Por Leandro Fortes
Ao que se sabe, até a contagem mais recente, havia 283 nomes para os 16 grupos de trabalho organizados, até agora, pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, coordenador do gabinete de transição. Um número que chega a 300, quando se considera as coordenações e os grupos técnicos, dando a essa tropa o deleite da comparação mítica com aqueles outros, de Esparta, que teriam enfrentado, sozinhos, 10 mil guerreiros persas. A comparação, no entanto, para na matemática. Nem Alckimin tem vocação para Leônidas, nem o Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, em a amplitude espacial e simbólica da histórica cidade-estado da antiga civilização grega.
Na verdade, trata-se de um simpático balaio de gatos cuja missão, além de garantir a transição burocrática, em si, é a de acomodar todas as forças políticas que se uniram na batalha final do segundo turno contra o fascismo. Um exercício de gratidão que inclui o resgate de cadáveres políticos, como Cristovam Buarque, um morto-vivo que, até ontem, era tratado como traidor pelo PT e pelos petistas, por ter virado a casaca e apoiado o golpe contra Dilma Rousseff, em 2016. Buarque, ex-governador do Distrito Federal, foi encaixado no GT de Relações exteriores – sabe-se lá por que razão.
No mesmo GT, consta o nome do ex-senador do PSDB Aloysio Nunes Ferreira, que de motorista e guarda-costas de Carlos Marighella, nos tempos da luta armada contra a ditadura militar, também se projetou no golpe contra Dilma como ministro das Relações Exteriores do nefasto Michel Temer. A última notícia relevante que se tinha dele dizia respeito a uma saraivada de insultos dirigida ao militante petista Rodrigo Pilha, a quem o nobre tucano mandou ir à “puta que o pariu”, ao ser questionado sobre participação em um esquema de corrupção no metrô de São Paulo.
Cristovam e Nunes Ferreira, contra a lógica de suas trajetórias recentes, anunciaram voto em Lula, no segundo turno.
Justiça seja feita, nem só de contradições vivem os GTs da Transição. A maioria absoluta dos nomes veio do campo progressista e tem – ou tinha – ligações com as lutas populares vinculadas ao programa histórico do Partido dos Trabalhadores, seja por protagonismo pessoal, seja por participação direta ou indireta em gestões passadas de Lula e Dilma. Entre eles, os ex-ministro Celso Amorim (Relações Exteriores), Alexandre Padilha (Saúde), Paulo Bernardo (Comunicações) e Marina Silva (Meio Ambiente), esta última, um estudo de caso de como velhos ressentimentos e ódios ancestrais podem ser superados quando o objetivo da luta é vencer um terrível inimigo comum.
Essa multidão transitória suscita duas questões fundamentais. Primeiro, no campo da física: onde vai caber tanta gente no espaço destinado à transição, no CCBB de Brasília? Aparentemente, essa é uma missão impossível. O que leva a crer que muitos dos escolhidos vão atuar em home office. Segundo, de ordem prática: como tanta gente vai se reunir para discutir tanta coisa em pouco mais de 45 dias, tempo que falta para a posse de Lula?
Tudo demonstra, portanto, que a transição comandada por Alckmin é a construção geral do edifício de alianças que deverá, pelo menos em tese, dar sustentação política ao futuro governo no Congresso Nacional e junto a organizações essenciais da sociedade civil. Tudo mais virá de decisões do círculo pessoal de Lula e da cabeça do presidente eleito.