“Satanás mandou destruir o templo e precisamos de dinheiro”: o DCM foi ao culto no Templo de Salomão

Atualizado em 23 de agosto de 2014 às 15:22
Coisa do capeta
Coisa do capeta

 

“Estão vendo esta imagem aqui? Qual sensação ela causa para vocês?”, perguntou o bispo ao puxar um slide em uma projeção durante o culto religioso da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) no Templo de Salomão, no bairro do Brás, em São Paulo. “Ela é o diabo! Ela é o satanás! Precisamos de 150 mil reais para consertar a frente deste templo. Se cada um daqui doar 20 reais, nós conseguiremos o conserto apenas neste culto”.

A tentativa de “humilhar o satanás” dentro do Templo de Salomão é uma resposta ao acidente que ocorreu no dia 19 de agosto. Um ônibus que trafegava na Avenida Celso Garcia bateu em um carro e acabou invadindo a fachada, derrubando uma das grades e danificando parte do asfalto no impacto. Apesar de a Universal pedir dinheiro aos fiéis, apuramos no local que a calçada está consertada e o templo já estava com um acabamento novo. O único dano remanescente era parte da grama que foi retirada do local onde ocorreu o acidente.

Esta foi apenas uma das vezes em que os bispos e os sacerdotes da Universal presentes pediram o dízimo dos ganhos dos fiéis no primeiro culto público do Templo. O dinheiro é recolhido por voluntários e funcionários espalhados pela nave em que ocorrem os cultos, na base do edifício. Na cerimônia toda, a igreja pediu contribuições no começo da celebração, para tirar “amarrações do mal”, e na metade, para cobrir os gastos com o conserto. Na celebração, eles aceitavam pagamentos em cartões de débito ou de crédito.

Para comparecer ao Templo de Salomão, a única dificuldade é conseguir uma vaga em cultos que estão lotados, com cerca de 10 mil visitantes. Você deve ir a uma das unidades da Universal espalhadas em São Paulo e pedir um dos ingressos gratuitos.

A IURD pede apenas seu nome, email de contato e um telefone. O ingresso é uma pulseira colorida com o dia, acompanhado pelo horário. Você pode ir em caravanas organizadas pela igreja, por 45 reais, ou em uma das diversas linhas de ônibus de São Paulo que passam por ali.

Ao chegar no bairro do Brás, o comércio local vai perdendo espaço primeiro para a Igreja Universal que já estava instalada no local. No quarteirão seguinte, o Templo de Salomão se ergue imponente, quase como um castelo entre lojas, bares e todo o comércio local. A entrada é na própria Celso Garcia, em cinco tendas que guardam os detectores de metais.

Se você estiver portando um celular, funcionários da IURD pedem que siga por uma rampa que vai até o subsolo. Lá embaixo, além das vagas para carros, há 5 mil cofres com chaves para que você deixe aparelhos eletrônicos. No mesmo local, há mais detectores de metais e seguranças. Dentro do templo, os vigilantes também revistam quem estiver transitando por lá, inclusive nos banheiros.

O altar não possui os dizeres “Jesus Cristo é o Senhor”, padrão em outros estabelecimentos da IURD. A frase em destaque é “Santidade ao Senhor”. Os acabamentos dourados chamam a atenção, além da cobertura do memorial do templo, feita de cobre que brilha sob o sol forte. Para visitar o jardim e o próprio memorial, a Universal pede que os fiéis consigam uma credencial especial em suas filiais.

 

Loja nos arredores da igreja
Loja nos arredores da igreja / Foto Bia Parreiras

 

Ao entrar no Templo de Salomão, parece que as mulheres são as únicas que utilizam roupas categorizadas como “decentes” pela Universal. Camisas de manga longa, saias longas e roupas mais neutras deixaram as meninas de diversas classes sociais ali presentes dentro dos padrões exigidos pela igreja.

Os homens aparentemente não ligaram para as dicas. Havia alguns presentes de terno ou de camisa social, enquanto outros andavam de camiseta, com mangas curtas, e boné de aba reta, sem nenhuma preocupação em seguir recomendações ou sofrerem pressões da própria religião. Apesar do jeito relaxado, nenhum rapaz estava de bermuda.

