A Folha acha que só agora Jeff Bezos terá influência

Atualizado em 7 de agosto de 2013 às 18:31

Um artigo de Sérgio Dávila sobre a compra do Washington Post pelo dono da Amazon mostra como o jornal paulista supervaloriza o papel da mídia impressa no mundo atual.

Jeff Bezos Washington Post
Ele gastou 1% da fortuna que fez com a Amazon para comprar o Post

O iceberg comprou o Titanic. Assim o site Saloon definiu a compra do jornal Washington Post, por US$ 250 milhões, pelo bilionário Jeff Bezos, o dono da Amazon. O paralelo é óbvio: a mesma internet que possibilitou a Bezos fazer uma fortuna de US$ 25 bilhões foi também a responsável pela morte da mídia impressa. Quem vai querer comprar o Washignton Post de manhã se todas as notícias do jornal saíram no dia anterior no Huffington Post de graça, com vídeos e links para textos relacionados?

O iceberg comprou o Titanic, mas o objetivo é dominar o mar. Eis como a Folha, à sua maneira, vê a notícia. O artigo do editor-executivo do jornal Sérgio Dávila, publicado hoje, mostra como a Folha insiste em supervalorizar o papel da mídia impressa no mundo atual, numa tentativa desesperada de se autoafirmar para seus jornalistas e leitores. “Com US$ 250 milhões e o Washington Post”, escreve Dávila, “o empresário passa a influenciar o país.”

Para a Folha, em outras palavras, enquanto Bezos era apenas dono da Amazon (avaliada em US$ 32 bilhões, emprega 97 mil pessoas, teve uma receita de US$ 61 bilhões no ano passado e revolucionou o comércio nos EUA) ele não tinha influência. Mas agora que comprou o Washington Post (que teve US$ 54 milhões de prejuízo em 2012, perde milhares de leitores todos os anos e foi comprado por 0,7% do que vale a Amazon) terá.

Só mesmo o editor de outro jornal para acreditar nisso. A circulação diária do Washington Post caiu, de 2005 para cá, de 706 mil exemplares para 472 mil. Numa conta aproximada, o jornal perdeu 1 em cada 3 leitores. E esse ritmo de queda deve se intensificar, uma vez que a verba publicitária é cada vez menor na mídia impressa e maior na internet, algo que invariavelmente resulta no melhora do jornalismo online – e na piora do impresso.

Eis o que Dávila diz para defender o seu ponto: “Para ficar apenas num exemplo, os livros escritos pelo jornalista principal do Post, o repórter Bob Woodward, 70, são considerados o registro não oficial mais relevante dos governos de sucessivos ocupantes da Casa Branca, começando por Richard Nixon (1913-1994), que ele ajudou a derrubar em 1974 ao revelar com Carl Bernstein o escândalo Watergate. Barack Obama pode comprar os livros de Woodward pela Amazon, mas é no Post que ele lerá primeiro os trechos inéditos de suas obras.”

Se Obama fosse presidente dos EUA na década de 1970, talvez Dávila estivesse certo. Acontece que vivemos em 2013 e seu exemplo está com 40 anos de atraso. Se o Watergate acontecesse hoje, não seria no Washigton Post que as pessoas leriam sobre ele – e, sim, em sites independentes como o Wikileaks. Por que Jeff Bezos comprou o Washigton Post? Há muita especulação sobre isso. Mas pelas razões apresentadas pela Folha, não foi.

sérgio dávila
Sérgio Dávila, o editor-executivo da Folha