Alunos bolsistas enfrentam discriminação e segregação em escolas de elite de SP

Atualizado em 31 de agosto de 2024 às 20:28
Colégio Marista Arquidiocesano. Foto: Divulgação

Gabriel Domingues, agora com 21 anos, recorda o impacto que causou ao chegar ao Colégio Marista Arquidiocesano, uma das instituições de ensino mais tradicionais de São Paulo. Bolsista, negro e morador da periferia, Gabriel destoava dos colegas em um ambiente onde as mensalidades ultrapassam R$ 3.000. A diferença não era apenas financeira, mas também social e racial, e as dificuldades enfrentadas durante o ensino médio moldaram sua visão sobre o sistema educacional. Com informações da Folha de S.Paulo.

Desde o início, Gabriel encontrou barreiras para se enturmar com os demais alunos, cujas vivências eram muito diferentes das suas. “Eles não me chamavam para sair e justificavam dizendo que era muito caro”, relata ele. Além disso, enfrentou a discriminação racial, sendo apelidado de “Gabnegão” pelos colegas, uma prática que ele tolerou na época, mas que hoje reconhece como racista.

Gabriel é agora estudante de administração pública na Fundação Getulio Vargas (FGV) e membro da Ponteduca, uma organização sem fins lucrativos que luta pela democratização da educação particular e pela redução das desigualdades socioeconômicas. Na Ponteduca, ele recolhe relatos de outros bolsistas que enfrentam situações semelhantes nas escolas de elite paulistas.

Entre os colégios mencionados pelos estudantes e ex-estudantes estão o Colégio São Luís, Porto Seguro e Santo Américo, onde a discriminação se manifesta de diferentes formas. No São Luís, por exemplo, os bolsistas são separados dos pagantes, estudando à noite e sem autorização para entrar na escola antes do horário das aulas, mesmo que para estudar.

Outro caso emblemático é o do Colégio Porto Seguro, que desde 1966 mantém a Escola da Comunidade para atender estudantes de baixa renda.

Colégio Marista Arquidiocesano. Foto: Divulgação

Até 2020, bolsistas e pagantes estudavam na mesma unidade no Morumbi, mas agora estão separados por cerca de quatro quilômetros, após a transferência dos bolsistas para um prédio na Vila Andrade. Alunos bolsistas relataram que, mesmo quando estavam na mesma unidade, eram impedidos de circular por áreas comuns da escola sem autorização.

Casos de discriminação também envolvem filhos de professores que têm direito a bolsas integrais. Uma ex-professora do Porto Seguro contou que suas filhas enfrentaram exclusão e bullying devido à sua condição de bolsistas. A situação levou uma delas a desenvolver depressão, e a mãe decidiu mudar de escola para proteger sua filha.

O debate sobre a responsabilidade das escolas particulares em proteger os bolsistas ganhou destaque recentemente após o suicídio de um aluno bolsista do Colégio Bandeirantes, que havia relatado ser vítima de discriminação.

Ednéia Gonçalves, socióloga e coordenadora da Ação Educativa, reforça que as escolas têm a obrigação de proteger esses estudantes. “As escolas precisam alinhar com as famílias como enxergam a concessão de bolsas. Se o colégio e os pais olham para os bolsistas como caridade, não vai funcionar”, afirma.

As escolas mencionadas, como São Luís, Porto Seguro e Marista, afirmaram em notas que possuem programas para combater o bullying e promover a inclusão de todos os alunos, sem distinção. No entanto, os relatos dos bolsistas e seus familiares indicam que ainda há um longo caminho a percorrer para garantir um ambiente verdadeiramente inclusivo.

Conheça as redes sociais do DCM:

⚪Facebook: https://www.facebook.com/diariodocentrodomundo

?Threads: https://www.threads.net/@dcm_on_line