A celebração

O culto parece uma mistura de sessão de cinema ou teatro com celebração religiosa. Antes do início, avisos pedem que os fieis não fiquem fora de seus lugares. “Por gentileza, permaneçam em suas cadeiras em oração. Não transitem nas dependências do templo”, repetem os alto-falantes.

Para acompanhar as 10 mil pessoas, pastores de terno e  funcionárias vestidas com túnicas brancas e faixas douradas na cintura conversam e orientam fiéis. As laterais possuem seis portas de saída, além da entrada na parte da frente com as pedras de Israel.

A cerimônia atrasou cerca de 10 minutos e durou cerca de uma hora e meia. Cada um dos funcionários ficou responsável por um quadrante de cadeiras dentro do Templo de Salomão. A iluminação fez um show de pirotecnia com o palco, que transmitia as falas do bispo em dois enormes telões nas laterais. Ora o palco era iluminado sozinho, ora todo o ambiente.

A celebração teve quatro grandes partes. O começo com canções e a expulsão de “amarrações de problemas”, em que o bispo pediu contribuições de pelo menos 10% para a igreja. Depois, as luzes se desligaram para mostrar uma reluzente cruz formada pelas luzes quadriculadas no teto. Na escuridão, gritos artificiais se misturavam com urros dos fiéis que tentavam tirar o mal de dentro de si. Uma mulher chegou a receber ajuda de uma funcionária da IURD naquela situação.

A terceira parte envolveu fiéis falando de como viveram milagres dentro do Templo de Salomão. Uma idosa que mora nos arredores do Brás disse que estava conseguindo andar sem bengala graças às “forças de Deus”. Pouco antes dos relatos, o celebrante pediu doações para pagar o estrago que o ônibus causou à fachada do templo.

O culto foi encerrado novamente na escuridão, com apenas a arca do altar iluminada, como um “tesouro divino”. Durante todo o tempo, o bispo falou sobre ambições materiais desde que os fiéis não tivessem medo de doar parte de suas riquezas para a igreja. O sacerdote também controlou a saída dos fiéis, avisando quais grupos deveriam sair em determinados portões do templo.

Outras religiões parecem competir por atenção com a Universal nos arredores do Templo de Salomão. Na frente da igreja há uma Paróquia São João Batista do Brás, que é católica, com um centro de reabilitação dos Alcoólicos Anônimos.

Um quarteirão ao lado existe a Igreja Evangélica Assembleia de Deus Brás, Ministério de Madureira. Nos fundos do Templo de Salomão, há ainda uma Igreja Evangélica Brasileira. Todas essas religiões diferentes estão no espaço de poucos metros uma da outra.

O comércio

O comércio da região se transformou para atender aos fiéis que invadiram o Brás. O DCM conversou com Márcio Freitas (45), gerente do Skina do Templo, uma cafeteria que faz sucesso na região graças à Universal. “O restaurante existe há dois anos e vendia bebidas alcoólicas com o nome de Doni’s. Hoje deixamos de trabalhar com caipirinha e mudamos o nome para Skina do Templo porque um parceiro nosso também é da igreja. Recebemos 10 mil pessoas na parte da manhã, todos os dias, e 24 mil tanto no sábado quanto no domingo”, explicou.

Daniele (27) trabalha na Lanchonete do Templo, ao lado da Skina, e não comemora tanto o público da Universal. “A gente também vende muita comida para as empresas que ficam próximas daqui”, diz.

A Galeria do Templo abriu 15 dias antes da inauguração do santuário da Igreja Universal. Quem nos contou detalhes foi Bruno (28), um dos vendedores da loja de bíblias e artigos religiosos. “Trabalhamos nesta área há 10 anos, em diferentes igrejas. Tivemos um boom absurdo de clientes com a inauguração do Templo de Salomão, mas as vendas normalizaram a partir do dia 31 de julho”, completou.

João Tavares não revelou a idade, mas disse que mora na Avenida Celso Garcia e vende na rua tanto uma havaiana em homenagem ao Templo de Salomão quanto um relógio baseado na igreja. “Deus me deu esse projeto há dois meses e acredito que vai dar tudo certo na minha vida”, conta.

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A entrada / Foto Bia Parreiras
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