A sub-secretária-geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e assessora especial para Prevenção do Genocídio, Alice Wairimu Nderitu, disse que a Justiça no Brasil tem a responsabilidade de investigar e punir os responsáveis pelos crimes cometidos contra indígenas e negros, nos últimos anos e durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL).
A declaração ocorreu em entrevista ao UOL. Ela esteve no Brasil no início de maio e destacou que existem fatores de risco para o genocídio no Brasil e que os ataques contra indígenas e negros se aceleraram sob o governo do ex-presidente.
Apesar de reconhecer que as violações aumentaram nos últimos anos, a representante da ONU insistiu que os problemas são estruturais e que o racismo está “enraizado” na sociedade brasileira.
“Os problemas vem de antes dele. O discurso de ódio contra indígenas e afrobrasileiros vem de longe. Qualquer tentativa de lidar com isso deve ser considerado na perspectiva correta. Entretanto, algumas das politicas implementadas nos últimos cinco anos pioraram a situação dos povos sob risco, inclusive indígenas”, disse.
Nderitu esteve nos territórios do povo yanomami, em terras indígenas em Mato Grosso do Sul e na comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro.
Durante a visita, ela foi até a Casa de Apoio à Saúde Indígena Yanomami (Casai), na zona Rural de Boa Vista, em Roraima, e ouviu relatos de lideranças indígenas e das equipes de saúde que atuam na unidade.
Alice Nderitu também se reuniu com a diretoria da Urihi Associação Yanomami e a Hutukara Yanomami, a mais representativa organização deste povo.
Ao UOL, ela afirmou que invasão da Terra Yanomami por garimpeiros tem resultado em mortes, inclusive em assassinatos de seus lideres, e defensores de direitos humanos e ambientalistas.
“Há um aumento de malária e desnutrição. Também fui informada de violência sexual contra mulheres e meninas, além de outras formas de violência de gênero. Mas a chave para falar do povo yanomami é que sua vida depende da floresta onde vivem. Dos rios e da biodiversidade. Isso é chave para suas vidas”, declarou.
“Portanto, a destruição da floresta para fins de mineração impôs condições contra essa população, que pode ser um ataque contra o povo yanomami”, acrescentou.
A representante explicou ainda que sua função é a de alertar sobre a existência ou não de fatores de risco e não para determinar se uma política específica deve ser classificada como crime de genocídio.
“Eu não qualifico situações. Eu não tenho mandato para caracterizar a natureza de um crime. Só uma corte nacional ou internacional podem fazer isso. Primeiro, o Brasil tem responsabilidade de investigar os crimes que ocorreram no Brasil e tomar o primeiro passo”, afirmou.