Vago ao acaso pela internet na manhã desta segunda e topo com dois artigos que, diferentes em vários pontos, são iguais no desalento, na neurastenia e no pessimismo.
Um é de Mino Carta e o outro de Vinicius Mota, secretário de redação da Folha.
O de Mino diz no subtítulo: “O Brasil vive um momento sombrio de extrema gravidade e Dilma tem de agir depressa para evitar o pior.” Mino pergunta: “Ainda dá tempo?”
O título do de Mota dá um passo além. “Rumo ao abismo.”
Penso um pouco e chego à seguinte conclusão: os dois andam lendo demais jornais e revistas. Podem também estar vendo e ouvindo mais do que deviam Globo, Globonews, CBN, Jovem Pan etc.
Pela mídia, o Brasil parece um país em que os cidadãos fazem fila para se suicidar à beira de viadutos.
A predominância de más notícias é impressionante.
Dou um pulo, ao acaso, no G1. Na primeira página, você encontra:
- Ao vivo, a marcha do dólar (para cima) e da Bolsa (para baixo);
- Inadimplência recorde em recolhimento de seguros de moto;
- 8277 pessoas mortas em acidentes nas rodovias federais em 2014;
- Mulher morta em tiroteio entre PM e ladrões em SP;
- Ação da PM que deixou um morto no Rio;
- Lixo, drogas, briga, sexo e pancadão na Vila Madalena;
- Carreta que tomba e esmaga dois carros em SC;
- Vídeo de carros arratados por enchente;
- Vídeo em que o namorado bate no cachorro de uma mulher;
- Áudio em que presos no RS ordenam assassinatos.
A lista vai adiante.
Se o G1 fosse uma pessoa, você poderia classificá-lo como doentiamente mórbido. Quando até inadimplência de motos é primeira página, é porque o quadro é de extrema gravidade.
Mas o G1 é apenas um produtor de conteúdo entre tantos, em todas as mídias, que sofrem do mesmo mal – um desequilíbrio patológico.
O Brasil que eles refletem é um pesadelo irremediável.
Mesmo um mero locutor esportivo está tomado por essa doença. Outro dia, ao transmitir um jogo de tênis, Osvaldo Maraucci, da ESPN, disse que os brasileiros desistiram do Brasil. Garantiu aos ouvintes que Miami tem um número recorde de brasileiros.
Onde se baseia tanto negativismo?
Nas pessoas é que não é.
O mesmo Datafolha do fim de semana que trouxe queda da aprovação de Dilma – saudada com rojões pela imprensa – mostrou algo que ninguém explorou.
59% dos brasileiros consideram o Brasil um país “ótimo ou bom” para viver. Outros 28% optaram pelo adjetivo “regular”.
Apenas 13% disseram que somos um país “ruim ou péssimo”.
Perguntados sobre se sentiam vergonha ou orgulho de serem brasileiros, os entrevistados orgulhosos superaram amplamente os envergonhados.
74% optaram por orgulho contra apenas 24% de envergonhados.
É como se houvesse dois Brasis. O da mídia e o de verdade.
Para quem consome muita imprensa, são dados surpreendentes.
Mas não para quem vive a vida como ela é no Brasil. Pesquisas que aferem o grau de felicidade das pessoas nos países colocam sempre o Brasil em boa posição.
Agora mesmo: forma-se na mídia um consenso de uma crise generalizada. “Temo havermos perdido o rumo da história”, escreveu FHC num artigo.
Os dados objetivos sustentam isso? O desemprego é um dos mais baixos do mundo. Milhões de pessoas deixaram a pobreza nos últimos anos. Jovens pobres frequentam como nunca as universidades.
A economia, é certo, vive um momento complicado – mas o mundo todo está na mesma situação. Estados Unidos? Sim. Alemanha? Sim. Reino Unido? Sim. Japão? Sim.
Até a China dos 14% de crescimento anual ficou lá para trás.
Não somos patinhos feios num universo de gansos lindos e prósperos. O PIB brasileiro talvez tenha crescimento zero em 2015, mas, neste soluço, estaremos na companhia das maiores economias do mundo.
E teremos um relativo conforto diante de outro emergente, a Rússia, que prevê queda de 5% no PIB neste ano.
Logo, não há razões concretas para a depressão patológica da imprensa.
O brasileiro é feliz. A mídia é torturada. O problema não está, naturalmente, no brasileiro – mas na mídia, que em sua formidável miopia enxerga o mundo como uma miserável extensão de si mesma.