Diálogos entre procuradores da finada “lava jato” aos quais a revista eletrônica Consultor Jurídico teve acesso mostram que eles ficaram revoltados com uma ação da Procuradoria-Geral da República contra a tentativa de integrantes da autodenominada força-tarefa de criar uma fundação privada bilionária de “combate à corrupção” com fundos da Petrobras.
Na conversa, de 12 de março de 2019, os procuradores reagem a uma ADPF da então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, contra a fundação. A ação sepultaria os planos da “lava jato”. Em um dos diálogos, uma procuradora sugeriu, como reação à ação da PGR, devolver aos Estados Unidos todo o valor recuperado da Petrobras, desfazendo um acordo firmado com o Departamento de Justiça dos EUA.
“RD (Raquel Dodge) passou dos limites com essa ADPF. Desfaçam esse acordo, devolvam o $ pro americanos. […] A PGR e os intelectuais desse país acham que não precisamos desse $ aqui”, disse a procuradora, identificada apenas como “Carol PGR” — os diálogos reproduzidos nesta reportagem aparecem em sua versão original.
“Agora a solução tem de ser de fácil comunicação. Eh devolver os recursos pro americanos, reais donos deles”, prosseguiu ela. O então coordenador da “lava jato” de Curitiba, Deltan Dallagnol, respondeu: “Valeu Kérol, mas não podemos fazer isso, embora desse vontade às vezes rs. Vamos trabalhar numa solução”.
Em seguida, Carol PGR falou que iria “rezar” para “Deus iluminar” os procuradores de Curitiba. “Estou tão indignada que não sei se vou conseguir dormir”, concluiu.
O diálogo é do dia em que a PGR entrou com a ação no Supremo Tribunal Federal contra o fundo. E a ADPF trouxe resultados: o ministro Alexandre de Moraes suspendeu o acordo firmado com a Petrobras que viabilizaria a fundação.
O acordo envolvia U$ 853 milhões, dos quais U$ 682,5 milhões seriam pagos a “autoridades brasileiras”. Alexandre determinou o bloqueio dos valores depositados na conta da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Clima ‘péssimo’ com o Itamaraty
Outra conversa entre os mesmos personagens mostra que havia preocupação quanto a possíveis críticas à “lava jato” por causa de acordos com os Estados Unidos que poderiam prejudicar empresas brasileiras.
“O clima com o itamarati está péssimo. A história Eh q vc chamou os americanos e eles estão aí ouvindo pessoas e juntando provas p ferrar a BR (Distribuidora, então subsidiária da Petrobras).To com receio deles plantarem isso na imprensa. Temos q fazer um trabalho com os jornalistas p esclarecer o q realmente está acontecendo. Se houve convite nosso, se eles estão colhendo provas etc”, disse Carol PGR a Dallagnol. A mensagem é de 8 de outubro de 2015.
Em outra mensagem, de 7 de outubro do mesmo ano, a procuradora se disse preocupada com a “repercussão na imprensa” da colaboração entre autoridades do Brasil e dos EUA.
“Deltan, Miller me mandou uma mensagem preocupada com a repercussão na imprensa da vinda dos americanos. (…) Vlad me falou de uma multa que foi ou será aplicada à empresa. Acho que quando isso vier a tona pode gerar alguns problemas internos. Podem dizer que estamos ajudando os americanos a ferrarem com a Petrobras. Sei que eles não precisam de nós pra nada, mas se nós pudermos esclarecer em que consiste nossa ajuda a eles, acho que seria importante.”
“Ok. Falei com Vlad. Faremos nota (Vc e ele e depois eu). Não há perspectiva logo de multa”, respondeu Dallagnol.
Originalmente publicado em Conjur
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