A religião é a kalanishkov do povo

Atualizado em 12 de junho de 2013 às 19:49
Como Breivik, Ricardo Coração de Leão matava em nome de Cristo

 

Numa de suas frases mais repetidas, Marx disse que a religião é o ópio do povo.

Não.

É mais que isso.

A religião é a metralhadora do povo. A kalashnikov.

Vejo no depoimento de Anders Breivik, o assassino norueguês, que ele afirma que ao matar 69 pessoas estava defendendo a cristandade. Os cristãos. Gente que ele imagina estar sob o risco de ser varrida pelos muçulmanos.

Breivik está certo de que Cristo aprovaria sua ação, portanto.

A humanidade está entupida de sangue derramado em nome de causas religiosas.

Ricardo II, o Coração de Leão, por exemplo, rei da Inglaterra na Idade Média. Ele passou para a história como um guerreiro de extrema bravura que comandou uma campanha militar gloriosa – sagrada, até – para recuperar Jerusalém do domínio dos infiéis, como eram chamados os muçulmanos.

Certa vez, Ricardo fez 5 000 reféns.  Suas exigências para libertá-los eram inalcançáveis. Mandar executá-los, simplesmente, era complicado: os soldados de Ricardo se sentiriam desconfortáveis matando pessoas desarmadas e indefesas.

Ricardo então fez o seguinte: espalhou o boato de que os muçulmanos tinham matado todos os presos cristãos. Aí os 5 000 infiéis foram mortos a sangue frio. Ricardo comandou o massacre. Um historiador da época escreveu que enquanto Ricardo exterminava os muçulmanos anjos gritavam para ele: “Mata! Mata! Não poupa ninguém!”

Por Cristo.

A coroação de Ricardo fora já um assassinato religioso em massa. Judeus foram assassinados pelo crime de terem ido participar da festa pela ascensão do novo rei, em Londres.  O holocausto dos judeus na coroação de Ricardo logo de espalharia de Londres para outras cidades inglesas. Num episódio particularmente doloroso,  em York um grupo de judeus sitiados por cristãos se suicidou de forma épica: os homens mataram primeiro as mulheres e as crianças, e depois a si próprios.  Escaparam assim da violência dos cristãos. (Reis como Ricardo aproveitavam a chacina de judeus para deixar de pagar suas dívidas. Impedidos dos ofícios habituais, restava aos judeus comerciar e emprestar dinheiro.)

A história da humanidade é a história da matanças por fins religiosos. Existe uma única religião que não estimulou em seus seguidores fanatismo homicida e ímpetos guerreiros: o budismo. É uma das razões pelas quais a China, onde o budismo é vigoroso, foi sempre militarmente fraca.

E então, agora, somos obrigados a ver Breivik falar que estava defendendo a cristandade.

Pobre Cristo.

Se soubesse o que os homens fariam em seu nome, teria lutado com todas as forças pelo anonimato completo.