Os torcedores brasileiros que assediaram uma mulher russa e divulgaram o vídeo na internet estão tendo o que merecem – em que pese o fato de a cultura do assédio ser estrutural, é formada por indivíduos, e deve, portanto, ser combatida caso a caso.
Um a um, todos os homens que compõem o grupo que envergonhou o Brasil – como se tivéssemos poucos motivos para vergonha internacional – estão sendo identificados.
Um advogado e ex-funcionário público, um sargento da Polícia Militar e um engenheiro estão sendo expostos nas redes sociais, e sofrendo as consequências do ato em todos os setores de suas vidas.
Um deles defendeu-se – é possível? – numa rede social escrevendo que “não imaginava que uma brincadeira pudesse repercutir tanto”. Será que nunca lhe ocorreu o fato de que fazer alusão ao órgão sexual de uma mulher e filmá-la dizendo isso é repulsivo e vergonhoso?
Quando um vídeo como este repercute tão negativamente, entendemos que o mundo não está assim tão doente, mas voltamos a duvidar quando um dos autores da barbárie simplesmente não compreende a misoginia contida em seu ato.
Enquanto alguns veículos midiáticos tratam o caso como “polêmica”, a Rede Globo – que surfa na onda das problematizações quando lhe é conveniente – vem tratando o vídeo machista como um crime de terrorismo.
Menos, dona Globo.
A gente lembra que a senhora não é assim tão sensível a atos de misoginia.
Não o foi, por exemplo, na copa de 2014, quando a torcida gritava para a presidenta eleita: “Ei, Dilma, vai tomar no cu!” e a senhora filmava, apática.
Não foi quando não problematizou o “tchau, querida”. Quando apoiou um golpe machista. Quando mostra cenas insensíveis e desnecessárias de estupro em suas novelas.
Qual é a grande diferença entre assediar uma russa em frente a uma câmera e mandar uma mulher – que tinha idade pra ser mãe da maioria dos torcedores, na época – tomar no cu na frente do mundo inteiro?
Que grande abismo separa o vergonhoso vídeo “buceta rosa” dos adesivos de Dilma de pernas abertas nos tanques de gasolina, sobre os quais a Globo jamais deu um pio?
Para a emissora, a diferença é simples: é fácil pagar de desconstruidona quando o machismo manifesto não envolve interesses políticos.
A militância conveniente é um câncer, e a Globo está em estágio terminal. A emissora sabe não apenas calar-se diante do machismo, mas aplaudí-lo quando quer, como fez em 2014.
A cultura que vitimou a mulher russa – e revoltou a maciça maioria das mulheres mundo afora – é a mesma que fez com que Dilma fosse desrespeitada não como presidente, mas como mulher e ser humano.
O machismo que a Globo agora combate ferozmente como crime de terrorismo é o mesmo que protagonizou com louvor o golpe de 2016, apoiado pela emissora.
O vídeo dos torcedores brasileiros na Rússia não serviu apenas para nos envergonhar: Vem para nos lembrar que precisamos, urgentemente, de uma educação feminista e equitativa para todos.
E isso definitivamente não entrará em nossas casas pela televisão.