Sergio Moro apresentou duas sugestões nessa semana à mesa da CPI do Golpe. Com a testa franzida, bem menos descontraído do que no tempo em que chefiava Deltan Dallagnol em Curitiba, tentou falar com a entonação de magistrado.
Ao apresentar a primeira sugestão, referindo-se à própria CPI, disse que “existe um jogo político envolvido” e recomendou deixar as oitivas das “figuras mais importantes” para o final dos trabalhos.
Que antes a CPI ouça os desimportantes, “as pessoas que circunvizinhavam” as importantes, porque é assim, como ensinou, que se faz no Judiciário.
A segunda sugestão foi para que documentos coletados pela CPI sejam arquivados em nuvem, para que os membros da comissão possam consultá-los eletronicamente.
E ressalvou: “Com as cautelas necessárias de resguardo do sigilo, para abandonarmos a prática de uma sala secreta”.
Moro fez as propostas em nome da transparência (ele usou a palavra). E assim teve sua primeira e assertiva intervenção na CPI.
É estranho ver o ex-juiz dando conselhos sobre a ordem dos interrogatórios, como fazia em combinação com Dallagnol na Lava-Jato, e falando de jogo político numa casa em que tudo é política.
Moro quer ouvir primeiro os interrogados desimportantes, para depois chegar aos que interessam. Foi assim que ele cercou Lula.
Foi assim agora que, por outras motivações, tentou livrar os generais de Bolsonaro, os importantes Braga Netto e Augusto Heleno, dos primeiros interrogatórios.
Moro também quer documentos em nuvem, para que o acesso seja facilitado, desde que com as cautelas necessárias do sigilo.
Cautela não é virtude que possa ser apresentada como exemplo do chefe do lavajatismo. Muito menos sigilo e muito menos ainda transparência.
Moro foi denunciado por corromper criminosamente sigilos de Dilma Rousseff, de Lula, dos advogados de Lula, de réus presos.
Nunca foi cauteloso na condução de procedimentos em Curitiba e nunca agiu com transparência em relação a atos que deveriam ser explicitados e justificados.
Sergio Moro não é exemplo de conduta sobre nada do que sugeriu com tanta ênfase à CPI.
Por acaso, na mesma terça-feira em que o senador fazia as sugestões, o Supremo determinava que as provas da Vazajato devem ser preservadas.
Num dia de 2019, o ministro João Otávio de Noronha, do STJ, ouviu de Moro, em telefonema, que parte das gravações seriam destruídas.
Depois, o ex-juiz disse que havia sido mal interpretado. O STF acabou agora com a conversa.
Esse é o suplente da CPI, que fará intervenções pelas bordas, como faziam os emissários suplentes ou agregados de Bolsonaro na CPI da Covid.
É um ex-juiz, ex-ministro, ex-consultor de empresa, ex-quase candidato a presidente, ex-aliado de Bolsonaro, ex-inimigo de Bolsonaro e daqui a pouco, se o TRE do Paraná não poupá-lo e se não escapar depois do TSE, um ex-senador.
Dallagnol já se foi. Moro também é candidato a ser levado pelas nuvens da política.
Publicado originalmente no Blog do Moisés Mendes