Publicado originalmente na RFi
A política investiga se o brasileiro autor da tentativa de assassinato tinha cúmplices ou se é “um lobo solitário”. Fernando André Sapag Montiel, de 35 anos, filho de mãe argentina, radicado em Buenos Aires desde a infância, apontou uma pistola a poucos centímetros do rosto de Cristina Kirchner. Fernando chegou a puxar o gatilho da arma carregada, mas o tiro falhou.
A Justiça procura determinar se Fernando agiu sozinho ou se tinha conexões na Argentina ou no exterior. A polícia revistou a quitinete de 15 metros quadrados que Fernando aluga há oito meses nos fundos do terreno de uma casa. Foram encontrados 100 projéteis em duas caixas, lixo espalhado e elementos de fetichismo sexual como lingerie feminina, vibradores e um chicote de couro. O calibre da munição não coincide com a pistola usada para a tentativa de crime.
Símbolos nazistas
Sergio Paroldi, dono da casa, conta que o brasileiro parecia uma pessoa “normal e educada” e que tinha três carros com os quais trabalhava como motorista de aplicativos. Dois carros eram alugados a terceiros com a mesma finalidade.
Três tatuagens pelo corpo de Fernando Montiel remetem a signos neonazistas, como o “sol preto” no cotovelo direito, em referência a uma ramificação do nazismo alemão de Adolf Hitler.
“Se Fernando apontou contra Cristina, poderia ter apontado contra mim também. Tenho medo agora que venham amigos neonazistas dele atrás de mim por ter chamado a polícia”, afirmou Paroldi.
Mario, um amigo de Fernando desde a adolescência, revelou que há 10 meses o agressor contou que compraria uma arma. “Eu acredito que a intenção original dele era matá-la, sim. Mas, infelizmente, ele não ensaiou antes”, disse Mario à imprensa argentina, provocando mais indignação.
“Ele sempre dizia que tinha armas, mas como tinha fama de mitomaníaco, deixávamos que ele falasse”, acrescentou.
Manifestações contra o ódio
Desde a manhã, milhares de manifestantes em toda a Argentina marcham em solidariedade a Cristina Kirchner e contra o discurso de ódio. Por todo o país, integrantes de organizações políticas, sociais e sindicais, aliadas do governo, protestam sob o lema da “solidariedade a Cristina Kirchner” e “a favor da democracia”.
Os manifestantes entoam lemas que apontam contra a imprensa, a oposição e a Justiça, que julga a ex-presidente por corrupção. Para o governo, conforme nota divulgada nesta tarde, esses três grupos perseguem a atual vice-presidente e ex-presidente, destilando um discurso de ódio que resulta em tentativas de agressões como a perpetrada pelo brasileiro Fernando Montiel, na noite de quinta-feira (1).
O presidente Alberto Fernández presidiu, nesta sexta-feira, uma reunião ministerial para “analisar o estado de comoção social derivado da tentativa de assassinato à Cristina Kirchner”, informou o governo, em uma nota.
“O gabinete ministerial participa da mobilização cidadã na Praça de Maio e convida todos os argentinos a se expressarem com bandeiras argentinas em defesa da democracia e em solidariedade com a vice-presidente”, indica a Casa Rosada. O texto acrescenta que o presidente “convocou os setores sindicais, sociais, empresariais e religiosos a construírem um amplo consenso contra os discursos de ódio e de violência”, afirma a nota oficial.
Com batuque, bandeiras e palavras de ordem, os manifestantes atendem ao pedido do governo, que decretou feriado nacional para facilitar a mobilização social, acatada por todas as repartições públicas do país. Até as partidas de futebol foram canceladas. A Associação do Futebol Argentino (AFA) condenou o frustrado atentado contra Cristina Kirchner.
As principais entidades católicas, judaicas e islâmicas emitiram em conjunto uma nota de repúdio ao atentado e expressaram “dor e preocupação”. Organizações empresariais e a oposição política também repudiaram a tentativa de assassinato, mas não se pronunciaram a favor das manifestações políticas.
Reações do papa e dos EUA
Próximo de Cristina Kirchner, o papa Francisco enviou um telegrama de solidariedade e depois telefonou para a vice-presidente. O pontífice disse que reza para que “na querida Argentina prevaleçam sempre a harmonia social o respeito pelos valores democráticos contra todo tipo de violência e de agressão”.
Os Estados Unidos condenaram “energicamente” o atentado. “Estamos com o governo e com o povo argentino em rejeição à violência e ao ódio”, expressou o secretário de Estado, Antony Blinken, através das redes sociais.