Ao pedir ‘cota de sacrifício’, Alckmin samba na cara dos professores. Por Mauro Donato

Atualizado em 4 de abril de 2016 às 9:57

alckmin e professores

 

O comportamento errático do governador Geraldo Alckmin e sua equipe da Secretaria de Educação no trato com os professores não é gratuito nem fruto de indecisão. É malandragem mesclada com descaso puro e simples.

Primeiramente o governador cancelou o pagamento de bônus aos professores, algo que ocorre desde 2008. Depois, fez pior: pegou o que seria destinado ao bônus e dividiu entre todos, renomeando o ato para ‘reajuste’. Daria 2,5% de atualização salarial para cada professor. A categoria não sabe o que é reajuste há dois anos.

Transformar uma coisa em outra é a malandragem número um. Bonificação nada tem a ver com reajuste. Bônus são pagos em premiação por atingimento de metas. Reajuste é atualização monetária com fins de reposição de perda do poder aquisitivo corroído por inflação. Os professores precisam das duas coisas, elas não são excludentes. A malandragem número dois foi alegar ser essa uma exigência da categoria (‘acabar com o bônus e valorizar mais a classe como um todo’).

Diante da gritaria pela proposta indecorosa dos 2,5%, Geraldo Alckmin recuou mas não para rever e aumentar o índice. Voltou a dizer que irá pagar bônus. O reajuste, portanto, ficaria em zero pelo terceiro ano. Daí vem a malandragem número três. Para dar o giro de 180 graus, o governador e a Secretaria de Educação tiraram da cartola uma pesquisa feita em 48 horas e que contou com a participação de apenas 15% dos professores. Nela, uma esmagadora maioria (93%) dos servidores teria respondido preferir o bônus ao reajuste.

É sambar na cara ou não?

Como já dito, uma coisa não tem nada a ver com a outra. A escolha correta é: ‘queremos os dois’. E nem é uma questão de querer e sim de direito. A bonificação está prevista em lei e o critério é o desempenho no Índice de Desenvolvimento da Educação de São Paulo (Idesp). Já a inflação acumulada desde o último reajuste, em junho de 2014, é de 16,4% (segundo o IPCA Índice Nacional de Preços ao Consumidor). Necessita correção pra ontem.

Bons de bico, os tucanos recorrem a malabarismos mas, nesse tema, estão sem ficando sem saída. Ao oferecer uma coisa ou outra, querem dar a entender que não há nenhuma gordura em caixa. Porém o Idesp teve um avanço significativo em relação ao ano anterior. Ou seja, para este ano, o volume de beneficiados deve ser maior que em 2015. E agora? Vai tirar verba de onde? Ou não vai pagar a todos que atingiram metas?

Tamanha desfaçatez parece não ter fim. Com a possibilidade mais que real de não haver reajuste e o risco de uma nova greve à vista, o secretário da Educação, José Renato Nalini, fez um pedido aos professores na última sexta-feira: “Esperamos mais essa cota de sacrifícios dos professores, porque greve é o que menos interessaria à educação de São Paulo num ano já tão desanimador.”

Sim, você leu direito. Nalini, aquele que defende vultuosos auxílios moradia aos juízes e também que seus ganhos sejam aumentados pois precisam de bons ternos e bons vinhos, espera que os professores demonstrem desapego e aceitem mais uma cota de sacrifício?

Ao fazer o pedido obsceno, o secretário faz uma versão de mau gosto de uma piada infame. Nela, o camarada diz estar treinando seu burro para que aguente trabalhar sem precisar comer. Questionado sobre como o animal estava se saindo, respondeu: ‘Não sei o que aconteceu, logo agora que ele estava se acostumando, morreu’.

Ao lidar com professores, o governo ora senta o cassetete, ora apela para o sentimentalismo. “Esse profissional, que sabe que é agente transformador e que pode mudar a realidade, eu acredito que ele terá consciência de que, no momento de crise, no momento de desalento, não pode abandonar crianças, porque o prejuízo será da criança”, disse Nalini.

Esse ‘tem bônus, não tem mais, tem reajuste ridículo, não tem mais nada’ comprova que não há nem planejamento nem respeito aos professores e muito menos preocupação com a educação. Uma situação que já é de extremo sacrifício há muito tempo, desde o ano passado ganhou requintes sórdidos. Depois da greve dos professores, das ocupações das escolas pelos estudantes, das denúncias sobre o esquema de propina na merenda escolar, o governo Alckimin vem praticando ações que exalam aroma de vingança seja retirando impressoras, seja fechando salas de aula, transferindo alunos de escolas sem aviso prévio.

Assim como o burro que puxava a carroça da anedota, os professores estão trabalhando no sacrifício e parecem estar acostumados aos olhos do dono. Não estão. E alguns já imploram, como disse a professora Andressa Silva : “Geraldo, nos dê o tiro de misericórdia…”