“O avanço LGBT só ocorrerá com reforma política”: o ativista e candidato a deputado Maurício Moraes fala ao DCM

Atualizado em 20 de setembro de 2014 às 16:02
Maurício Moraes
Maurício Moraes

 

Maurício Moraes tem 32 anos, nasceu em Araçoiaba da Serra, interior paulista, e é candidato ao cargo de deputado federal pelo PT.  Gay assumido, filiou-se ao partido em 2002, mas saiu da militância política por causa do jornalismo. Foi repórter na Folha de S.Paulo e Estado de S.Paulo. Trabalhou na BBC, nas editorias de internacional, economia e cultura. Além disso, foi garçom em Londres e tentou ser diplomata.

O convite para entrar de vez na política veio do ex-ministro e agora candidato ao governo Alexandre Padilha. Maurício tem seu escritório político na Rua Augusta, próximo da casa noturna Inferno, e não tem a menor simpatia pela chamada “bancada evangélica” do Congresso, representada por figuras como o pastor Silas Malafaia e Marco Feliciano.

Ao DCM, Moraes falou sobre direitos dos homossexuais e transexuais, sobre os candidatos favoritos ao cargo de deputado federal em São Paulo, a regulação da mídia e o panorama das eleições em São Paulo.

Como você se sente sabendo que os políticos com maior intenção de voto em São Paulo para o cargo de deputado são Tiririca, Paulo Maluf e o pastor Marco Feliciano, nesta ordem?

Acho que isso é um reflexo do comportamento do eleitorado paulista, que escolhe um palhaço, um corrupto procurado pela Interpol e um outro palhaço, que é o Marco Feliciano. Isso ajuda a explicar porque este estado está reelegendo Geraldo Alckmin governador.

Você pretende defender os direitos LGBTs no Congresso?

Um eixo fundamental da minha campanha pelo PT são os direitos para gays, lésbicas, bissexuais, transexuais e transgêneros. Eles fazem parte de iniciativas para melhorar os direitos humanos, apesar das restrições impostas pela chamada “bancada evangélica”, e são lutas da minha plataforma política. No entanto, hoje não basta apenas garantir direitos como casamento e combater a homo-lesbo-transfobia.

É necessário fazer uma mudança para assegurar direitos. O avanço das políticas LGBT só vai ocorrer com uma reforma política. No atual formato, o Congresso só se constitui, por exemplo, de candidaturas ao cargo de deputado federal que dispõem de milhões reais de investimento. Por isso, só com a diversidade a gente consegue discutir reformas importantes, caso contrário essa bancada evangélica prevalece.

Você apoia a legalização da maconha?

Sim. Sou a favor da legalização da maconha como uma forma de revisar as políticas de guerra contra as drogas, tentando melhorar o foco da própria segurança pública para melhorar o país. Isso é uma forma de revisar as iniciativas nesse sentido, buscando diminuir a violência e tirando a desinformação das pessoas sobre as reais causas da criminalidade.

Maurício, o PT ou o atual governo Dilma foram coniventes, de alguma forma, com a chamada bancada evangélica?

Eu não diria que o atual governo retrocedeu nessas políticas a favor dos LGBTs, mas também não avançou o tanto que deveria ter evoluído. O fato é que o governo Dilma muitas vezes é mais refém da bancada evangélica no Congresso. É por isso que quando me perguntam sobre as medidas para aprovar direitos aos gays, eu sempre defendo uma ampla reforma política. No Brasil, a gente elege um presidente progressista, mas congressistas conservadores. Uma coisa depende da outra.

Esse conservadorismo já afetou governos do PT e já influiu em governos do PSDB. E isso vai acontecer com qualquer campanha que chegar ao Palácio do Planalto atualmente. É por isso que precisamos entender como funciona o nosso Congresso, como fundamentalistas religiosos se aproveitam do sistema e como devemos reformar a política de algum jeito.

Você é a favor de uma regulamentação dos meios de comunicação no Brasil?

Eu concordo que devemos discutir a regulamentação da mídia. Se fosse para estabelecer políticas públicas aos meios de comunicação, seria necessário formar um conselho com participação da sociedade civil para dar parâmetros e não para estabelecer qualquer forma de censura. É muito importante ressaltar esses detalhes, porque o meio conservador associa regulamentação com um método de censura.

A BBC em Londres enfrentou o maior escândalo de sua história no ano passado com acusações de uma rede de pedofilia envolvendo o apresentador Jimmy Savile dentro da emissora. Quando se descobre esse tipo de coisa no Reino Unido, entra uma comissão que regulamenta a mídia no país. Eles notificaram a BBC dizendo que esse tipo de atitude não condiz com uma emissora pública de televisão, provocando depois a demissão do diretor-geral do canal. Os ingleses têm leis regulamentando a mídia e que são estabelecidas de maneira democrática.

No caso dos brasileiros, temos que garantir o direito de resposta nos meios de comunicação e, mais importante, começar a repensar as concessões públicas de rádio e televisão. Hoje, se você for ver com atenção, grande parte dos canais são vendidos para organizações religiosas. A maior parte dos políticos donos de concessões públicas está ligada às igrejas evangélicas. Considerando isso, quais são os objetivos dessas empresas? Elas têm algum objetivo social para o país ou são utilizadas como instrumentos de poder para fazer lobby? É por isso que temos que pensar nas questões da mídia no Brasil. Toda essa estrutura é arcaica e vem da época da ditadura, que ainda não foi discutida. Pela Constituição, a democratização da mídia é um direito previsto, falta ainda uma regulamentação. 

Vi que você trabalhou na BBC, na Folha e no Estadão. Seu trabalho de jornalista não conflitou com suas convicções políticas com as denúncias da imprensa sobre o PT?

Eu me filiei ao PT em 2002 na minha cidade natal, em Araçoiaba da Serra. Aquele momento foi forte, mas até pela natureza do meu trabalho jornalístico eu acabei me afastando da militância partidária. Mantive minha filiação, mas reduzi minhas atividades políticas. Decidi voltar ao PT neste ano. Na maior parte do meu tempo de jornalismo, eu não escrevi sobre política nacional. Cobri política internacional, economia e cultura. Só acompanhei o cenário brasileiro, sabendo que a imprensa fez acusações de corrupção contra o PT. Por isso me senti à vontade para fazer boas reportagens e preservei minhas convicções pessoais.

Como Alexandre Padilha te ajudou na campanha?

Sou candidato pela primeira vez ao cargo de deputado federal e já tinha isso como plano. Antes eu iria fazer mestrado em administração pública, mas acabei adiando meus estudos depois que falei com o Padilha, entre fevereiro e março deste ano. Foi tudo muito rápido. Ele me passou o email pessoal dele e acabamos trocando mensagens por algum tempo. Depois de algumas semanas eu falei com o diretório estadual do PT.

Uma reportagem da revista Carta Capital afirma que você quer “oxigenar” o PT. Isso é verdade?

Olha, eu, Maurício, sozinho não sou capaz de oxigenar o maior partido de esquerda do país. Mas eu espero que a minha candidatura contribua para levar o PT para um caminho progressista. Eu sinto muita gente se aproximar justamente buscando uma novidade e talvez uma oxigenação. A campanha pode ser um caminho para isso.

Por que vocês optaram por construir seu escritório próximo do clube Inferno, na Augusta?

A gente conseguiu esse espaço e foi puta coincidência ser na frente do Inferno. Não escolhemos isso, mas agora já foi e chama atenção (risos).

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