Na semana passada, o Globo Repórter retratou a Dinamarca, “o país da felicidade”.
O programa mostrou “as belezas e histórias de uma
terra onde as diferenças sociais são quase invisíveis”.
Fora tudo, a Globo não contou que um dos segredos do sucesso dos dinamarqueses é a regulação da mídia.
O Paulo Nogueira escreveu sobre o assunto em 2014:
A mídia britânica, nos últimos 60 anos, tem sido auto-regulada, como a brasileira. O escândalo do News of the World – que chocou a opinião pública depois que se soube que o tabloide de Murdoch invadira a caixa postal de uma garota de 13 anos sequestrada e morta – mostrou os limites da auto-regulação.
Para usar uma palavra, a auto-regulação fracassou miseravelmente na Inglaterra.
Os ingleses entraram em 2014 dando os toques finais num novo sistema de monitoramento da mídia. O ponto principal é que a auto-regulação será substituída por um modelo em que o órgão fiscalizador é independente das empresas jornalísticas. E também — vital — dos partidos políticos e do governo.
O Brasil, cedo ou tarde, e quanto mais cedo melhor, vai ter que enfrentar a mesma realidade: a falência da auto-regulação na mídia e, consequentemente, a necessidade de dar um passo adiante. O maior obstáculo reside nas grandes empresas de jornalismo, que por obtusidade ou má fé, ou uma mistura de ambas as coisas, rechaçam discussão preliminarmente sob o argumento, aspas, de que se trata de “censura” para a “imprensa livre”.
A não ser que consideremos a mídia acima da sociedade, o Brasil não poderá ficar acorrentado eternamente a uma auto-regulação que, como na Inglaterra, é nociva ao interesse público.
Não é certo que o interesse de milhões de brasileiros fique subordinado ao de quatro ou cinco famílias.
Há um modelo bom no qual se espelhar, e não estou falando da Lei de Meios da Argentina, que já nasce no seio de uma guerra entre o governo Kirchner e o Clarín. É melhor olhar para a Dinamarca do que para a Argentina. Os ingleses fizeram isso.
Sempre surge a Escandinávia, como o DCM tem afirmado exaustivamente, quando se trata de identificar ações de uma sociedade realmente avançada.
Os dinamarqueses encontraram uma forma de, preservada a liberdade de imprensa, controlar os excessos prejudiciais à sociedade como um todo.
O Brasil deveria estudar o caso aplicadamente.
Vigora, lá, uma “co-regulação”. Um comitê, presidido por um juiz da suprema corte, é formado por um grupo composto por 12 pessoas. Seis são designadas pela indústria da mídia, e seis pelo governo. (Nenhum destes seis últimos é funcionário do governo, mas pessoas que as autoridades entendem que dominam o assunto, contribuem para o debate e são independentes da indústria.)
O comitê tem um orçamento anual de cerca de 700 mil reais, bancados pelos jornais. Estes se comprometem a acatar as decisões.
Em 2012, foram encaminhadas ao conselho 157 queixas. Quarenta e duas foram consideradas legítimas. Os jornais que cometeram infrações publicaram, como sempre ocorre, o parecer do comitê na íntegra.
Retificações por erros cometidos, na Dinamarca, têm que ser visíveis. Devem estar na primeira página, com destaque. Recentemente, por exemplo, uma enfermeira foi erradamente citada como cúmplice num esquema de pedofilia. A correção veio na primeira página de quem cometeu o erro.
O conselho não estipula indenizações. Isso fica a cargo da justiça comum.
O Brasil, como a Inglaterra está fazendo, poderia olhar para o exemplo dinamarquês de “co-regulação” da mídia. Deveria. É muito mais avançado do que o que existe no Brasil – como, aliás, quase tudo que diga respeito ao modo de operação da sociedade escandinava.
O sistema dinamarquês não coíbe a livre imprensa — e sim a aperfeiçoa. E o Brasil precisa de uma mídia melhor do que a que temos, muito mais apegada a seus próprios interesses do que aos do país.
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