As escolas de jornalismo deviam passar a a seus alunos, como aula, a entrevista que a BBC fez com FHC em 2007.
“Entrevista? É assim que se faz”, este seria o introito.
Não existe nada remotamente parecido no jornalismo brasileiro mainstream com aquela entrevista. (Você pode vê-la completa aqui, com legendas.)
Primeiro, o autor, Stephen Sackur, está preparado. Ele sabe do que está falando, e bem.
Depois, ele é altivo sem ser, jamais, desrespeitoso.
O entrevistador está claramente preocupado em fazer um bom trabalho e, assim, servir o público.
O nome que se dá a isso é jornalismo.
Repare a dificuldade que FHC, sempre blindado e mimado pelos entrevistadores brasileiros, enfrenta na entrevista.
Ele parece uma criança, tamanha a insegurança.
É o preço que amigos da mídia como ele pagam: não estão preparados para desafios.
FHC não conseguiu enganar o entrevistador com seu blablablá sobre corrupção.
Teve que ser confrontado com o fato de que indicou para o cargo de procurador geral da República, ao longo de todo o seu mandato, um aliado que passou para a história com o apelido de engavetador-geral.
FHC tentou engabelar Sackur.
Disse que o engavetador tinha completa autonomia para mandar investigar denúncias de corrupção no seio do governo.
Prontamente ouviu: “Mas foi o senhor que nomeou.”
FHC procura continuar em sua desculpa esfarrapada, mas não consegue.
Jornalismo é assim.
Tivesse a imprensa brasileira se comportado profissionalmente com FHC ele não se atreveria, agora, a posar de virgem num lupanar ao falar de corrupção, e isso seria muito bom para o real enfrentamento da roubalheira.
Quando o cinismo se mistura ao moralismo na abordagem da corrupção, como é o caso de FHC, é uma tragédia para a sociedade.
Lateralmente, chama a atenção que FHC em nenhum momento da entrevista tenha pronunciado a palavra desigualdade, como se não fosse este o maior mal do país.
Ele está claramente desconfortável em ser chamado de neoliberal mais de uma vez.
Gostaria de passar para a história como um presidente de esquerda, para atender a suas vaidades de intelectual.
Faltou apenas uma coisa para isso: que agisse como um presidente de esquerda.
Repito.
Esta entrevista deveria ser estudada nas escolas de jornalismo brasileiras.
Talvez os alunos mais inquisitivos digam: “Mas a gente não vai poder fazer este tipo de coisa com amigos dos patrões.”
E é verdade.
Mas pelo menos todos saberão o que é jornalismo e, adicionalmente, quem é FHC.