Originalmente publicado por REDE BRASIL ATUAL
Por Tiago Pereira
Ainda na década de 1930, o farmacêutico maranhense Jesus Norberto Gomes, criador do guaraná Jesus, implementou uma espécie de participação nos lucros e resultados (PLR) na sua fábrica de refrigerantes em São Luiz, capital do Maranhão. Além dessa inovação, o empresário era simpatizante do comunismo, relata a jornalista Roberta Gomes, bisneta do empresário.
Em live com o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), nesta sexta-feira (30), ela contou um pouco da história do seu bisavô. E também lamentou que o presidente Jair Bolsonaro utilizasse a bebida – considerada um “patrimônio imaterial” do estado – para fazer mais uma de suas piadas homofóbica, uma de suas características mais deploráveis.
“O mais grave é utilizar a nossa bebida, que é um patrimônio imaterial, para atacar a comunidade LGBT. A gente tem que ter respeito com todos”, afirmou Roberta. A jornalista prepara uma biografia e um documentário, a serem lançados no próximo ano, quando Jesus Gomes completaria 120 anos.
Em passagem pelo Maranhão, nessa quinta-feira (29), ao experimentar a bebida, Bolsonaro afirmou: “Agora virei boiola, igual maranhense, é isso? Guaraná cor-de-rosa no Maranhão… Que boiolagem é isso aqui?”, disse, de forma constrangedora.
A brincadeira de mau gosto foi feita durante visita às obras de restauração do trecho da BR-135, na cidade de Bacabeira. “Muito pouquinho”, para quase dois anos à frente do governo federal, considera Dino. “Deus escreve certo por linhas tortas. Ele acabou tomando o guaraná Jesus sem saber que estava tomando o produto de um admirador do socialismo, empresário progressista, que respeitava os trabalhadores”, ressaltou o governador.
Dino inclusive anunciou que vai processar Bolsonaro por ter utilizado dinheiro público para fazer propaganda política durante sua passagem pelo Maranhão.
“Bom samaritano”
De origem pobre, nascido no interior, Jesus Gomes começou a trabalhar numa farmácia da capital maranhense aos 14 anos. Apesar de analfabeto, prosperou na função e foi apoiado pelo patrão, que financiou seus estudos. Formou-se farmacêutico em 1925.
Na sequência, adquiriu sua própria drogaria. Importou máquinas gaseificadoras para produzir magnésia fluida, substância utilizada, na época, para combater “perturbações gástricas”. Apesar de ter conseguido desenvolver a substância, a fórmula já havia sido patenteada por outro grande laboratório naquele momento.
Foi então que Jesus resolveu investir na produção de bebidas gaseificadas. Após inúmeros testes, misturando cravo, canela, além do próprio guaraná, chegou à fórmula da bebida que levou seu nome. Logo depois, em 1927, o guaraná Jesus recebia aval, como “bom para o consumo”, do Departamento Nacional de Saúde Pública, que ficava no Rio de Janeiro, antiga capital.
Além de dividir seus ganhos com os trabalhadores, Roberta relatou que seu bisavô também realizava reuniões anuais de planejamento com os sócios e empregados. “A relação com os funcionários era muito interessante. Ele tinha o pensamento que todo mundo tinha que estar bem para trabalhar com ele, para poder crescer e ampliar”, relatou a bisneta. Por outro lado, quando enriqueceu com o negócio dos refrigerantes, passou a patrocinar as artes no Maranhão.
“Meu bisavô era ateu, mas respeitava todo mundo. No enterro dele, estava cheio de padres, porque depois se descobriu que ele também ajudava a Igreja”, contou. “Doutor Jesus era um bom samaritano”, completou o governador.