Publicado originalmente no OperaMundi
Por Aline Passos
Em 22 de julho de 2019, Sergio Moro anunciou no Twitter a divulgação dos dados do Infopen – sistema de informações penitenciárias do Ministério da Justiça e Seg. Pública – relativos a dezembro de 2016 e junho de 2017. Foram os primeiros relatórios do Infopen divulgados no governo Bolsonaro.
No que diz respeito aos presos provisórios, tivemos novidades que cheguei a apontar, mas o alerta não surtiu muito efeito. Dados os últimos tweets de Sergio Moro sobre assunto, acho que vale a pena retomar o alerta.
Até o último relatório do governo Temer, observava-se o seguinte padrão nos relatórios do Infopen quanto aos presos sem condenação:
“A categoria ‘presos sem condenação’ compreende as pessoas privadas de liberdade que não foram julgadas e não receberam decisão condenatória. Os dados apresentados no gráfico compreendem as pessoas em carceragens de delegacias e os presos provisórios em estabelecimentos do sistema prisional” (Infopen/junho 2016, p. 13).
Já nos relatórios produzidos a partir da gestão Moro/Bolsonaro, encontra-se:
“O gráfico 7 indica a taxa de presos sem condenação segundo as Unidades da Federação. Para realização deste cálculo foram consideradas as pessoas que aguardam julgamento dentro do sistema prisional” (Infopen/junho 2017, p. 16).
A diferença entre as duas formas de apresentar os dados reside na exclusão das pessoas presas em carceragens de delegacias da taxa de presos sem condenação. Ou seja, a partir do atual governo, preso provisório é apenas aquele que aguarda julgamento em unidades prisionais administradas pelas secretarias de Justiça ou Administração Penitenciária, mas não os que permanecem sob custódia das secretarias de Segurança Pública.
Como nem todas as secretarias de Segurança Pública informam o número de presos custodiados em suas delegacias, vou pegar como exemplo o Estado do Paraná, que costuma entregar esses números ao Infopen com regularidade.
Em junho de 2016, constava no Infopen que o Paraná tinha 28% de pessoas presas sem condenação, considerados, repito, todos os encarcerados, seja nas delegacias, seja nas penitenciárias propriamente ditas (p. 14). Já no relatório de 2017, o mesmo estado figura com 11,22% de presos sem condenação (p.16).
A redução, mais do que significativa, e num prazo tão curto, foi o que chamou minha atenção. Haveria no Paraná uma prática inovadora de desencarceramento ou celeridade nos julgamentos da justiça criminal que eu não tinha tomado conhecimento?
Bem, a prática “inovadora”, como já sinalizei, era simplesmente uma maquiagem estatística. Afinal, no primeiro relatório da gestão Moro/Bolsonaro, nada menos que 9.738 pessoas, entre homens e mulheres, presos em carceragens de delegacias, deixaram de ser considerados “presos sem condenação” (ou seja, provisórios), embora obviamente o sejam.
Em outras palavras, o relatório até apresenta o número absoluto de presos nas carceragens de delegacias no Paraná, apenas exclui este contingente na hora de apresentar o dado em comparação com o total de presos. Vejamos:
Paraná – Jun/2017 (p.08)
- População prisional: 40.291
- População prisional – Secretaria de Segurança: 9.738
- Total de presos provisórios sem condenação: 4.507
É assim que, na hora de apresentar o percentual de presos sem condenação (afinal, o “total” acima deveria incluir as pessoas custodiadas nas carceragens), o Paraná pode exibir 11,22% de presos sem condenação em 2017, quando a taxa era de 28% no relatório do ano anterior.
É assim também que, ontem, pudemos assistir Sergio Moro tuitando seus conhecimentos estatísticos sobre números absolutos e relativos para afirmar que nossas taxas de presos provisórios/sem condenação não são tão altas quanto as do… Canadá! Ou da… Dinamarca!
Seria só mais uma exibição engraçada de ignorância se não estivéssemos falando do desaparecimento de pessoas presas para fins estatísticos, ou seja, de governo.