Quando o jornal vira uma ferragem. Por Moisés Mendes

Atualizado em 22 de fevereiro de 2023 às 15:20
Jornalista Janio de Freitas. Foto: Reprodução

Publicado originalmente no “Blog do Moisés Mendes”

A Folha demitiu Janio de Freitas e outros profissionais, mas não há com o que se surpreender. A todo momento o grande nome de um jornal é demitido.

Em 2017, Zero Hora mandou Luis Fernando Verissimo embora. Carlos Drummond de Andrade foi dispensado como cronista do Jornal do Brasil nos anos 80.

O que se pode prever, como movimento natural da Folha, é a renovação de nomes à esquerda, para compensar a saída de Janio.

Com um detalhe: o jornalista era colunista com vínculos com o jornal. Era empregado. A nova estratégia, que nem muito nova é, transforma colunistas em colaboradores.

O jornal deixa de ter jornalistas da equipe como articulistas e terceiriza a opinião e as responsabilidades com gente de fora. Globo, Estadão e Folha têm cada vez mais colunistas nessa situação.

É um truque que combina muitas vantagens para as corporações de mídia. O jornal paga o colunista por trabalho, sem vínculos, e economiza em encargos sociais, férias, FGTS etc.

E a opinião passa a ser do colunista, sem compromissos do jornal que a publica. Tem sido assim em toda parte.

Colunistas são cada vez mais especialistas em alguma coisa, geralmente da área acadêmica, com muitos títulos, e cada vez menos jornalistas.

O sonho nem tão secreto das grandes organizações é poder um dia fazer jornal sem jornalistas.

Se alguém da extrema direita reclama e ameaça, e eles vivem ameaçando, o jornal pode dizer que o colunista de esquerda é dono da sua opinião e que a empresa não avaliza o que ele escreve.

O detalhe interessante no caso da demissão de Janio é que a Folha publicou no domingo uma notícia que começa assim:

“O jornalista Janio de Freitas deixa de publicar sua coluna semanal na Folha a pedido do jornal, por contenção de despesas”.

É a primeira vez que, para explicar uma demissão em particular, um jornal apresenta publicamente como desculpa a redução de custos, como se fosse um açougue ou uma ferragem.

O leitor pode se lamentar por ter perdido o texto de Janio e ficar imaginando a fortuna que ele deveria estar recebendo da Folha.

O que se espera agora é a reposição. A Folha deve anunciar novos nomes com posições de esquerda e pode até surpreender.

Assim fará com que aos poucos Janio seja esquecido. Paga pouco, provoca impacto entre os leitores com a novidade, e a ferragem (ou melhor, o jornal) continua funcionando.

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