A permanência de Bolsonaro no cargo é mais incerta do que nunca. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 24 de abril de 2020 às 19:23
O presidente da República, Jair Bolsonaro, durante a cerimônia de posse ministerial -Foto: Alan Santos/Presidência da República

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Por Luis Felipe Miguel

A permanência do ex-capitão no cargo é mais incerta do que nunca. A saída de Moro fez com que perdesse bases de apoio na população, na mídia, no empresariado e na elite do aparelho de Estado. Mais importante ainda, fez com que os generais passassem a duvidar de suas condições intelectuais e emocionais para permanecer como presidente. O caminho correto seria a cassação da chapa pelo TSE, dado o evidente caráter fraudulento da eleição de 2018, para o qual, sempre é bom lembrar, o ministro demissionário contribuiu enormemente. Como isso é irrealista, o mais provável é um impeachment acelerado ou um golpe palaciano que leve à renúncia forçada de Bolsonaro.

O enfraquecimento de Bolsonaro é bom, mas não o fato de agora termos duas lideranças fortes disputando a extrema-direita. A tendência é uma radicalização de discursos, cada um garantindo para sua base que é o verdadeiro portador dos valores “puros” do anticomunismo, do antipetismo etc.

Moro está sendo cortejado por uma direita que se quer menos irracional (leia-se PSDB), a mesma com a qual mantinha maior afinidade quando comandava a conspiração Lava Jato. Mas convém lembrar que o Moro que sai do governo é ainda pior do que aquele que entrou. O fascista enrustido de antes é agora alguém que se comprometeu amplamente com um governo de nítido corte autoritário. É possível que Moro puxe novamente Doria para posições próximas da extrema-direita, em vez do contrário.

Esperneando para sobreviver, o governo Bolsonaro deve dobrar a aposta na insensatez diante do coronavírus. No momento, ele só tem a ganhar – e é o único que tem a ganhar – com a politização rasteira do debate sobre o isolamento e com a disseminação cada vez mais ensandecida de todo o tipo de mentiras para esconder o que está acontecendo (agora, os mínions estão espalhando que caixões estão sendo enterrados vazios para alimentar o pânico com o “vírus chinês”). O novo ministro da Saúde, aquele que parece que hoje chegou para assistir ao discurso do chefe vindo direto do set de gravação de The walking dead, já mostrou que está aí para fazer esse serviço mesmo.

Por incrível que pareça, o enfraquecimento de Paulo Guedes – que talvez esteja até de saída – não representa um progresso. Não há nenhum tipo de medida econômica séria para estimular a economia, impedir o colapso do sistema produtivo, proteger os mais pobres, reestruturar o Estado brasileiro. Há apenas planos vagos para gasto desordenado de dinheiro público com objetivo político de curtíssimo prazo.

A esquerda se tornou espectadora da história – uma história que quase se resume a uma briga entre grupos da direita e da extrema-direita. Com uma enorme crise de liderança, em grande medida voltada para suas disputas internas e incapaz de superar o horizonte da competição eleitoral, a esquerda brasileira tem se mostrado impotente para intervir no debate público e se apresentar como alternativa. Seu maior ganho, importante, que foi a aprovação do auxílio emergencial, virou trunfo do governo federal. Até uma bandeira tão óbvia, como o #ForaBolsonaro, ela deixou ser capturada pela oposição conservadora.