“Povo preto não é reconhecido em lugar nenhum”, diz ao DCM a 1ª vereadora negra de Florianópolis

Atualizado em 10 de fevereiro de 2023 às 19:25
A vereadora Tânia Ramos (PSOL), em frente à Câmara Municipal de Florianópolis. Foto: Bianca Taranti/Portal Catarinas/Reprodução

A professora e técnica de enfermagem Tânia Ramos, do PSOL de Florianópolis, tomou posse neste mês como a primeira vereadora negra da história da capital de Santa Catarina. O feito é emblemático pelo fato de o Estado não ter grande histórico de lideranças negras ocupando cargos políticos: até hoje, a única deputada estadual negra, por exemplo, foi Antonieta de Barros, que exerceu o mandato na década de 1930.

Tânia Ramos é uma das fundadoras do PSOL em Florianópolis e já se candidatou ao legislativo municipal quatro vezes. Em 2020, ela obteve 1581 votos, se tornando primeira suplente. Com o colega de bancada, Marcos José de Abreu, conhecido como Marquito, se elegendo deputado estadual nas eleições de 2022, Tânia Ramos está assumindo a vaga de vereadora. “As mulheres terão suas lutas e suas conquistas fortalecidas com nosso mandato, especialmente, as mulheres negras”, garantiu Tânia ao DCM.

Tânia com um dos netos no colo, durante a cerimônia de posse no legislativo municipal. Foto: Hermínio Nunes

Tânia é mãe de quatro filhos e avó de sete netos. Ela é fortemente vinculada ao carnaval, tendo sido a primeira mulher negra a presidir a Associação das Velhas Guardas do samba de Florianópolis. Conheceu ainda criança sua escola do coração, a Unidos da Coloninha, de que foi conselheira e presidente. “Vamos fazer um mandato democrático e a serviço dos interesses do povo”, afirmou a vereadora. Confira abaixo a entrevista completa do DCM com Tânia.

DCM: Você é a primeira vereadora negra de Florianópolis. O que isso representa, na sua avaliação, para a história da cidade e do Estado?

Tânia Ramos: A representatividade do povo preto, que sempre esteve na construção do país, mas, que hoje não é reconhecido nem visibilizado em lugar nenhum.

Quais ações são possíveis no combate ao racismo a partir da atuação na Câmara?

Primeiramente, deve-se fazer cumprir o Estatuto da Igualdade Racial – Lei nº 12.288, de 2010, que tem por objetivo garantir à população negra a igualdade de oportunidades e a defesa dos direitos étnicos e individuais, coletivos e difusos. Além de buscar combater a discriminação racial e quaisquer outras formas de intolerância étnica.

Nosso mandato acredita que só vamos conseguir combater o racismo através da educação. Portanto, essa lei deve ser levada para dentro das escolas, para que estudantes possam conhecer, entender e respeitar a nossa história. Só assim, vamos conseguir conscientizar a população e combater o racismo.

Você é uma vereadora extremamente ligada ao samba, ao carnaval e à cultura. Como vai se dar a relação do mandato com essas comunidades?

Estaremos sempre de portas abertas para debater e defender essa cultura tão importante para o nosso povo. Porque não é possível discutir esse tema sem as pessoas que o constroem. Estarei atenta para todos os ataques contra a nossa cultura.

Quais serão as outras prioridades do mandato? Que projetos você pretende apresentar nesses dois anos?

Vamos fazer um mandato democrático e a serviço dos interesses do povo. Pretendemos promover audiências públicas a fim de desenvolver políticas que atendam às demandas da sociedade. Em primeiro lugar, vamos defender o aumento do orçamento para as políticas públicas voltadas para as comunidades periféricas, que são invisibilizadas pelo poder público. Com relação à negritude, vamos estimular denúncias de toda e qualquer prática de racismo, preconceito e discriminação, além de buscar meios de fortalecer e ampliar a Promoção da Igualdade Racial. Também vamos defender a liberdade religiosa e a proteção aos locais de culto, além de ampliar a visibilidade de Terreiros.

Entre nossas propostas de trabalho na Câmara também está a valorização da educação e de seus profissionais, com ampliação de vagas, principalmente nas comunidades periféricas e o fortalecimento e valorização das creches públicas e comunitárias em período integral, assim como dos programas de alfabetização nessas comunidades, principalmente voltados para o povo negro, cujas taxas de analfabetismo, segundo dados do IBGE, são o dobro das de brancos.

Queremos conquistar a ampliação do investimento em cultura e dos espaços culturais e de lazer como praças, teatros, museus, bibliotecas com a promoção de atividades nas comunidades. E, é claro, a valorização da cultura do Samba e de outros gêneros musicais em Florianópolis. Temas como habitação, meio ambiente e mobilidade também estarão na nossa pauta. Além disso, faremos com que as mulheres tenham suas lutas e suas conquistas fortalecidas com nosso mandato, especialmente, as mulheres negras.

Tânia Ramos em seu discurso de posse, no dia 01 de fevereiro. Foto: Hermínio Nunes
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