O DCM publicou uma matéria do Guardian sobre o pedido de demissão do colunista de política do Telegraph. Peter Oborne havia escrito uma carta no openDemocracy, site que existe desde 2001 e que se define como “independente, de interesse público e uma contrapartida à mídia corporativa”, contando por que jogou a toalha.
Segundo ele, a cobertura do escândalo do HSBC pelo principal jornal conservador inglês foi vergonhosa. “Se as prioridades da publicidade podem determinar as decisões editoriais, como os leitores continuariam a confiar no que lêem? As reportagens sobre o HSBC são uma forma de fraude”, escreveu.
A repercussão do artigo de Oborne ainda está sendo enorme. É uma discussão que, obviamente, diz respeito ao Brasil. A redatora-chefe do openDemocracy, Mary Fitzgerald, levantou uma questão: se o modelo de negócios dos jornais implica que reportagens sejam suprimidas, o mundo está em sérios apuros.
A histeria em torno das ameaças à “liberdade de imprensa” esconde o fato de que, eventualmente, a imprensa não é livre. O que ela sugere para combater a sonegação de informação? Regulação da mídia. “E se isso der aos leitores mais dados, escolhas e poder?”, pergunta Mary.
Abaixo, alguns trechos de seu artigo:
O openDemocracy foi o primeiro a dar a notícia de que Peter Oborne, o influente colunista político do jornal britânico Daily Telegraph, pediu demissão. Ele o fez com tristeza e deu suas razões aqui. Oborne acredita que o principal jornal conservador do Reino Unido tem ignorado ou subestimado matérias prejudiciais ao HSBC, e que está deixando as prioridades da publicidade moldarem algumas de suas decisões editoriais.
Estas alegações não poderiam ser mais graves, vindas na esteira das revelações da semana passada descobertos por um Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, juntamente com o Guardian, Le Monde e CBS 60 Minutes, de que o HSBC usado seu braço suíço para ajudar centenas de clientes ricos a sonegar impostos em uma escala imensa, um escândalo que agora está tendo repercussões em todo o mundo.
A história é explosiva, mas familiar. A lista de indivíduos ricos e poderosos — incluindo os principais doadores do Partido Conservador da Grã-Bretanha — foi ignorada durante anos pela Receita, órgão que supostamente deveria investigar a evasão fiscal.
Quando a história finalmente vem à luz, há promessas precipitadas do banco de que lições foram aprendidas, e promessas de que conservadores e trabalhistas serão duros. Enquanto isso, ninguém fica mais perto de compreender como este abuso do sistema foi ignorado por tanto tempo, nem como será impedido de acontecer novamente.
Agora, com a demissão pública de Peter Oborne, vislumbramos respostas parciais a algumas dessas perguntas. Como demorou tantos anos para o escândalo no departamento suíço do HSBC ser revelado? Bem, quando os executivos de pelo menos um grande jornal acreditam que o HSBC é “o anunciante você literalmente não pode se dar ao luxo de ofender”, é de se surpreender que a cobertura negativa do banco não esteja nas manchetes? (É sintomático que o Guardian, de propriedade do fundo Scott Trust, tenha sido o único jornal do Reino Unido a dar o furo do HSBC.) Como evitar que isso aconteça novamente? Por onde começar?
A primeira triste realidade que temos de enfrentar é que não foi a primeira vez em que isso aconteceu no Telegraph ou em outras publicações. A auto-censura está confinada a revelações sobre sonegação fiscal ou sobre o comportamento dos bancos.
Em dezembro, o openDemocracy publicou uma coluna de Oborne, recusada pelo Telegraph, em que ele perguntava por que o HSBC tinha fechado as contas bancárias de muçulmanos proeminentes. Alguns deles estavam envolvidos nos esforços de socorro para Gaza, e a trilha parecia levar de volta à pressão de autoridades dos Estados Unidos.
Depois de publicada, a matéria foi repercutida na BBC e no Guardian. Se o “modelo de negócios” dos jornais implica que reportagens como essa sejam suprimidas, o mundo está em sérios apuros.
Liberdade de imprensa
Muitos daqueles que são contra a regulação da mídia argumentam que isso iria limitar a liberdade de imprensa. Houve uma lapso coletivo no sentido de imaginar o contrário: e se for uma oportunidade para libertar a imprensa?
E se “mais regulação” significar limites de propriedade de mídia mais rígidos, reduzindo o poder de barões como Rupert Murdoch para definir a agenda de notícias em centenas de lugares de todo o mundo?
E se isso significar que os jornais tenham de disponibilizar uma lista pública de todas os suas principais contas de publicidade?
E se isso der aos leitores mais informação, escolhas e poder?
Para que a democracia funcione, a mídia tem de cobrar a conta dos poderosos. No OpenDemocracy, não se coíbe este trabalho. É claro que não estamos sozinhos nisso. Mas por sermos uma entidade sem fins lucrativos, as corporações não falam uma palavra sobre como fazemos operamos.