A caminhada da insensatez. Por Moisés Mendes

Atualizado em 9 de agosto de 2019 às 20:25
Jair Bolsonaro. Foto: Evaristo Sá/AFP

Publicado originalmente no blog do autor

POR MOISÉS MENDES

O presidente caminhou nu mais uma vez hoje à tarde e andou do palácio até a Esplanada dos Ministérios. Mas não estava sozinho. Cinco ministros o acompanhavam. Um deles, ainda tímido, usava tapa-sexo com tecido floral. Outro estava enrolado em uma bandeira dos Estados Unidos.

O presidente acenava para as pessoas, que respondiam com naturalidade. Poucos reagiam com críticas à caminhada. Uma senhora disse: chegaram ao limite da imoralidade, daqui não passarão.

A prática de sair nu pelas ruas de Brasília (o porta-voz chama de prática) é uma evolução do que vem acontecendo há duas semanas no governo.

Todos os ministros trabalham nus ou enrolados em folhas de bananeira. Mas é a primeira vez que os ministros saem juntos para a rua sem roupas e acompanhados por guarda-costas e um pastor alemão.

Na primeira saída do presidente, como caminhada experimental, ao passar diante do Congresso, uma criança ergueu a mão e apontou em direção ao grupo. Mas quando ia dizer algo, a mãe a puxou pelo braço e saiu apressada.

Um idoso gritou ”ele está…”, mas não chegou a completar a frase. Dois policiais militares saltaram no pescoço do homem, que foi enfiado num camburão. A liberdade de expressão tem limites, disse um capitão.

As caminhadas têm repercutido na imprensa internacional. A revista The Economist, a bíblia do liberalismo (sempre que se fala da Economist, é preciso dizer que é a bíblia do liberalismo), informou que o mercado vê com bons olhos a nudez do presidente.

Ainda precisamos entender melhor o significado dessas caminhadas, informou o The New York Times. Os juristas se dividem sobre a legalidade da nudez. Um presidente que diz que estupra apenas mulheres bonitas pode, se quiser, sair nu pela rua, disse um especialista em atos obscenos.

As caminhadas do presidente nu (apenas com chinelos Rider) estão consagradas e serão mantidas, disse o porta-voz do palácio, enfatizando que mães e pais devem apenas manter as crianças afastadas. É uma questão de bom senso, disse o porta-voz.

Na caminhada de hoje, algumas pessoas que passavam imitaram o cortejo e também tiraram as roupas. Vamos radicalizar, disse uma mulher, enquanto era puxada pelo marido, que não gostou da ideia.

Nesse segundo mandato, o presidente usa seu corpo nu como expressão de entrega, transparência e desvendamento, segundo a ministra da família.

As pesquisas dizem que 32% dos eleitores aprovam a atitude, 45% reprovam e o resto não sabe de nada nem quer saber.

No momento em que caminhava, o presidente ficou sabendo de mais um vazamento de mensagens da Lava-Jato sobre palestras pagas do procurador Deltan Dallagnol, desta vez remuneradas com bitcoins. O ministro Dallagnol tem a minha confiança, disse o presidente, sem parar de andar.

Dos ministros nus, o mais aplaudido foi Fabricio Queiroz, das Relações Institucionais. O presidente só se queixou do vento nas costas no caminho de volta para o palácio.