Ele era estudante de Direito, católico e conservador, narra a historiadora e jornalista Claudia Furiati em uma biografia de mais de 800 páginas sobre Fidel Castro, publicada em 2002 após uma pesquisa exaustiva de cinco anos.
O perfil moderado dele contrastava, por exemplo, com o engajamento inflexível do argentino Che Guevara. Tudo isso é documentado em detalhes no trabalho de Claudia Furiati.
Mas uma parte dessa história está sendo relembrada agora que, desde o dia 17 de dezembro, Barack Obama resolveu reatar relações diplomáticas com o país. Uma das metas é combater o embargo econômico, fixado no dia 7 de fevereiro de 1962.
Cuba não sofreu um bloqueio por causa de sua ideologia socialista. Ela foi reprimida desta maneira pelos Estados Unidos devido ao fracasso da invasão da Baía dos Porcos, uma operação americana que visava derrubar o regime castrista.
Naquele mesmo ano de 62, Fidel buscou estreitar relações com a União Soviética. A assinatura do embargo pelo presidente John Kennedy e o posicionamento de mísseis norte-americanos na Turquia apontados para a Rússia gerou outra reviravolta no mesmo período.
Entre 14 e 28 de outubro, o mundo viveu a Crise dos Mísseis, com Cuba apontando armamento nuclear contra os Estados Unidos. O risco de guerra mundial só foi encerrado quando o líder soviético Nikita Khrushchev decidiu conversar com Kennedy. Fidel Castro chegou a ficar a postos para iniciar o conflito.
O cessar das hostilidades naquele período terminou por aproximar Fidel Castro do presidente americano John Kennedy. Entre 1962 e 1963, tanto o líder dos EUA quanto seu irmão, Robert Kennedy, fizeram várias negociações para liberação de prisioneiros dos dois países. O advogado James Donovan foi enviado para a ilha com 62 milhões de dólares em alimentos e remédios em troca da liberação dos detidos que interessavam aos americanos.
Isso aumentou a confiança de Fidel em relação aos americanos. Gravações datadas de 5 de novembro de 63 no Salão Oval de Kennedy registram diálogos entre seu assessor de segurança McGoerge Bundy para enviar o embaixador William Attwood para uma reunião em segredo com Fidel Castro. O tema da conversa era justamente retomar o diálogo.
John Kennedy também enviou o jornalista francês Jean Daniel, que o entrevistou em outubro daquele ano. Era Daniel que estava com Fidel no dia 22 de novembro de 1963, quando Kennedy foi baleado por Lee Harvey Oswald. Fidel Castro disse: “Vão dizer que nós o matamos”. Batata.
A morte de John Kennedy sepultou uma operação diplomática que poderia ter acabado com o embargo cubano em 1963, pouco mais de um ano depois do seu início. Os motivos para o afrouxamento do presidente americano foram justamente a diplomacia dos soviéticos, que evitaram uma guerra nuclear, e a abertura ao diálogo que estava sendo promovida pelo ditador Fidel Castro.
O assassinato do presidente norte-americano alimentou o sentimento anticomunista no país, enquanto Fidel endureceu seu discurso anti-imperialista. A intolerância formou o bloqueio econômico entre Estados Unidos e Cuba.
A aproximação neste ano se deu após a liberação de prisioneiros. Barack Obama tem vários interesses na jogada. O presidente americano, por exemplo, enfrenta uma grande crise com a Rússia de Vladimir Putin atacando a Ucrânia, o que aumenta as pressões da União Europeia por uma operação no local.
Obama respondeu aos russos com sanções econômicas, repetindo uma fórmula do passado. Os juros da Rússia subiram 6,5% entre os dias 14 e 15 de dezembro deste ano, chegando ao patamar total de 17%. A moeda russa, o rublo, despencou cerca de 20% frente ao dólar e hoje vale 65,15 para cada cédula norte-americana.
Certamente uma aproximação com Cuba feita pelos Estados Unidos pressiona a forma como a Rússia trata a Ucrânia. Tropas russas invadiram a região da Criméia e, com pressões diplomáticas, terão que se retirar.
Fidel Castro e John Kennedy poderiam ser aliados econômicos desde 1963, há mais de 50 anos. A politização das diferenças, decorrentes do assassinato de Kennedy e do acirramento da Guerra Fria, sepultaram as esperanças de uma relação mais amigável, que volta a ser discutida agora.