A longa espera

Atualizado em 29 de novembro de 2011 às 11:59
Adolpho Bloch

 

Outro dia comentei a diferença da maneira como a concorrência trata a Globo e como é tratada por ela.

A Globo recebe – espontaneamente, gratuitamente – uma cobertura colossal de toda a mídia. Sobretudo, mas não apenas, para suas novelas.

Não vou entrar aqui no mérito cultural das novelas. Para mim, elas são a vamguarda do atraso criativo, mas não é este o ponto.

Vou me deter na questão  objetiva da competição entre as mídias. Lembremos, apenas para constar, que se o cidadão está vendo a novela ele não estará, por exemplo, lendo um jornal.

A cobertura descomunal dada às novelas amplia a audiência da Globo e, portanto, diminui o consumo de outras mídias.

A audiência gera publicidade. A Globo tem mais da metade de todo o dinheiro investido em mídia no Brasil. Isso quer dizer que todas as demais empresas disputam um bolo pelo meio.

Num raciocínio mais simples, você pode dizer: mas as novelas são importantes na vida do leitor. São mesmo? O leitor que lê os editoriais do Estadão se importa mesmo em saber como vai a novela? Os leitores de mídia impressa – não falo aqui das revistas de celebridades – são uma elite intelectualizada que talvez discuta a nova fase de Two and a Half, mas não a novela.

Uma vez, numa passagem pelo Brasil, escrevi sobre isso depois de ler, na coluna de cartas da Folha, a queixa de um leitor sobre o espaço dado às novelas na Ilustrada. Talvez algum editor tenha lido meu texto.  Nas duas semanas seguintes, antes de voltar a Londres, não vi uma matéria sequer de novela na Folha. (Na qual existe uma coluna fixa sobre tevê, aliás, como se tevê fosse notícia em si.)

Vejamos agora como a Globo trata a concorrência. A BBC, todos os dias,  comenta a primeira página dos jornais que estarão nas ruas no dia seguinte. Ela está estimulando seus espectadores a comprar jornais, porque isso é bom para a sociedade.

A Globo faz alguma coisa remotamente parecida?

Como se viu recentemente, nem o Panamericano merece cobertura decente da Globo quando não é ela mesma que está transmitindo.

Nada retrata tão bem a maneira da Globo de tratar a competição como um episódio que envolveu Roberto Marinho e Adolpho Bloch, da falecida Manchete. O caso está no livro Os Irmãos Karamabloch, de Arnaldo Bloch, sobrinho de Adolpho e funcionário da Globo.

Bloch estava quebrado. Decidiu pedir socorro a – logo quem – Roberto Marinho. Dez anos antes, a Manchete conseguira os direitos de transmissão do Carnaval do Rio – outro lixo da tevê – e Roberto Marinho telefonou para Bloch para ver se entravam num acordo. Bloch não retornou a ligação.

A vingança mostra a alma do vingador.

Roberto Marinho não se limitou a recusar ajuda. Marcou uma hora para Bloch. Submeteu-o a uma espera de quatro horas. Quando finalmente Bloch pôde entrar numa sala provavelmente maior do que a do presidente dos Estados Unidos, ouviu: “Estou esperando você me retornar há dez anos.Passar bem.”

Adolpho Bloch foi encaminhado para fora, e para a bancarrota.

É assim que a Globo trata a concorrência – que se prosta diante de sua formidável programação à base de novelas, Faustões, Galvões, BBBs et caterva.