarista. Uma das áreas com maior orçamento da Esplanada dos Ministérios, o setor foi também um dos mais afetados por cortes de gastos.
O ex-ministro permitiu que um grupo de pastores ligados a ele controlassem o ministério. Ele ajudou a formar um gabinete paralelo no MEC, composto por pastores que não tinham vínculo nenhum com a administração pública nem com o setor de ensino. Mas antes disso, ele já havia dado algumas declarações estúpidas e se envolvido em outras polêmicas.
Milton Ribeiro relacionou homossexualidade a famílias desajustadas
Dois meses depois de sua posse, em setembro de 2020, ele provocou perplexidade e reações na sociedade civil ao relacionar homossexualidade a famílias desajustadas.
Em entrevista ao Estadão, ele foi questionado sobre educação sexual na sala de aula e disse que era um tema importante para evitar gravidez precoce, mas que não era necessário discutir questões de gênero e homossexualidade.
“Acho que o adolescente que muitas vezes opta por andar no caminho do ‘homossexualismo’ tem um contexto familiar muito próximo, basta fazer uma pesquisa. São famílias desajustadas, algumas. Falta atenção do pai, falta atenção da mãe. Vejo menino de 12, 13 anos optando por ser gay. Nunca esteve com uma mulher de fato, com um homem de fato, e caminhar por aí. São questões de valores e princípios”, afirmou.
Ex-ministro disse que alunos com deficiência “atrapalham” e defendeu “universidade para poucos”
Em agosto do ano passado, ele afirmou que a inclusão de alunos com necessidades especiais “atrapalha” o aprendizado de outras crianças sem a mesma condição.
“O que é o inclusivismo? A criança com deficiência era colocada dentro de uma sala de alunos sem deficiência. Ela não aprendia, ela atrapalhava – entre aspas. Essa palavra eu falo com muito cuidado. Ela atrapalhava o aprendizado dos outros, porque a professora não tinha equipe, não tinha conhecimento para poder dar a ela atenção especial, e assim foi”, disse, em entrevista à TV Brasil.
Na mesma entrevista, Ribeiro defendeu uma universidade para poucos. “Você já está cansado de pegar, com todo o respeito que tenho aos motoristas, profissão muito digna, mas eu tenho muito engenheiro, muito advogado, dirigindo Uber, porque não consegue alocação devida. Universidade, na verdade, deveria ser para poucos, nesse sentido de ser útil à sociedade”, afirmou.
Mas o fator determinante para sua demissão foi a revelação do esquema envolvendo pastores no Ministério da Educação. Na gestão de Milton, os religiosos foram peças centrais no escândalo do balcão de negócios do MEC, negociando com prefeitos a liberação de recursos federais mesmo sem terem cargos no governo.
Pastores estiveram em dezenas de reuniões do MEC
Eles participaram de reuniões fechadas para discutir as prioridades da pasta e até o uso da verba destinada à educação no Brasil. Os pastores atuavam como lobistas, viajando em voos da FAB (Força Aérea Brasileira) e abrindo as portas do gabinete deo então ministro para prefeitos e empresários.
Quem liderava o grupo eram os pastores Gilmar Silva dos Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil, e Arilton Moura, assessor de Assuntos Políticos da entidade. Os dois também foram presos pela PF hoje.
Até a divulgação das denúncias, Gilmar e Arilton participaram de pelo menos 22 agendas oficiais no MEC em 15 meses. 19 delas contaram com a presença de Milton. Na agenda oficial do ex-ministro, as reuniões eram descritas como “de alinhamento político”.
O pastor Gilmar afirmou, em maio passado, que era o responsável por garantir verbas para prefeituras. A declaração ocorreu em uma viagem de Ribeiro ao município de Centro Novo do Maranhão (MA).
“Estamos fazendo um governo itinerante, principalmente através da Secretaria de Educação, levando aos municípios os recursos, o que o MEC tem, para os municípios”, disse ele em vídeo obtido pelo Estadão.
Milton Ribeiro disse priorizar amigos de pastor a pedido de Bolsonaro
Em áudio, o então ministro afirmou que permitiu a interferência de pastores no MEC “a pedido” de Bolsonaro. “Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, afirmou ele em conversa com prefeitos e os dois religiosos.
“Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, acrescentou.
Milton também indicou haver uma contrapartida à liberação de recursos da pasta. “Então o apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção das igrejas”. Na gravação, ele não dá detalhes de como esse apoio se concretizaria.
Hoje, o ex-ministro da Educação foi preso preventivamente em Santos. O mandado assinado pelo juiz federal Renato Borelli determina que ele seja levado para a Superintendência da Polícia Federal em Brasília, e que a audiência de custódia seja realizada ainda nesta tarde.