“Não é fácil morrer.”
Meu irmão Zé Beto me conta que tio Sávio falou isso algumas semanas antes de morrer. Tio Sávio, irmão de mamãe, teve um problema nos rins. Fez hemodiálises e, mais recentemente, submeteu-se a um transplante.
A cirurgia fracassou. Tio Sávio viveu um resto de vida que talvez ele preferisse abreviar. “A cada hemodiálise sinto vontade de morrer”, meu irmão conta que ele desabafou. Parte dele morrera já alguns anos quando tia Maria Odete — uma das mulheres mais lindas e doces da família, enormes olhos azuis iluminando traços delicados numa pele clara — foi tomada por um câncer veloz e feroz. Sempre que vejo histórias assim, lembro de uma frase de Júlio César segundo a qual a maior presente que podemos ganhar na vida é uma morte rápida.
Lamentei não ter ido ao enterro. Sei o quanto conforta a presença de pessoas nessa hora. Há uma transmissão de solidariedade que aquece em plena nevasca.
Ao caminhar hoje pelas ruas de Londres, pensei em meu tio.
E me ocorreu que o Brasil deveria, como acontece na Inglaterra e em outros países do mundo, enfrentar a discussão da morte assistida. A Inglaterra está na iminência de alterar a legislação de tal forma que fique menos complicado o percurso de quem por alguma razão – em geral uma doença terminal – decida pela morte.
É uma escolha legítima.
Sêneca dizia que uma das bençãos dadas aos seres humanos é a possibilidade da porta de saída em situações insuportáveis.
Não sei se tio Sávio iria optar por isso se pudesse. Mas gostaria que ele tivesse tido essa chance.