A Vila Nova Conceição possui o metro quadrado mais caro de São Paulo: 13 871 reais (no Leblon, o mais valioso do Rio, é 22 mil). Athina Onassis, a amazona, e Roberto Setúbal são de lá.
Os moradores estão se organizando para impedir a construção de moradias populares. Um terreno seria demarcado como Zeis, Zona Especial de Interesse Social, algo previsto no Plano Diretor que deve ser aprovado na Câmara na semana que vem.
A área era um estacionamento e pertencia ao dono da rede Clóvis Calçados. Estava fechado há alguns anos. A mulher do diretor da associação de moradores fez um alerta: “Moradia social no coração do bairro, e a pouquíssimos quarteirões das nossas crianças”. Uma reunião foi marcada em que foi levantada a possibilidade de se entrar com uma ação judicial.
A situação lembra a de Higienópolis em 2011, quando uma psicóloga externou sua preocupação com a inauguração de uma estação de metrô ali. Atrairia “drogados, mendigos, uma gente diferenciada…”. Houve protestos — o mais notório foi um churrasco. O governo de São Paulo acabou desistindo da obra.
Entidades de bairros servem para defender os interesses do bairro. Mas os interesses do bairro não podem se sobrepor aos da cidade. Um terreno vazio e abandonado num pedaço nobre de São Paulo não pode ter mais serventia do que uma habitação para moradores de baixa renda. A não ser que o problema sejam os moradores de baixa renda.
Provavelmente a maioria dos habitantes da Vila Nova Conceição vão a Nova York e Paris e pegam, digamos, metrô, com todo tipo de gente diferenciada. De volta à terra natal, isso se torna impossível.
A riqueza de São Paulo e Rio construiu um isolamento, eventualmente disfarçado sob o termo “exclusividade”. O frequentador do Ibirapuera das quintas não é o mesmo dos domingos. Ir ao futebol já foi uma experiência mais democrática. No Morumbi, havia duas opções principais: arquibancada e numerada. A diferença de preço entre elas não era tão grande. Hoje, você pode ficar num camarote, vendo a massa cheirosa de longe.
O filósofo de Harvard Michael Sandel tem um bom ponto sobre essa tendência. “Há cada vez menos lugares onde pessoas de diferentes classes, diferentes etnias e diferentes backgronds podem se encontrar”, disse ele numa palestra em São Paulo. No estádio de beisebol a que ele ia, todos “pegavam a mesma fila para ir ao banheiro, comiam o mesmo cachorro-quente mofado e tomavam a mesma chuva”.
Nas últimas três décadas, aconteceu o que chamou de “camarotização” da vida. “Vivemos, trabalhamos, brincamos em locais diversos. Isso não é bom para a democracia. A democracia não requer igualdade perfeita, mas que pessoas de diferentes origens se encontrem, até se choquem, ao longo da vida diária, porque é dessa forma que aprendemos a negociar e a viver com nossas diferenças e é isso que faz com que nos importemos com o bem comum.”
São Paulo precisa de menos camarotes e seus reis esquisitões.