O papel dos Estados Unidos em tragédias como a do Charlie Hebdo

Atualizado em 10 de janeiro de 2015 às 9:28
Tudo podia ser diferente
Tudo podia ser diferente

Você lê na mídia ocidental que os terroristas islâmicos que massacraram a turma do Charlie Hebdo foram “radicalizados” por este ou aquele clérigo muçulmano fanático.

Esta é a melhor maneira de não enxergar o real problema.

Nada leva tanto ao terror jovens muçulmanos ao redor do mundo quanto a política de destruição contra o mundo árabe comandada pelos Estados Unidos e seguida cegamente pelos seus aliados europeus, como Reino Unido, Alemanha e França.

Uma coisa e apenas uma move os americanos e seguidores em sua predação: o petróleo.

Há, ou houve, o argumento hipócrita de que o que se deseja é levar a “democracia” aos países árabes.

Democracia uma ova, para usar a expressão de Luciana Genro. O objetivo é o petróleo, o petróleo e ainda o petróleo. A qualquer preço.

A pilhação ocidental é antiga.

Estados Unidos e Inglaterra se uniram, no começo da década de 1950, para derrubar um líder iraniano, Mossadegh, que ousara desejar uma partilha mais justa do petróleo do Irã.

Os historiadores registraram a fala de um ministro inglês para justificar a sabotagem contra Mossadegh: não seria possível proporcionar aos ingleses o mesmo nível de vida com uma divisão diferente dos lucros derivados do petróleo iraniano.

Este foi o padrão de conduta ocidental no Oriente Médio desde então.

Mais recentemente, outra vez Estados Unidos e Inglaterra se aliaram numa operação macabra: a Guerra do Iraque.

Sabe-se hoje que os argumentos utilizados por Bush e Blair para justificar a guerra foram falsos. O Iraque não tinha armas de destruição em massa, ao contrário do que afirmaram Bush e Blair, dois verdadeiros criminosos de guerra.

O Iraque foi simplesmente destruído: crianças, mulheres, velhos, nada e ninguém foi poupado.

As bombas ocidentais não escolhem alvos.

É infalível: onde os ocidentais se metem com seus propósitos “civilizatórios”, as coisas pioram para os nativos.

A vida na Líbia sob Gadaffi era muito melhor do que é hoje, e os iraquianos sob Saddam viviam num paraíso comparado ao inferno que enfrentam hoje.

Imaginava-se que, com Obama, as coisas melhorariam.

Nada. Obama aumentou o uso de drones (aviões não tripulados, controlados à distância) para bombardear países do Oriente Médio.

A justificativa era matar extremistas, mas os drones têm ceifado rotineiramente milhares de vidas inocentes.

Essa chacina cotidiana não é notícia no Ocidente. É como se os mortos árabes não importassem, gente de uma subespécie não comparável aos guardiões da civilização ocidental.

Mas você pode avaliar o ódio e a vontade de vingança que vão se acumulando nas pessoas que, lá longe, testemunham as atrocidades.

É uma corrente de raiva que acaba tocando também jovens muçulmanos que vivem em países ocidentais.

É dentro desse quadro explosivo que surgem tragédias como a do Charlie Hebdo ou, mais para trás, da Maratona de Boston.

Ou, ainda mais para trás, a do 11 de Setembro.

Enquanto o Ocidente pilhar e destruir os países árabes, o terreno para a radicalização de jovens muçulmanos estará sempre fértil.

Há uma fórmula certeira para acabar com a fábrica de extremistas: os americanos e aliados darem o fora dos países árabes.

Mas quem quer falar disso?