Monark tem nova derrota na Justiça por discurso de ódio, e ganha aula sobre diferença entre nazismo e comunismo

Atualizado em 14 de abril de 2023 às 9:09
Para Monark, “quem quiser defender discurso de ódio aos judeus, pode defender” (crédito: reprodução)

O youtuber Bruno Monteiro Aiub, conhecido como Monark, sofreu nova derrota na Justiça, na tentativa de recuperar a monetização de seu canal, na plataforma YouTube, pertencente ao Google. Em contrapartida, recebeu, da desembargadora Ana Zomer, relatora do processo, uma aula gratuita sobre rudimentos de cidadania, história, ciência política e legislação brasileira.

No dia 8 de fevereiro de 2022,  ele defendeu, em um programa transmitido pelas redes sociais, que o Brasil deveria autorizar a existência de um partido nazista, que pudesse proferir discursos antissemitas.

O YouTube, então, retirou a monetização de seu canal, uma vez que as regras estabelecidas pela empresa proíbem a proliferação de discursos de ódio e intolerância. Em seguida, o youtuber foi à Justiça contra a plataforma, e perdeu em primeira instância. Inconformado, recorreu da decisão, novamente sem sucesso.

Em acórdão proferido no dia 15 de março deste ano pela turma de desembargadoras composta por Ana Zomer, Ana Maria Baldy e Maria do Carmo Honório, a relatora explicou ao youtuber por que não poderia obrigar o Google a remonetizar seu canal. Contou a Monark por que suas falas não estão cobertas pelo manto protetivo da liberdade de expressão. Tentou alertá-lo sobre a incorreção primordial contida em sua comparação entre comunismo e nazismo.

Se a compreensão do youtuber alcançar metade do que registra o acórdão, já poderá se considerar vencedor da causa, de uma maneira ou por outra.

A magistrada inicia com a enunciação do que se debate no âmbito daquele processo (os destaques foram inseridos pela reportagem):

“Cuida o caso de desmonetização da página pessoal do agravante (Monark) na plataforma You Tube depois que declarou, em participação no canal Flow Cast, mantido na mesma plataforma You Tube, que, se existe o Partido Comunista Brasileiro, deveria haver então um partido nazista, garantindo oportunidade de representação às duas ideologias.”

Em seguida, explicou a Monark que – antes de qualquer coisa – pouco importa sua opinião sobre o que deveria ou não ser permitido e proibido no Brasil. Tampouco importa a opinião da desembargadora (que, por sinal, achou a comparação “infeliz”), ou de qualquer pessoa, posto que todos estão submetidos à lei do país:

A infeliz comparação aniquila dispositivos do ordenamento jurídico que criminalizam a fabricação, a comercialização, distribuição e veiculação de símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada para fins de divulgação do nazismo.

Convém aclarar ao agravante que a criação de um partido nazista ofende frontalmente os valores acolhidos pela Constituição Federal, ao incentivar o desrespeito a um dos fundamentos República, qual seja, a dignidade da pessoa humana, princípio basilar.”

Leia mais: “Monark e Kataguiri defendem o nazismo como “liberdade de expressão”

Sobre a comparação em si entre as duas ideologias, Ana Zomer ensinou-lhe que “a criação de um partido nazista não corresponde, em absoluto, ao direito de existência do Partido Comunista Brasileiro”, e que o legislador e a Constituição “proscreveram tudo o que diga respeito ao regime nazista, nele reconhecendo o que há de mais abjeto, vil, cruel e sórdido que a humanidade testemunhou.”

O que faz com que um partido nazista seja proibido – e que não se encontra na doutrina de quaisquer dos partidos legalizados no Brasil – é o discurso de ódio racial, a pregação contra a igualdade de direitos de todos os cidadãos, o extermínio profundo da democracia, portanto.

Esclareceu a desembargadora que o comentário de Monark “vulnera e ultraja os esforços em torno da discussão e assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos no pós Guerra”, na busca por “construir consensos em torno da repulsa à tortura, ao castigo cruel e degradante, de um lado, e, de outro, o comprometimento com a vida, a igualdade, a liberdade, o respeito, incompatíveis com o regime nazista.”

Considerando que o youtuber entendera tudo até ali, Ana Zomer passou a esclarecer por que a defesa pela existência do partido nazista não pode ser protegida pelo direito a liberdade de expressão, tampouco está o YouTube obrigado a monetizar as coisas que profere Monark:

A liberdade de expressão não é direito absoluto, como não são todos os outros direitos, de forma que cumpre ao próprio youtuber observar um patamar civilizatório mínimo ao conviver e se comunicar, especialmente se a plataforma de comunicação não lhe pertence (YouTube), que, como ente contratante privado, não está obrigado apermanecer contratado com quem quer que seja.

Finalmente, após ainda explicar a Monark uma série de questões contratuais constantes em seu acordo com o Youtube que inviabilizariam o pedido com que ele pela segunda vez importunava a Justiça, a desembargadora concluiu:

“Não se pode tolerar a banalização, a normalização de manifestações racistas que subjuguem minorias de todos os tipos, cabendo rejeição e exclusão enérgicas pelas instituições democráticas e por este Poder Judiciário, a quem cumpre desestimular a desinformação e o preconceito, que atingem toda a sociedade.”

Perde o caso, mas ganha a aula: trecho de acórdão proferido em desfavor de Monark pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (crédito: TJ-SP)

Ainda cabe recurso à decisão. Se Monark achar que já está de bom tamanho, terá apenas que pagar os honorários dos advogados do Google pelo tempo que perderam com a causa. Pela aula, ficou barato.