POR JOSÉ EDUARDO BICUDO
Muito já foi dito sobre o processo de desconstrução do Brasil, desde o golpe branco de 2016 até o presente momento. Certamente o que escrevo não é novidade para ninguém.
O que ocorre, e não posso me conformar com isso, é que a destruição vem sendo feita de maneira insana e insólita, às vezes de modo silencioso e nefasto. Até agora, porém, sem os tanques nas ruas, sob o comando de um terrorista amplamente conhecido desde os tempos da ditadura militar e eleito presidente pelos “bolsocrentes”, conforme qualificação muito bem posta por Eliane Brum em seu artigo recente no El País. Dentre esses bolsocrentes há uma parcela ponderável da classe média, inclusive uma parte que se considera intelectualizada. Alguns destes são também fiéis seguidores do “deus mercado”, mas que desconhecem ou preferem desconhecer a história recente do país. É curioso, no entanto, ouvir com frequência desses bolsocrentes intelectualizados que eles depositavam esperanças em um “novo governo”, que as coisas poderiam ser diferentes.
Ora, uma das caracterísitcas mais importantes do intelecto humano é a de poder fazer previsões e com isso evitar possivelmente o acontecimento de catástrofes. Aliás, é isso o que faz boa parte daqueles que trabalham para o “deus mercado”. A conclusão a que se chega, portanto, é que existe uma desonestidade intelectual muito grande entre os bolsocrentes que se consideram intelectualizados.
Isso é particularmente notório também nas falas de alguns professores universitários, os quais, quando são entrevistados e lhes perguntam se o país, em sua história recente, passou por algum momento em especial no qual a pesquisa científica como um todo teve um incentivo e apoio maiores que em outros momentos, inclusive com o siginificativo aumento do oferecimento de bolsas de estudos para a pós-graduação, preferem mudar de assunto para não ter que dizer o que realmente aconteceu.
Tal atitude, infelizmente, só reforça os ataques e o desmantelamento que a educação e a pesquisa científica vêm sofrendo por conta desse desgoverno. Sorte a nossa que ainda contamos com Miguel Nicolelis, brasileiro, professor e pesquisador universitário nos EUA, que tem a coragem de vir a público, assim como têm feito outros expoentes das universidades públicas brasileiras, e dizer claramente o que aconteceu naquele período especial, ao qual Miguel Nicolelis se refere como sendo a “renascença brasileira”.
Nesse processo de desconstrução e destruição do país, o terrorista mor, fantasiado agora de presidente, segue fervorosamente seu gurú-astrólogo, entricheirado nos EUA, como seguiam Osama Bin Laden, entricheirado no Paquistão, os integrantes do grupo terrorista Al-Qaeda.
Grande parte dos bolsocrentes age como verdadeiros jihadistas, na sua versão tropical. O primeiro escalão desse desgoverno, apontado pelo “antipresidente”, como também define de modo elegante Eliane Brum o terrorista de plantão, é o que há de mais nefasto ao país. São quase todos fundamentalistas raivosos e vingativos, completamente indiferentes à realidade do país, são contra a diversidade da cultura, do conhecimento, das artes, das ideias e dos povos. Do jeito como a coisa anda, em pouco tempo não vai sobrar pedra sobre pedra.
Como se sabe, desde 2014, a Lava Jato vem operando como um verdadeiro tanque de guerra, sem o barulho deste, porém com o mesmo despudor e poder de destruição, com foco principal na indústria nacional e sua cadeia produtiva. Para comprovar isto, é só olhar os dados mais recentes acerca da atual taxa de desemprego no país publicados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), instituição amplamente respeitada pelo relevante trabalho que realiza, a qual daqui a pouco, e se depender desse desgoverno, provavelmente também não existirá mais.
O agronegócio, por sua vez, com o total aval do atual antiministro do Meio Ambiente, também nefasto para com as gerações futuras, vai aos poucos matando a população, de modo silencioso, com a imensa carga de agrotóxicos, a maioria dos quais banida nos países desenvolvidos, despejados indiscriminadamente nas terras agrícolas, com a consequente contaminação dos solos férteis, dos lençóis freáticos, dos rios e do mar.
O Brasil detém 12% da água doce do globo, porém não adianta vir com a “grande ideia” de privatizar toda esta água doce existente, ladainha cansativa daqueles que enxergam nas privatizações a solução para tudo, pois esta água já está em grande parte contaminada com resíduos tóxicos provenientes principalmente da agricultura, da pecuária e da mineração, sem qualquer preocupação mínima com a saúde e o bem-estar da população. Ou seja, a população brasileira vai a partir de então poder comprar a sua morte em suaves prestações de garrafinhas PET. Isto é, se ainda houver sobreviventes, depois que derem também o fim na previdência social solidária.
Isso tudo, sem entrar em detalhes sobre a liberação para a compra de armas de fogo, com o aprofundamento do processo de matança das populações mais vulneráveis, além de armar ainda mais as milícias jihadistas do antipresidente terrorista e de seu califado fundamentalista, ou como preferem outros, de seu clã, na versão mafiosa do termo.
O mais irônico de tudo isso, mas que não se trata de uma novidade, é que os EUA, tão preocupados em defender o mundo ocidental de ataques terroristas, estimulam despudoradamente as ações terroristas que vêm sendo levados adiante pelo antipresidente terrorista, seu califado fundamentalista e seus jihadistas. É evidente que neste caso o terrorismo praticado é do interesse de Trump e de sua turma, para os quais o antipresidente terrorista e seu califado baixam suas cabeças o tempo todo, com toda a subserviência que os caracteriza, para inclusive se proporem a entrar em uma guerra insana com um país vizinho.
Uma das falas do antivice-presidente, em passado recente, acenando claramente com o auto-golpe, é uma versão maqueada, mesmo assim tosca, do que está por vir a acontecer, caso os guardiões principais da constituição brasileira e do pouco que ainda restou das instituições democráticas não venham a público defendê-las, ainda que solapadas, inclusive por eles próprios.
É importante ressaltar que o antivice-presidente, general da reserva, é também integrante, embora disfarçado, da turma raivosa e vingativa do califado fundamentalista, uma vez que o Brazil foi incapaz de fazer aquilo que principalmente Argentina e Uruguai fizeram, julgando e condenando os militares por crimes (imprescritíveis, segundo a Organização das Nações Unidas, a ONU) cometidos durante as ditaduras militares daqueles dois países. Enganam-se, portanto, aqueles que enxergam no antivice-presidente alguém que possa ser o fiel da balança.
O Brasil do futuro, infelizmente, tornou-se um verdadeiro pesadelo e também a porta de entrada do inferno de Dante, para a qual o antipresidente terrorista, seu califado fundamentalista e seus jihadistas conduzem o país a passos largos. Ainda há tempo de se evitar tal catástrofe, mas esse tempo está ficando cada vez mais curto.
(*) Professor honorário; Universidade de Wollongong, Austrália