Esta reportagem foi ao ar em abril de 2018 e está sendo republicada por motivos óbvios.
É tentador colar na senadora Ana Amélia Lemos, que é jornalista, a etiqueta de ignorante, por associar o pronunciamento da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, na TV Al Jazeera ao Estado Islâmico.
“Eu só espero que essa exortação feita pela senadora presidente do PT não tenha sido para convocar o Exército Islâmico para vir ao Brasil fazer as operações de proteção ao partido que perdeu o poder e agora parece ter perdido também a compostura e o respeito, e o apoio popular”, disse.
É tentador, mas não é correto.
Ana Amélia é tudo menos ignorante.
Seu discurso serve como uma luva para o eleitorado que acredita, mesmo, que o Brasil pode ser alvo de atentados terroristas ou de uma ofensiva comunista, gente que, ao invadir o Congresso tempos atrás, viu na bandeira do Japão, branca com um círculo vermelho no meio, o protótipo de uma nova bandeira do Brasil.
Em maio do ano passado, quando estive com o cineasta Max Alvim em Curitiba, para cobrir o depoimento de Lula a Sergio Moro, entrevistamos manifestantes que haviam viajado à capital do Paraná para apoiar o juiz da Lava Jato.
Eram seis pessoas, entre eles um empresário e uma dentista, que diziam coisas como considerar Fernando Henrique Cardoso comunista e o PSDB, um partido de esquerda, além de criticar a lei de imigração apoiada pelo chanceler tucano Aloysio Nunes Ferreira, que teria aberto as portas do Brasil para o terrorismo.
“Já estão acontecendo atentados terroristas no Brasil”, disse a dentista, olhos arregalados, com ênfase na palavra “atentados”. “Estão sim”, insistiu ela, ao ser cobrada por mim para apontar os locais onde teriam ocorrido.
A senadora Ana Amélia sabe que há um terreno fértil no Brasil para semear inverdades, principalmente no campo da direita, do conservadorismo xucro.
Não é por outro motivo que o MBL se destaca hoje como a maior fonte de fake news nas redes sociais.
Ana Amélia Lemos é heroína nesta turma, se alimentando da farsa de que o mal se abriga no campo progressista.
A senadora é, antes de tudo, uma ingrata, porque, de família pobre, só chegou aonde está porque contou com a ajuda de um governo trabalhista no Rio Grande do Sul.
Aos 9 anos, trabalhou como dama de companhia em Porto Alegre e, ao voltar para sua cidade natal, Lagoa Vermelha, no norte do Estado gaúcho, só permaneceu nos estudos, entre o final dos anos 50 e e início dos anos 60, porque enviou uma carta ao então governador do Estado, Leonel Brizola, com um pedido de bolsa de estudos.
Foi atendida.
Ana Amélia, alguns anos depois, se formou em jornalismo, fez carreira na RBS (afiliada da Globo), se casou com o advogado e político Otávio Omar Cardoso, mais tarde senador, que ajudou a sustentar a ditadura militar.
Na frase em que estabelece, com malícia, uma relação entre a Al Jazeera (alguém que chefiou a RBS em Brasília não sabe o tamanho da Al Jazeera?), Ana Amélia diz dois outros disparates:
O PT perdeu o poder, disse ela.
Errado.
O PT não perdeu o poder, o poder lhe foi tirado na mão grande, com apoio de Ana Amélia.
O PT perdeu o apoio popular.
Errado.
Segundo todas as pesquisas, o PT é disparado o partido que conta com o maior índice de simpatia do eleitor, mesmo de quem não é filiado.
Na última pesquisa Vox Populi, realizada entre 13 e 15 de abril, o partido é o primeiro nesse quesito, com 18% dos eleitores que o consideram simpático.
O segundo colocado, o PSDB, tem 1%. O PP de Ana Amélia é traço.
Ana Amélia, esperta, tira da ignorância de seu eleitor médio combustível para continuar no poder.