Publicado originalmente na TSF
Bernard Henri Levy está a percorrer 22 cidades em busca dos valores e do espírito que orientaram a criação da União Europeia. “Searching for Europe” (“À Procura da Europa”) é uma peça de teatro, um monólogo, em que o filósofo fala das ameaças que a União enfrenta quando se prepara para novas eleições. Henri Levy explica que está “à procura da Europa porque ela anda perdida.O espírito europeu perdeu-se. Temos economia, temos dinheiro, temos mercados, mas o espírito e os valores, onde andam eles?”
Esta cruzada começou em Milão, a terra de Matteo Salvini, vice primeiro-ministro e ministro do Interior italiano, um dos líderes dos populistas europeus. À conversa com a TSF, o intelectual francês reconhece que este início não foi uma coincidência, foi intencional. Henri Levy confessa que, para ele, “a Itália pode estar, pela segunda vez, a fazer o caminho que já percorreu há 100 anos. Pode ser pela segunda vez o laboratório do mal. Da primeira vez foi Mussolini e atualmente é Salvini. Se não nos precavermos, podemos assistir ao mesmo fenômeno. Também foi planeado terminar em Lisboa, ainda vou a Paris, mas de certa forma acabo em Lisboa, porque para mim esta cidade é um sinal de alivio. Vocês não têm os malucos de vermelho e castanho, vocês não têm os herdeiros loucos do Estalinismo e do Fascismo. A Europa aqui funciona bem, vocês são europeus orgulhosos.”
Henri Levy salienta que Portugal é o local onde vê que as pessoas são felizes por serem europeias. Aqui não há o receio de, ao abraçar a Europa, se perder a identidade nacional. “As duas identidades são compatíveis e é desta forma que eu defendo a Europa. Uma entidade politica de que precisamos para algumas tarefas, como evitar sermos reduzidos à escravatura pela China ou pela Rússia, ou como evitarmos atentados terroristas do islão radical. A minha Europa é aquela em que toda a gente se mantém fiel a si própria, à sua cultura e à memória. Para mim vocês já alcançaram isto e é o que vou dizer no palco do Tivoli, no dia 6 de maio,” acrescenta Henri Levy.
O texto da peça “Searching for Europe” vai-se adaptando de cidade para cidade, conforme a realidade de cada país. Em Lisboa, o filósofo vai também enaltecer a revolução dos cravos. Em 1974 ele estava em Portugal e por isso viveu por dentro a mudança de regime. Considera que os portugueses são os herdeiros da melhor revolução dos últimos 100 anos. A única revolução num século que não acabou em ditadura.
Levy recorda que a revolução dos capitães é a exceção porque não foi uma catástrofe, e lamenta que os jovens não se lembrem dela o suficiente. Para ele os mais novos não prestam a homenagem devida aos antepassados que lhes permitiram ser hoje portugueses e europeus orgulhosos. Devem isso aos que fizeram uma revolução pacifica, democrática, antifascista e anti-estalinista, mas a lição de coragem e de esperança foi esquecida.
“O meu sonho no Tivoli, no dia 6 de maio… bem, na verdade são dois sonhos. O primeiro é ter a fila da frente ocupada pelos sobreviventes da revolução de Abril. Alguns são meus amigos. Admiro-os e respeito-os muito. O segundo sonho é que as forças vivas do espírito europeu neste país, falei de Rebelo de Sousa mas há outros, os intelectuais, eruditos, acadêmicos, espero que também estejam lá. Desejo que juntos se consiga constituir um núcleo de espírito europeu que será, prometo-vos, muito mais forte do que os estúpidos dos populistas.”
Bernard Henri Levy é um conhecido critico do Brexit, um processo que considera ser fruto do populismo. Defensor de um segundo referendo, argumenta que o Reino Unido sem a Europa vai ficar dividido e as pessoas que queriam recuperar o poder vão perdê-lo por completo. Quanto à União Europeia, sofrerá uma perda de espírito e de valores porque o melhor laboratório dos valores e regras europeias foi o liberalismo inglês depois da 2ª guerra mundial.
“Se o pior acontecer”, diz Henri Levy, “vamos perder parte do nosso espírito e a Europa terá de se reorientar, talvez para o sul. Esse é o meu desejo. Há 25 anos eu defendi que não devíamos ficar satisfeitos com o eixo franco-alemão. Acredito numa inclinação latina da Europa. Acredito, por exemplo, num contrato especial entre a Espanha, Portugal e a França. Acredito num encontro simbólico entre o Presidente Macron e o Presidente Rebelo de Sousa para desenharem um roteiro para os próximos anos. Porque vocês, em Portugal, são um exemplo para a Europa. Um país em que a relação entre a Europa e a nacionalidade está bem resolvida.”
A busca de Henri Levy pelos valores originários só vai terminar nas vésperas das eleições europeias. Ele reconhece, no entanto, que nos locais onde já esteve encontrou a Europa no espírito das pessoas que encheram os teatros. Descreve-as como crentes na Europa, que constituem uma maioria silenciosa. “Não as ouvimos mas elas estão aqui e são a maioria. Temos gente como os populistas, a extrema-direita e a extrema-esquerda que gritam muito alto e são encorajadas por pessoas como o Steve Bannon ou o Vladimir Putin. Só os ouvimos a eles, mas na realidade existem milhões de europeus que ainda acreditam na Europa e que apenas esperam, como a bela adormecida, para serem acordados.” E é essa tarefa que o filósofo francês quer desempenhar, a de despertar as consciências na Europa, mas alerta que não o pode fazer sozinho.
“Só eu não sou suficiente para levar as pessoas a votar, mas se o meu Presidente, Emanuel Macron, e o vosso Presidente, Rebelo de Sousa, se os democratas em Itália, se a senhora Merkel, fizerem apelos fortes ao voto, se frisarem bem que estas são umas eleições históricas, que há muito em causa, então talvez as pessoas votem. Mas porque votariam se virem os lideres apenas envolvidos em pequenas quezílias e sem um discurso duradouro e coerente? É claro que não votam. Nós, os intelectuais, a comunicação social, os lideres de opinião como vocês na TSF, os políticos, temos de dizer às pessoas como é crucial e histórico este momento de escolhas para o Parlamento Europeu, porque temos vilões que estão à espera às portas da Europa, e vilões que já cá estão, como por exemplo a Marine Le Pen.”
Dia 6 de Maio, no Teatro Tivoli em Lisboa, Bernard Henri Levy vai estar em palco, sozinho, para fazer uma ode à Europa, contra os populismos e os nacionalismos.