O Parlamento Europeu aprovou hoje uma resolução sobre a posição da União Europeia quanto à violação dos direitos dos povos indigenas e ambientalistas no Brasil, na esteira do assassinato do jornalista Dom Philips, do ativista Bruno Pereira e de indígenas da etnia Guarani-Kaiowá. A resolução foi adotada por 362 votos a favor, 16 contra e 200 abstenções.
O documento lista as práticas e políticas violadoras das autoridades brasileiras a direitos dos povos indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais, e levanta questionamentos que podem impactar o Acordo De Associação Mercosul-União Europeia do ponto de vista ambiental e dos direitos humanos.
A resolução estabelece que a produção de bens colocados no mercado europeu não deve comportar a violação de direitos. Essa decisão inclui o Brasil em um grupo de países autoritários, párias internacionais, acusados de sérias violações aos direitos humanos.
A situação do Brasil se complica também porque vários membros importantes da UE (Bélgica, Países Baixos e Áustria) já vetaram em seus parlamentos nacionais a assinatura do Acordo UE-Mercosul até que o Brasil dê garantias críveis de proteção aos povos indígenas e preservação do meio-ambiente.
A Comissão Europeia planeja apresentar uma forma adicional de garantia de preservação do meio ambiente, que pode ser em forma de protocolo ao acordo, emenda ou instrumento similar. O acordo em si vem de um modelo obsoleto e desigual, numa lógica de fornecimento de commodities pelo Mercosul, em troca de produtos e serviços de alto valor agregado pela UE, o que piora o equilíbrio das trocas comerciais.
Ainda que as resoluções do parlamento europeu não tenham carater vinculante, elas sao uma declaracao politica sobre as diretrizes a serem seguidas, e estabelecem objetivos gerais da Uniao Europeia, uma especie de plano de governo.
Isso reforça a proposta de regulamento da UE em curso sobre a importação de produtos não associados ao desmatamento e que não interferem na proteção dos direitos dos povos indígenas e dos direitos humanos.
De acordo com o jurista Paulo Lugon Arantes, doutor em Direito Internacional pela Universidade de Leuven (Bélgica), “nas Nações Unidas, o Brasil apoiou a resolução sobre defensores de direitos indígenas e do meio ambiente, em 2019. Ano passado, os compromissos do Brasil durante a COP26 de diminuir o desmatamento não saíram do papel. A resolução de hoje coloca em cheque a consistência do discurso do Brasil nos foros internacionais.”
O documento também condena o assassinato de defensores do meio ambiente e dos direitos humanos, bem como dos povos indígenas no Brasil, e, mais recentemente, o assassinato de Dom Phillips e Bruno Pereira, além de exortar as autoridades brasileiras a realizarem uma investigação exaustiva, imparcial e independente sobre estas mortes e a garantirem o pleno respeito aos direitos processuais em todas as circunstâncias.
Do ponto de vista legislativo, a resolução vai na contramão do PL 191/2020, conhecido como “lei da destruição”, e do projeto de lei PL 490/2007 sobre a demarcação das terras indígenas, a PEC do Marco Temporal. Isso posto, o Brasil terá que provar que protege territórios indígenas para estreitar seus laços com a União Européia.
O posicionamento oficial da União Europeia dá um recado ao atual governo e a instituições brasileiras sobre as bases das relações comerciais com o Brasil. Elas estarão condicionadas à preservação do meio ambiente e proteção dos povos indigenas, e é sobre essa base que o país tem que se reintegrar no plano geopolítico.