Publicado originalmente no site do autor
POR ALBERTO CARLOS ALMEIDA, cientista político
A dificuldade em se fazer um impeachment de Bolsonaro tem a ver com o tamanho de sua base de apoio. Se ele não ficar com 15% de ótimo/bom e 60% de ruim/péssimo é inviável o impeachment.
Os que apoiam Bolsonaro não são a favor de um elevado número de mortes pelo coronavírus. É um erro pensar assim. Esse grupo seria muito pequeno e teria vergonha de ir à público defender esta visão. Trata-se de um fenômeno mais amplo, sutil e profundo. O discurso de Bolsonaro mobiliza o fatalismo do brasileiro e, como consequência, a mentalidade mágica de alguma maneira presente na maioria das pessoas.
Em uma população de 210 milhões de habitantes, a ocorrência de, por exemplo, 20 mil mortes pelo coronavírus não chegará perto da grande maioria da população. Bolsonaro se utiliza justamente deste aspecto da mortalidade do vírus para desdenhar do problema. Todas as pessoas razoáveis sabem que isto é uma insanidade, um crime. Porém, como as mortes não chegam nos parentes e vizinhos da grande maioria, o discurso do presidente encontra aceitação, e ele é desonesto o suficiente para saber disso e tirar proveito deste fato.
Ademais, é muito grande o contingente de brasileiros que acredita no destino. Esta forma de ver o mundo assegura que aqueles que morrerem por causa da pandemia terão esse destino porque Deus quis, porque havia chegada a hora da morte. Por outro lado, aqueles que não adoecerem, ou que adoecerem e escaparem também terão sido objeto dos desígnios divinos. Tais pessoas poderão até mesmo admitir que se trata de um teste da fé em Deus, quanto mais forte e profunda a fé, menores as chances de que haja infecção, doença e morte. Neste sentido, para pessoas que pensam assim, o coronavírus poderá até mesmo ser uma benção, pois não poupará principalmente as pessoas de pouca fé.
Some-se a tudo isso o fato de que a perda de bem-estar material, diferentemente da quantidade de mortos, afeta a todos. É justamente por isso que Bolsonaro se utiliza do discurso de “a economia não pode parar”.
Imagine então alguém que tenha votado em Bolsonaro em 2018, que acredite no destino, tenha um pequeno negócio ou mesmo seja um trabalhador informal e não veja ninguém de seu convívio mais próximo infectado pelo coronavírus. Essa pessoa é um potencial apoiador de Bolsonaro durante a crise. Existem milhões de brasileiros nesta condição. São eles que dificultam e impedem o impeachment do presidente. Para que elas deixem de apoiar Bolsonaro mais coisas negativas precisam ocorrer e serem atribuídas a ele, como a piora da situação econômica de suas famílias.
Vale lembrar que Bolsonaro foi eleito em 2018 e que seu governo ainda não completou 18 meses. O tempo é um dos senhores do desgaste.