Publicado originalmente no Jornalistas pela Democracia
Por Luis Costa Pinto
Seis políticos tiveram a ideia de criar um grupo de whatsapp para, por meio dele, tentarem se posicionar na trágica cena brasileira. Cada um chamou o assessor mais próximo – seja de imprensa, seja de assuntos gerais – e se danou a refletir sobre o que fazer com a ideia de um grupo de whatsapp que os uniria.
Liminarmente, decidiram excluir cinco protagonistas que podiam lhes fazer sombra – e que lhes assombra. Assim, excluíram possibilidades de diálogo com Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ex-presidente; com Marina Silva (Rede), a ex-ministra do Meio Ambiente e ex-senadora; com Guilherme Boulos (PSol), o ativista e líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto; com Flávio Dino (PCdoB), governador do Maranhão e liderança evidente entre os articulados governadores do Nordeste; com Fernando Haddad (PT), ex-ministro da Educação, ex-prefeito de São Paulo, candidato que obteve 54,5 milhões de votos para presidente da República em 2018.
Daí, condoídos com o autoexílio ao qual se impôs o ex-juiz Sérgio Moro desde quando foi defenestrado do governo que ajudou ilegitimamente e fraudulentamente a eleger, acionaram-no nos Estados Unidos. Queriam a participação dele. Moro pediu escusas, mas disse que não podia juntar-se ao grupo no parquinho virtual, pois isso poderia pegar mal para seu empregador – a empresa de gestão de ativos podres e recuperações judiciais Álvares & Marsal. Escaldado com a participação no grupo de Telegram da “República de Curitiba” administrada pelo amigo Deltan Dallagnol quando o Estado brasileiro era seu empregador e ele conspurcou o juramento de imparcialidade dos juízes, preferiu dar um perdido na turma embora a tentação fosse apor seu jamegão no texto que estava sendo preparado pela assessoria dos seis pretendentes a atores centrais na cena brasileira.
Ciro Gomes, João Doria, Eduardo Leite, João Amoedo, Luciano Huck e Luiz Henrique Mandetta fecharam nas coxas a minuta que lhes foi passada pela assessoria certificando-se de que não havia o nome “Jair Bolsonaro” no corpo do que passaram a chamar de “Manifesto Pela Consciência Democrática”. Depois, modificaram o último parágrafo e mandaram ver na caixa alta – ou seja, nas palavras com todas as letras escritas de forma maiúscula como se gritassem para o leitor: “Homens e mulheres desse país que apreciam a LIBERDADE, sejam civis ou militares, independentemente de filiação partidária, cor, religião, gênero e origem, devem estar unidos pela defesa da CONSCIÊNCIA DEMOCRÁTICA. Vamos defender o Brasil.”
Seis assinaturas, cinco ausências e nenhuma proposta concreta de unir o País em torno de algo. Podiam ter proposto, por exemplo, ação conjunta pelo impeachment imediato de Bolsonaro. Mas, o Novo de Amoedo é contra; o PSDB de Doria e Leite tem no ex-presidente Fernando Henrique Cardoso uma espécie de “reserva moral” (deles, claro) e FHC já disse que não é o caso de impeachment; o DEM de Mandetta segue como híbrido estado dentro e fora do Governo Bolsonaro ao mesmo tempo, Ciro Gomes, do PDT, quando pôde fazer algo efetivo e eficaz para interromper o processo golpista que nos trouxe até aqui pegou um avião e foi para Paris chorar mágoas e pitangas porque menos de 12% dos brasileiros o queriam Presidente da República; e Huck, uma lástima: perdeu o bonde da História que se dirigia a ele em 2018, contendo um cavalo selado na 1ª Classe, e se acovardou na hora de assumir a candidatura. O segundo turno teria sido entre ele e o candidato do PT – Haddad ou Lula.
A “Frente Ampla de Whatsapp” liderada pelo cearense Ciro Gomes tem a estreiteza da ação política do ex-governador e ex-ministro. Posto ser considerado intragável por empresários e executivos engalados da Avenida Faria Lima por seus métodos toscos de tratar as pessoas e impor seus pontos de vista, aceitaria fazer um roque na chapa que tem em mente? Por exemplo, pondo o gaúcho Eduardo Leite na cabeça e colocando-se como vice? Ou Doria? Falo dos dois neo-queridinhos do mercado financeiro, mas poderia especular com Luciano Huck: do fundo de sua consciência democrática, Ciro toparia ceder a Luciano Huck a cabeça de chapa, abraçando uma candidatura a vice que seria honrosa e valorosa caso vençam? Ou a estreita “Frente Ampla” foi desenhada por arquitetos que comungam com hóstias de tapioca fornecidas pelo “Senhor de Sobral”?
Não se poderá levar a sério a amplitude e a ousadia de uma iniciativa política que cometeu a pachorra de anular todo um lado do espectro político tendo suas lideranças assumido autoritariamente a condição de tradutores dos anseios populares.
Uma Frente Ampla pelo impeachment, pela derrubada imediata de Jair Bolsonaro, pela devolução do Brasil aos princípios basilares das sociedades civis democráticas e regidas pelo Estado de Direito não só é bem-vinda como é urgente. Tal frente, porém, tem de ser ampla de fato – como foi a das Diretas, Já. Com ela, derrotamos a ditadura militar. Depois, a convertemos em frente de apoio à candidatura de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. Só assim se permitiu que o Brasil vivesse um hiato de prosperidade e reconstrução democrática até que tudo começasse a ruir quando cinco d’Os Seis do Whatsapp foram às ruas para açular os militares e infernizar a população a fim de sacramentarem o golpe de 2016 e iniciar o roteiro que levou Bolsonaro ao Palácio do Planalto.
Frente Ampla pressupõe menos vaidades e mais ousadias que todo o comportamento adotado até aqui pelos signatários do “Manifesto Pela Consciência Democrática”. Um imediato pedido de desculpas aos cinco protagonistas medrosamente trancados nos camarins do show que ora se desenrola deve ser o ponto de partida para que, juntos, todos os democratas reescrevam o fim dessa tragédia brasileira.